Nascida em 1995, Rita Listing fala sobre a sua profissão. Afirma que é necessário lutar pelo que queremos e é devido a esse esforço que hoje é produtora no programa “Curto Circuito”, na SIC Radical.
Sei que estudou Comunicação Social, no Instituto Politécnico de Setúbal. Trabalhar no mundo da comunicação sempre foi um objetivo?
Não. Toda a minha vida, disse que não queria ir para a ‘faculdade’. Queria acabar o 12º ano e logo via o que fazia. Só a meio do 12º ano é que pensei em começar a esforçar-me para tirar boas notas. Ponderei se seria importante e pensei que, se calhar, poderia ir para a ‘faculdade’, mas ainda não sabia bem o que queria. No final do ano letivo, comecei a pesquisar cursos e a investigar o que me apetecia fazer, e comecei a sentir interesse pela área do Marketing, da Comunicação… Quando chegou a altura de inscrições, vi que não era assim tão espetacular entrar em Marketing e Publicidade, e acabei por ir para Comunicação. Gostei bastante da decisão, pensei que se acabasse por escolher Marketing e Publicidade, teria formação específica apenas nessa área, e em Comunicação posso fazer imensas coisas. Comecei o curso e vi que era demasiado focado no jornalismo e percebi que jornalismo não era para mim. A meio do curso é que me fui interessando mais pela parte da televisão. Queria, de facto, [trabalhar em] comunicação, mas não sabia bem que parte da comunicação. Ainda não sei se hoje sei.
Neste momento, estou a trabalhar em televisão. Gosto muito daquilo que faço, mas se amanhã me apetecer ir fazer rádio, se surgir um convite para rádio ou outra coisa qualquer, quero experimentar.
“Se não fosse a WTF não teria a oportunidade que tenho hoje”
Em 2013 fez parte da WTF. Como surgiu a oportunidade? Acha que foi isso que a impulsionou?
Se não fosse a WTF, não teria a oportunidade que tenho hoje, não sei se estaria no “Curto Circuito”. O facto de ter estado na WTF ajudou bastante a dizerem ‘sim’ à minha proposta de estágio para o “Curto Circuito”.
A proposta para a WTF surgiu em 2013. Na altura, o Nurb mandou-me uma mensagem no Twitter a perguntar se podia dar o meu número à Rute Moreira, a produtora de conteúdos de um programa que, na altura, estava a dar na TVI aos sábados e domingos de manhã, que se chamava “A Verdade de Cada Um”. Foi o primeiro programa que introduziu youtubers na televisão. A Rute Moreira agarrou no Nurb, Anny is Candy, Kiko is Hot e Diogo Sena, e fez um programa onde eles iam às escolas falar com os alunos e ver o que cada um queria, se gostavam do que aprendiam na escola, um programa meio didático para jovens, mas a agarrar nos youtubers para ter uma linguagem mais ‘fixe’ e apelativa.
Entretanto, a Rute Moreira ligou-me para entrar num projeto que ainda era secreto, com dez pessoas da internet para uma marca onde fazemos publicidade. Na altura, tinha 17 anos e nunca tinha trabalhado na vida. Comecei a perceber a dimensão do projeto e fiquei muito entusiasmada. Vivemos coisas incríveis, era um grupo muito fixe.
“O estagiário fica a trabalhar na entidade que o acolheu? Sim ou não?”
Hoje é produtora de um programa num grande canal de referência, a SIC. Como surgiu a oportunidade de trabalhar na SIC Radical?
Fui para o “Curto Circuito” através de um estágio. O meu curso tinha estágio integrado e em outubro já mandava emails para o “Curto Circuito”. Mandava mensagens para a produtora, na altura, a Madalena Belo. Não tinha um Plano B se não fosse aceite, estava convencida que, ao pedir um estágio com muito tempo de antecedência, ser muito insistente e mostrar muito interesse, ia conseguir. Em dezembro, recebi a confirmação de que tinha um estágio com a duração de três meses. No final desses três meses, existe uma ficha de avaliação do estagiário, onde há uma pergunta crucial no final: “O estagiário fica a trabalhar na entidade que o acolheu? Sim ou não?” A cruz vinha no “não” e eu pensei em viver o meu verão. No último dia de agosto, recebo uma chamada a dizer que ia deixar de estar de férias e, então, em setembro, comecei a trabalhar no “Curto Circuito”. Já lá vão quatro anos.
E como é o seu dia a dia?
O dia a dia é sempre muito diferente. Há dias muito parecidos, mas também muito diferentes. Temos sempre convidados distintos no programa, há sempre uma ideia para concretizar, mas nem sempre há ideias novas. O programa tem 21 anos e é muito difícil ter ideias novas todos os dias. Faço a gestão das redes sociais do “Curto Circuito”. Sempre que surge alguma rede social nova, entramos e tentamos dinamizar. Sou também produtora de conteúdos, assistente de produção de mim própria, porque o “Curto Circuito” tem uma equipa muito reduzida. É um programa com um orçamento reduzido e fazemos o nosso melhor. Recebo os convidados, trato também de marcar convidados, ou seja, receber propostas de pessoas que querem ir ao programa. Tenho de andar sempre atenta ao que anda a acontecer no mundo da cultura, da arte, da música, dos livros, dos autores, para ver quem pode ser um bom convidado e o que se pode fazer de divertido. Trato de muitas coisas.
“O trabalho de produção que tive foi muito importante para valorizar quando estou à frente das câmaras”
A produção é essencialmente um trabalho de bastidores. Prefere estar atrás das câmaras?
Gosto muito das duas coisas e acho que prefiro estar à frente das câmaras, mas também adoro estar na parte de trás, fazer acontecer aquilo que está à frente das câmaras. Haver um problema e poder resolvê-lo, haver um contratempo, andar a correr de um lado para o outro e, de repente, resolver aquele contratempo e as coisas acontecerem. Mesmo que um dia deixe de ser produtora para passar a ser só apresentadora – não sei se isso algum dia vai acontecer, mas se acontecer… – , sei perfeitamente que o trabalho de produção que tive foi muito importante para me valorizar quando estou à frente das câmaras.
Uma pessoa que é apresentadora e nunca esteve na parte de trás [das câmaras], por mais anos que trabalhe em televisão, até pode compreender um bocado o que se passa, mas nunca viveu aquilo… Ou seja, se estiver a apresentar um programa, sei perfeitamente quais são os problemas que estão a acontecer dentro da régie, quais os problemas técnicos. Até mesmo a forma como se dizem as coisas, sei perfeitamente o que significa.
Já aconteceu apresentar algumas vezes o “Curto Circuito” e, quando apresento, nunca largo a função de produtora, nunca há ninguém que venha para o meu lugar de produtora enquanto apresento. No dia em que tenho de apresentar, porque algum apresentador falta e tenho de tapar um buraco à última da hora, estou a acumular a função de produção. Já aconteceu estar sentada a entrevistar alguém e estar o segurança a ligar-me porque tenho de ir buscar um convidado do programa. Então, estou a apresentar um programa e estou a lembrar-me das coisas da produção. Acho que a função de produção é muito importante para perceberes e valorizares quando estás a apresentar.
Quais foram os conteúdos mais desafiantes até hoje?
Faço a cobertura dos festivais de verão. Isso é um bocado mais desafiante para trabalhar. Tem uma grande preparação, precisamos de marcar entrevistas com mil artistas que estão no festival e é muito difícil porque são artistas que não estão assim tão interessados em dar uma entrevista. Eles estão ali para dar um concerto, mas, às vezes, têm um ‘protocolo X’, então têm de nos dar cinco minutos de conversa. Para além de marcar entrevistas com mil artistas que estão no festival, temos de tentar relacionar artistas portugueses com artistas internacionais. É mais difícil ter autorizações para artistas internacionais, é difícil arranjar um tempinho livre na vida de uma Anitta, por exemplo, que acabou de chegar do aeroporto e tem de ir almoçar, vestir, maquilhar e ir para o concerto. Depois não é só a SIC Radical. São todos os outros canais e meios de comunicação, é muito difícil conciliar tudo.
Nos festivais, de facto, ando mais do que no meu dia a dia no estúdio. Ando a correr de um lado para o outro, para tentar lidar com tudo, porque temos de conciliar repórteres que estão no backstage para entrevistar artistas com repórteres que estão no terreno no meio do público, e conjugar com as pessoas que estão no set, uma espécie de cenário preparado para apresentadores e pivôs apresentarem o festival. Se isto for um recinto pequeno, como o Sumol Summer Fest, faz-se bem, não se corre muito, mas quando é um Rock in Rio… é puxado. Por vezes, há imprevistos, como um artista não poder dar a entrevista porque o concerto anterior se atrasou. Perdemos uma entrevista e, de repente, temos 15 minutos no ar sem conteúdo e temos de “encher chouriços”. Quando arranjamos alguma coisa fixe, normalmente, vamos para os repórteres que estão no terreno. Temos sempre um alinhamento, mas também estamos sempre dependentes do improviso. Isto é o mais desafiante, mas como sou muito festivaleira e são dias fora do comum, fora do estúdio, sabe-me muito bem. Posso chegar ao final do dia cansada, mas é daqueles dias que me sabe bem.
“É muito trabalho, mas também é muito recompensador, chegar ao final do dia e saber que correu bem”
Estando envolvida na cobertura de festivais de verão, como o Rock In Rio, Meo Sudoeste, Super Bock Super Rock, entre outros, para a SIC Radical, quais são as exigências que a cobertura de um festival comporta? O que é necessário?
É necessário estar em contacto com muitas pessoas, porque no “Curto Circuito” somos nós e orientamo-nos connosco próprios. Fazemos a ligação equipa-convidados-equipa técnica. Nos festivais, temos de conciliar muitas coisas. Qualquer coisa que fazemos, temos de estar sempre em comunicação com os superiores da SIC. Conforme o festival que estejamos a fazer, temos de estar em contacto com os organizadores do festival, com o Departamento de Comunicação dos artistas que estão no festival, estar em contacto com a Continuidade, que é um departamento da SIC.
Temos de saber quanto tempo de diretos temos durante o dia, para fazer um alinhamento e sabermos quanto tempo temos para marcar as entrevistas. Por vezes, quando planeamos tudo com muita antecedência, à medida que a hora se vai aproximando, esses tempos de diretos podem alterar-se. Por vezes, já temos entrevistas marcadas e temos que alterar porque os horários mudaram. Temos que marcar entrevistas com o organizador do festival, por norma, marcar entrevistas com os artistas, conciliar as caras que vão estar presentes no festival, marcar maquilhadores, cabeleireiros, guarda-roupa, porque nos festivais tens sempre um patrocínio que está a vestir os apresentadores. É muito trabalho, mas também é muito recompensador, chegar ao final do dia e saber que correu bem. Mesmo que tenha corrido mal.… há coisas que correm mal e só nós é que reparamos, outras correm mal e o público também repara, mas ninguém é perfeito, os erros acontecem e estamos cá para ir aprendendo.
O “Curto Circuito” é um programa mais direcionado para os jovens. Considera que o facto de também a Rita ser jovem ajuda a preparar o programa?
Acho que sim, porque os meus interesses naturais também, em princípio, hão de ser os interesses do programa. Por exemplo, o nosso diretor de produção/diretor de conteúdos, Jorge Amaral, tem 48 anos. Apesar de, para a idade que tem, ser muito jovem, no sentido em que está muito bem informado das coisas que estão a acontecer no mundo do cinema, da música e dos artistas, nota-se que a nível do interesse da produção, feita por pessoas mais novas que ele, ou a nível do interesse dos apresentadores, também pessoas mais novas, às vezes há uma diferença de interesses. Mas, sim, ajuda um bocadinho ser jovem, porque as coisas que vejo naturalmente no Instagram, no Twitter, na Internet no geral, vão bater com os conteúdos que o programa precisa ou conteúdos que fazem todo o sentido.
Atualmente, todos tivemos de nos adaptar devido à pandemia. Como é que a produção em tempo de pandemia se adaptou?
Basicamente, tivemos um mês sem programa, em casa sem fazer nada, porque não nos deram permissão. Entretanto, surgiu a ideia de fazermos um programa totalmente a partir de casa. Chama-se “CC Home Edition”, dá todos os sábados às 13:45h. É um programa totalmente feito em casa, sendo que a abertura, os pivôs e os comentários entre entrevistas são todos gravados pela Luana do Bem, em casa dela. Ela tem a sua mesinha, todas as semanas monta um cenário diferente, grava com uma câmara e com um microfone, tudo muito caseiro. As entrevistas são todas via Skype ou Zoom. Uma vez ou outra, vão aparecendo alguns segmentos que os apresentadores fazem em casa.
Cheguei a fazer alguns segmentos para o “CC Home Edition”, cheguei a ensinar pequenos vídeos de língua gestual, uma miniaula de braile, dicas de cozinha, cheguei a fazer algumas coisas giras. É, de facto, um programa todo feito a partir de casa, foi assim que tentámos adaptar-nos. Mais tarde, surgiu a oportunidade de voltar a estúdio e, mesmo assim, já não é todos os dias. Neste momento, estamos em estúdio uma vez por semana, aproveitamos logo para fazer dois programas: um em direto e um gravado. Ou seja, estamos com três programas semanais. Ainda não voltámos ao normal. Já passou imenso tempo, mas a pandemia ainda não nos deixou voltar ao normal.
No dia 20 de setembro, tocou cavaquinho e compôs uma música de propósito para a abertura do “Curto Circuito”. Vejo também muitas vezes na sua conta de Instagram que toca cavaquinho. A música faz parte da sua vida?
Faz, sempre fez. Sempre fui muito ligada à música e a minha vida é ir a concertos e estar a ouvir música. Na quarentena, tinha um cavaquinho em casa e pensei em experimentar, por brincadeira. Fiz uma story no Instagram e o pessoal gostou. No dia seguinte, continuava com tempo e experimentei outra. De repente, quando dei por mim, estava todos os dias a publicar um cover novo, uma música nova que tinha aprendido. Foram dois meses a tocar todos os dias e percebi que já sabia tocar cavaquinho, ensaiava e praticava muito todos os dias.
Publicava sempre à mesma hora, as pessoas já estavam à espera daquilo, mandavam-me imensas mensagens a dizer que era uma lufada de ar fresco no dia delas, ainda por cima durante a quarentena. Quando apresentei agora, da última vez, o “CC Home Edition”, pensei que não queria ir para o programa só para cumprir o que é para ser feito, só fazer entrevistas, ler telepontos e fazer o básico. Quis pensar numa coisa pessoal, que tenha o trabalho de fazer e que se veja que fui eu que fiz. Pensei em fazer uma música para a abertura do programa e foi isso que aconteceu.
“É acima de tudo lutar por aquilo que se quer. Se lutarem muito e, mesmo assim, não der resultado é porque não é para acontecer agora”
Existem muitos jovens que desejam trabalhar no mundo da comunicação e a Rita, ainda tão jovem, trabalha nessa área e num canal de referência. Quais os conselhos que lhes daria?
Acho que, seja na área da comunicação ou noutra área qualquer, é preciso terem força de vontade e tentar. Acima de tudo tentar, mesmo que dê asneira, mesmo que corra tudo mal, ao menos tentem, porque temos de mostrar vontade de trabalhar, de fazer coisas. Eu mandei o meu email de proposta de estágio em outubro e, depois, em dezembro, nunca mais recebia uma resposta. Fui eu que me desloquei. Saí de casa, fui até ao estúdio da SIC e disse que queria falar com o diretor do programa. Lutei para tentar chegar às coisas que queria. É, acima de tudo, lutar por aquilo que se quer. Se lutarem muito e, mesmo assim, não der resultado, é porque não é para acontecer agora, pode ser daqui a um ano ou dois. Não é ficar à espera de que as coisas caiam do céu. É estarem a par do que está a acontecer, quem está a trabalhar no meio, quem está a fazer coisas, estarem sempre informados para serem valorizados também.
Como se vê daqui a 10 anos?
Não faço ideia. Tudo pode estar igual, como também tudo pode ter mudado. Não faço ideia se vou continuar no “Curto Circuito” mais dez anos. Por um lado, gostava… adoro fazer aquilo. Mas, por outro lado, não gostava, porque significava que ia estar 15 anos a fazer o mesmo trabalho. Quero fazer coisas diferentes. Não sei como vai ser a Rita daqui a dez anos, nem sei como vai estar o trabalho daqui a dez anos. Gostava de já estar a apresentar um programa. Quero produzir, até posso estar a produzir um programa e apresentar outro, ou até mesmo produzir e apresentar o mesmo programa… Mas gostava de já estar a apresentar qualquer coisa, porque também gosto muito desta parte da apresentação.