É licenciado em Publicidade e Marketing, mas foi na representação e no humor que encontrou a sua vocação. Pedro Ricardo Pacheco Fernandes, mais conhecido como “Pacheco”, conta em entrevista como deixou o seu trabalho das 10h ás 18h para seguir a sua verdadeira paixão.
Na pesquisa que fiz, descobri que o gosto pelo humor e a representação está presente na sua vida “desde cedo”. O que quer dizer “desde cedo”?
Eu lembro-me de os meus pais terem cassetes de vídeo com coisas minhas a copiar, por exemplo, sketches do Herman José. Isto era muito cedo na minha vida, não me lembro que idade é que tinha, mas sempre fui muito dado aos teatrinhos na escola primária. Tinha sempre vontade de assumir os papéis principais e, depois tive oportunidade na faculdade de voltar a fazer teatro, aliás, de o fazer efetivamente pela primeira vez mais a sério, no grupo de teatro da faculdade. Acho que foi aí que voltei a perceber que era mesmo por aquele caminho que gostava de enveredar. Apesar de, na altura, ser uma coisa muito a brincar, poder pisar o palco do Trindade e do Auditório Carlos Paredes, onde tinha estado o Zé Pedro Gomes e o António Feio com o “Conversas da Treta”, trouxe-me de volta aquele gostinho e, pronto, na primeira oportunidade que tive, livrei-me do meu emprego das 10h às 18h e enveredei pelo meio artístico, e ainda bem que o fiz.
“Acho que foi aí que voltei a perceber que era mesmo por aquele caminho que gostava de enveredar.”
Estudou Marketing e Publicidade na Escola Superior de Comunicação. Foi uma primeira opção ou uma solução de recurso para uma vida profissional estável?
Foi uma coisa que achei que seria engraçada. A minha primeira opção foi Gestão Hoteleira e ainda bem que não entrei [risos], porque acho que não me ia dar bem naquele curso. Mas o nome parecia-me pomposo, acho que deve ser uma coisa engraçada e o gestor de um hotel deve ganhar bem. Depois na segunda opção, pus publicidade e marketing porque achei que era uma coisa mais divertida. Se calhar pus a primeira opção mais para agradar aos meus pais e a segunda mais para mim. Felizmente, não entrei na primeira e entrei na segunda, que me permitiu depois seguir este caminho.
Quando é que a representação e o humor deixaram de ser considerados apenas hobbies? Quando se deu a viragem?
Foram passos muito pequeninos, mas muito sólidos, não foi uma coisa muito planeada. Eu tive oportunidade de fazer uns sketches com uns amigos para a “Revolta dos Pastéis de Nata” e aí já tinha acabado o curso e já tinha emprego. Trabalhei dez anos numa agência de publicidade, mas cada vez mais ia sendo solicitado para gravar sketches para a “Revolta dos Pastéis de Nata” e para outros programas. No entanto, mantive sempre o meu emprego até que, um dia, percebi que já passava mais tempo fora do meu emprego do que nele. O próprio patrão também percebeu isso e convidou-me gentilmente a sair. Isto só aconteceu quando, efetivamente, já conseguia ganhar mais fora do meu emprego estável do que nele, portanto não foi um passo muito arriscado. Foi um passo que, na altura, me pareceu natural.
Acha que o facto de ter integrado um grupo de teatro universitário e ter ganho um concurso de comédia de improvisação, o incentivou a fazer ‘disto’ profissão? Foi decisivo (mesmo a nível de prática de palco)?
Sim, a partir do momento em que as coisas começam a correr bem, tu começas também a acreditar mais em ti e naquilo que podes fazer. Acho que o teatro foi muito importante nessa fase, mesmo para me soltar, porque era uma pessoa muito tímida e muito introvertida. Normalmente, nas pessoas que são tímidas isso não transparece para os outros. Acho que as pessoas tímidas têm duas vertentes: ou são aquelas que se fecham muito e não se dão a ninguém, ou são aquelas que acabam por se tornar um bocadinho os “palhacitos” da turma, para tentar esconder essa timidez e extravasam demasiado. Acho que isso foi um bocadinho o que aconteceu comigo. Eu tentei disfarçar essa minha timidez extravasando demasiado [risos] e quando digo às pessoas que sou uma pessoa tímida e reservada quase ninguém acredita, porque não é isso que transparece. O grupo de teatro foi muito importante nesse aspeto, até mesmo no tipo de pessoas que encontrei lá e na pessoa que nos encenava, o Miguel Barros. Fazíamos muito exercícios de confiança que nos obrigam, realmente, a ficar nos braços do outro, a depender do outro e a confiar no outro. Isso obrigou-me a soltar imenso e acho que foi muito importante para fazer o que faço agora.
“Eu acho que todos os projetos nos ajudam a dar esses pequenos passos, no entanto, esse foi um grande passo porque foram seis anos e meio.”
Como já disse, estreou-se na RTP, no programa “Revolta dos Pastéis”. Como foi o inicio de carreira na RTP, uma estrutura pesada e rigorosa, de compromisso assumidamente público?
Naquela altura, somos miúdos e não pensamos muito nessa responsabilidade e a verdade é que naquele programa não havia essa estrutura rígida. Quando se pensa no nome da RTP, toda a gente imagina uma casa com uma estrutura muito pesada, com muita responsabilidade e muitas pessoas que nos controlam todos os movimentos, e isso não aconteceu nada ali. Na altura, aconteceu da forma mais natural e amadora que pode haver: juntei-me com uns amigos, escrevemos uns sketches e fomos para a rua gravar com as nossas camaras de vídeo e apresentamos aquilo à RTP. Tivemos a sorte que a pessoa que viu gostou de algumas coisas que estavam naquela cassete e deu-nos a oportunidade de fazer a “Revolta dos Pastéis de Nata” e de começar a fazer as nossas maluqueiras lá em direto, mas nunca tivemos nenhum tipo de controlo, nem censura. Fazíamos o que nos apetecia e escrevíamos o que nos apetecia. Ainda hoje mantenho relação de amizade com essas pessoas, que já não estão na RTP, estão noutros canais, na TVI nomeadamente, e foram tempos muito bons. Foi muito bom poder crescer com essa liberdade.
E adaptou-se facilmente? Como era a primeira vez..
Muito nervoso sempre [risos] porque a minha timidez também não me deixava estar ali e estar descansado. Depois é a insegurança de tu nunca teres a certeza se o que estás a fazer é bom, se as pessoas vão achar piada, se não vão. Muitas das vezes, se calhar, não acharam e nós próprios hoje, quando vemos algumas coisas que fizemos naquela altura, também já não achamos piada. Mas acho que não se acerta sempre e é raro haver aquela pessoa que acerta sempre. Mas ainda hoje, sempre que dou um passo na minha carreira, em que acho que me estou a atirar um bocado para fora de pé ou que estou a experimentar territórios novos, sinto sempre o peso da responsabilidade e fico nervoso. Quando é uma coisa onde já estou confortável, isso já não acontece, mas esse conforto só se ganha com a experiência.
Fez parte do grupo de apresentadores do “5 para a Meia-Noite” logo em 2009. Foi este programa a rampa de lançamento para ganhar sucesso junto do público?
Eu acho que todos os projetos nos ajudam a dar esses pequenos passos, no entanto, esse foi um grande passo porque foram seis anos e meio. Acho que pode ter sido talvez, até hoje, o maior contributo para que tenha conseguido crescer, até porque as pessoas que me escolheram para apresentar aquele programa permitiram-me isso, crescer no ar, que é uma coisa que provavelmente é muito raro acontecer. Tu entras num programa completamente “verdinho”, sem saber o que estás a fazer, fazes muita coisa mal, mas as pessoas que apostaram em ti deixam-te fazer essas coisas mal, deixam-te errar e deixam-te crescer com isso, sem nunca te cortarem as pernas. Hoje, se eu vir as primeiras, segundas ou terceiras séries do “5 para a Meia-Noite”, as primeiras foram muito más, eu era muito mau a fazer aquilo, mas deixaram-me continuar a fazer, a errar cada vez mais para começar um dia a fazer bem. E eu acho que, se hoje já consigo fazer as coisas relativamente bem, foi porque me deram a oportunidade de falhar muitas vezes. Portanto, nesse aspeto, sim, acho que o “5 para a Meia-Noite” foi a minha grande rampa de lançamento, porque me permitiu fazer isso.
Atualmente, apresenta o “Café da Manhã” na RFM e já participou em projetos da Antena 3. Que papel tem a rádio na sua vida?
Até há dois anos, não representava muita coisa para mim. Sempre fui fascinado pela rádio, até porque também tive essa experiência na faculdade e dava-me imenso gozo brincar com a voz e criar rubricas e textos humorísticos para a rádio, mas só agora, com esta experiência do “Café da Manhã”, é que percebi realmente a importância que a rádio tem na criação de uma relação de proximidade com o público. Nós, na rádio, damos muito mais de nós, enquanto que na televisão, normalmente, estamos com uma missão de apresentar um programa e de dar a conhecer mais um convidado ou um artista, no caso do “Got Talent”. Aqui no “Café da Manhã” e neste tipo de rádio que fazemos, está tudo mais centrado em nós, contamos as historias do nosso dia-a-dia, das coisas que nos correm bem ou mal e partilhamos as alegrias e as tristezas, e isso cria uma relação muito próxima com as pessoas. As pessoas fazem parte daquele círculo de amigos que está ali no estúdio, é um círculo de amigos de um milhão de pessoas que te ouve todos os dias. Quando te veem na rua, sabem o que é que te aconteceu no dia anterior porque, quando estamos ali dentro, até nos esquecemos do que estamos a contar e contamos coisas da nossa vida pessoal. Acho que é um meio que cria uma proximidade que os outros meios não conseguem por causa disso mesmo: nós fazemos amizade com as pessoas sem sabermos e as pessoas fazem parte do nosso círculo de amigos e da nossa família sem nós nos apercebermos disso. Quando se fala da magia da rádio é isso mesmo.
Em 2014, estreou-se no cinema como protagonista no filme “Eclipse em Portugal”. Como correu a experiência? Como foi ser “cabeça de cartaz”?
Foi maravilhosa a experiência. Foi um mês inteiro de filmagens, um mês inteiro em que fui viver para Santarém porque, como protagonista do filme, era raro o dia em que não tivesse filmagens. E, contracenar com grandes figuras do nosso panorama artístico, foi um desafio e uma responsabilidade muito grande. Tenho pena que o filme não tenha sido um grande sucesso, mas também acho que a temática não puxava muitas pessoas para o público. Apesar de me ter dado um imenso gozo fazer, acho que o filme acabou por ser um bocadinho mal vendido. As pessoas pensavam que era um filme de terror e não era bem disso que se tratava, apesar da história do filme ser um bocadinho macabra porque é um rapaz que mata o pai e a mãe à facada. Mas foi uma experiência muito boa, muito enriquecedora e que espero repetir em breve.
Para uma pessoa tímida como diz ser, o que é mais fácil de fazer, teatro ou cinema?
Cinema, porque é tudo mais contido, é mais parecido com a televisão, estamos só entre nós a filmar e não temos o público à nossa frente. O teatro é sempre muito mais exigente e muito mais desafiante porque se correr mal, somos julgados na altura, não dá para fazer o take 2 [risos], só dá para fazer no dia seguinte. Mas o público que viu naquele dia já vai levar aquela má lembrança de nós. Portanto, acho que o cinema, apesar de tudo, é mais fácil de fazer.
Recentemente, apresentou a final do “Festival RTP da Canção” com a Filomena Cautela. Como é a preparação para apresentar um evento desta dimensão/grande importância?
A preparação é muito faseada. Tivemos muitas reuniões de guião, de construção de guião, do que é que poderíamos fazer, tendo em conta que estávamos num espaço enorme como era aquele pavilhão em Guimarães e as coisas foram crescendo. Nós fazíamos várias leituras do guião, íamos acrescentado coisas que nos iam surgindo e depois fomos melhorando. Com os ensaios no próprio local, também fomos percebendo coisas que funcionavam e que não funcionavam, e o espetáculo foi crescendo pelas nossas mãos, portanto, eu e a Filomena quando apresentámos o espetáculo já era um espetáculo que estava muito aliado nas nossas cabeças. Acho que esse é o grande segredo, ensaiar tanto e tão bem, e fazermos parte direta da sua construção para que, quando for a altura do direto, a coisa parecer o mais natural possível. Eu continuo a achar que o melhor improviso é o improviso que é bem ensaiado. Depois, tudo o que vier em cima disso serve para enriquecer mais o próprio espetáculo. E trabalhar com a Filomena Cautela também é muito fácil porque, sempre que um precisa do outro, o outro está lá, acabamos por levar sempre o barco a bom porto.
Quanto à partilha de palco, neste caso com a Filomena…é difícil gerir egos?
Não, por acaso, tenho tido a sorte das pessoas com quem tenho feito dupla na apresentação serem sempre pessoas de uma grande humildade. Não tenho sentido esse choque de egos com ninguém. Acho que sabemos sempre respeitar o espaço uns dos outros e fazer brilhar os artistas que, nesses casos, são quem mais interessa e não propriamente os apresentadores, mas cumprindo a nossa função com o melhor brilhantismo possível.
“Há fases mais intensas de trabalho e temos que os saber compensar nas fases que são mais relaxadas.”
A finalizar, como concilia a sua vida pessoal com a profissional? Sei que é pai de duas crianças..
Não consigo, a minha vida pessoal está destruída [risos]. Sim, tem sofrido um pouco. Acaba por ser por fases: tive a fase “Brainstorm” cinco semanas em que quase não consegui ver a minha família; agora tenho os fins de semana de “Got Talent”, e também com “Festival da Canção” não os consigo ver. Mas eles sabem que são sempre fases. Há fases mais intensas de trabalho e temos que os saber compensar nas fases que são mais relaxadas. É o que vai acontecer depois do final de maio porque, sei que vou ter um verão mais descansado e já vou ter mais tempo para eles.
Num trabalho destes, acaba por ser mais difícil ter tempo para a família?
É, é um bocadinho difícil. Tentamos arranjar tempo para tudo, mas nem sempre é fácil. Os meus filhos, no outro dia, chamaram-me por outro nome qualquer [risos], não sei se é o padeiro, se é o carteiro, se quem é…mas sei que, com tempo, eles vão voltar a lembrar-se do meu nome [risos].