André Rijo é licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa e, aos 34 anos, encontra-se a exercer o seu segundo mandato na Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos, depois de em 2013 ter sido eleito um dos presidentes mais jovens da história do nosso país, com 29 anos.
Em entrevista, o Sr. Presidente esclareceu porque apelida o município de Arruda de “vale encantado”: “O apelido ganhou forma graças à configuração geográfica de vale do município e deriva de vários sentidos tais como a erva arruda, a bruxa arruda e os ventos atlânticos, que permitem todo este encantamento e que tornam de facto a Arruda especial.”
Durante o seu primeiro mandato, foi eleito com 47,8% dos votos. No segundo mandato, não só foi reeleito com uma esmagadora maioria de 71,3%, como os valores de abstenção desceram dos 41,4%, em 2013, para os 37,8%, em 2017. Sente esta votação como uma prova de confiança dos eleitores?
Em primeiro lugar, é uma pergunta pertinente e focaste um ponto importante para mim. Mais importante do que os resultados eleitorais, eu diria que é o facto de termos conseguido baixar a abstenção não só em termos numéricos e percentuais, pois a abstenção baixou, mas o número de eleitores subiu entre 300 a 400 eleitores relativamente às eleições de 2013. Para mim, e para a estratégia política da minha equipa durante o primeiro mandato, era muito importante tentar envolver a comunidade e começar a fazer alguns processos de participação cívica e política como é o caso do orçamento participativo.
Era muito importante, termos uma taxa reduzida de abstenção, se bem que há ainda uma enorme margem de progressão, porque 38% de abstenção ainda é um número bastante elevado. Mas, no distrito de Lisboa, penso que é um resultado bastante animador e prova que as pessoas estão a confiar neste novo executivo. O resultado eleitoral é importante e bastante lisonjeiro, mas o resultado da abstenção, para mim teve um sabor especial, pois tivemos mais eleitores a votar e, ainda assim, a taxa de abstenção baixou, o que se traduziu numa dupla vitória para nós.
Durante o seu primeiro mandato, sempre referiu que um dos principais objetivos era fixar os jovens no município de Arruda dos Vinhos. Que estratégias adotou para concretizar esse objetivo?
No que toca a esse objetivo, temos vários desafios pela frente. Só conseguimos fixar população se conseguirmos dar aos nossos jovens condições para eles se formarem e qualificarem, pois o território necessita disso, mas também dar-lhes condições para eles poderem ter uma primeira habitação e um primeiro emprego. Nesse âmbito, temos a Invest Arruda, que é uma incubadora de empresas que prestam apoio e também uma academia de empreendedorismo com jovens, cujo objetivo é criar uma mentalidade de investimento e empreendedorismo no concelho. Por outro lado, em termos de revisão do PDM [Plano Diretor Municipal- estabelece a estratégia de desenvolvimento territorial, ordenamento do território e urbanístico], verificamos que as aldeias mais remotas estavam a ter cada vez menos população e isso devia-se, de grosso modo, aos problemas para construir habitação, restrições estas que não eram impostas pela câmara, mas sim por nível superior.
Conseguimos uma revisão do PDM, o que possibilitou que as pessoas que tivessem uma casa antiga ou ruína nos seus terrenos, e a quisessem requalificar, poderiam beneficiar de uma ampliação até mais 30% da sua área original com taxas aplicadas mais vantajosas. Inaugurámos recentemente o laboratório Irene Lisboa na escola de Arruda, que é mais uma ferramenta para qualificar os nossos recursos humanos e temos o projeto Arruda Lago, que é já um sonho antigo, que tem como objetivo trazer o ensino politécnico para o concelho de Arruda. Posto isto, o nosso concelho está a menos de metade da média nacional em termos de desemprego, ou seja, é um dos municípios que tem menor taxa de desemprego a nível nacional, e isto é importante para nós, porque só com emprego é que os jovens se conseguem fixar.
Outra das suas prioridades durante o seu primeiro mandato foi contribuir para a fixação de empresas no concelho. Teve sucesso nesse aspeto?
Sim, obtivemos. A zona industrial das Corredouras teve uma importante expansão. Neste momento, existem lá novas fábricas a criar postos de trabalho. Na zona industrial de Adoseiros, temos uma nova indústria que se está a expandir. Na zona de A-Do-Barriga, estão a ser dados os últimos retoques com vista à inauguração de um lar. Na zona industrial de reciclagem de Arranhó (ZIRA), foi possível rever um problema antigo que era a questão do plano pormenor, derivado ao seu difícil acesso. Neste momento, é uma zona industrial em desenvolvimento que já começa a ter algum investimento.
Temos conseguido captar algum investimento e, de facto, as verbas que estão utilizadas no atual quadro comunitário “Portugal 2020” por contraposição ao antigo quadro comunitário que era o “QREN”, vão no sentido de que os empresários de Arruda estão mais dinâmicos e têm, de facto, mais capacidade de investimento. Assim sendo, eu penso que esta estratégia é para continuar, porque as empresas conseguem dar emprego e oportunidades aos nossos jovens.
“A nossa ideia é candidatar estas tertúlias móveis a património imaterial nacional num futuro próximo e quem sabe posteriormente, realizarmos o nosso sonho e ir mais além, candidatarmo-nos à UNESCO”
Nesse primeiro mandato, as suas áreas prioritárias de atuação municipal foram as económicas e sociais, mas desenvolveu também a vertente cultural e um exemplo disso é o Mercado Oitocentista. Será que nos pode falar dos projetos culturais do município?
Para além de estarmos focados em continuar a dinamização dos projetos que iniciámos e que já estavam também em vigor, temos também um outro desafio que está a ser concretizado, e muito bem, que é a planificação do Centro Cultural do Morgado, provavelmente o nosso auge em termos culturais no concelho. Existe uma programação quase semanal de eventos no nosso Centro Cultural do Morgado como, por exemplo, a galeria, o auditório, a biblioteca, entre outros. Neste momento, vamos apostar um pouco no património imaterial com a candidatura das tertúlias móveis, que é um movimento que existe nas festas de agosto nas largadas de toiros e que movimenta bastante população do nosso concelho.
A nossa ideia é candidatar estas tertúlias móveis a património imaterial nacional num futuro próximo e quem sabe posteriormente, realizarmos o nosso sonho e ir mais além, candidatarmo-nos à UNESCO. Paralelamente a isto, estamos a desenvolver um projeto chamado Arruda Base que é um software de virtualização de património, onde neste momento temos recriado a Arruda do final do século XIX, e estamos a usar ferramentas tridimensionais de valorização do património da igreja matriz. Com novas plataformas online, como o “Descubra Arruda”, entre outras, estamos a tentar virtualizar o nosso conhecimento, a nossa história e a nossa cultura, e continuar este caminho.
Arruda dos Vinhos é um concelho que se encontra a cerca de 20/30 minutos de automóvel da capital de Portugal, Lisboa. Encara isto como uma vantagem?
Encaro. Numa conferência realizada há algum tempo atrás aqui em Arruda, tivemos a oportunidade de contar com a presença do professor João Ferrão, que é provavelmente um dos melhores geógrafos portugueses da atualidade. Ele disse que Arruda e concelhos com esta potencialidade têm condições para serem “charneira” no desenvolvimento coletivo.
Ele refere-se a Arruda como um exúrbio, zonas com média dimensão que já estão suficientemente afastados das metrópoles para não terem problemas de urbanidade, como os problemas de segurança, bairros problemáticos, entre outros, mas estamos suficientemente perto para ter acesso a uma variedade de ferramentas, como o acesso ao mercado de trabalho extremamente competitivo, a um polo cultural e académico extremamente vigoroso e de beneficiar com algum fluxo turístico de Lisboa, neste momento. Somando todos os prós e contras desta proximidade, eu diria que é, de facto, um fator de competitividade muito importante para o município e que é, sem dúvida, um fator gerador de mais-valias para o município.
E quanto a desvantagens?
Em certo ponto, a proximidade que temos a Lisboa pode criar um problema, pois Arruda é uma vila atraente para residir, mas por vezes os residentes que vêm morar para cá acabam por não criar uma grande ligação à terra, ou seja, vêm cá apenas para dormir. O nosso desafio passa por integrar estes novos residentes para que possam trazer valor acrescentado à nossa terra e não venham cá apenas dormir e levar os filhos à escola. Nós queremos que eles se integrem na nossa comunidade.
“Eu diria globalmente que o mandato foi positivo”
Pelo que me disse ao longo da entrevista até agora, podemos concluir que o primeiro mandato foi um sucesso. Mas, certamente, não foi tudo um mar de rosas. Que dificuldades encontrou ao longo desta jornada?
Não gosto de ser juiz em causa própria, porque nesse juízo acabamos sempre por ter fatores pessoais que influenciam a nossa tomada de posição. Mas, eu diria globalmente que o mandato foi positivo. Antes de arrancar na campanha eleitoral para as autárquicas de 2017, eu e a minha equipa fizemos um balanço, onde foi possível constatar que cumprimos 85% do manifesto eleitoral que tínhamos apresentado a votos, e, enfim, cumprimos aquilo que dissemos às pessoas que íamos fazer, pois a meu ver, isso é o dever de qualquer político que se preze. Falhámos com algumas coisas que dissemos que íamos fazer e não conseguimos, mas penso que neste segundo mandato temos as condições necessárias para o fazer. É uma tarefa difícil, mas não me queixo porque gosto muito do que faço, e tem sido uma função que tenho procurado desempenhar com muita dedicação, trabalho, vontade e gosto. Mas há, de facto, algumas pedras no caminho.
A dívida da câmara era uma dívida muito grande, os recursos humanos e até materiais encontravam-se numa situação de extrema fragilidade. Neste momento, temos várias limitações relativamente à gestão do ponto de vista legal e procedimental. Costumo dizer, em tom de brincadeira, que para comprarmos um parafuso para a câmara, necessitamos de dois meses, porque a máquina burocrática é muito grande, são precisos diversos procedimentos e cumprimento de legislações. A minha principal frustração nesta função é o facto de ser tudo muito burocrático, é preciso esperar por pareceres de várias identidades que demoram imenso tempo a responder e é preciso estar constantemente a fazer pressão nas mesmas, para estas nos darem as permissões de que precisamos. Mas, independentemente do que referi, não me queixo. Existem dificuldades em todas as profissões e funções, porque neste caso não considero que isto seja uma profissão, mas sim uma função. Costumo dizer que não sou presidente mas, sim, que estou presidente. Há dias bons e dias menos bons, e é importante para as lideranças para saber digerir o insucesso, pois nem tudo é um mar de rosas, como tu há bocado referiste [risos].
O orçamento previsto para a Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos é de 12,8 milhões de euros para 2018, menos 1 milhão de euros do que o orçamento do ano anterior. Irá este decréscimo influenciar, de alguma forma, os principais objetivos do mandato para este ano?
Os orçamentos têm ciclos. Há ciclos mais expansionistas e ciclos menos expansionistas. Quando eu e a minha equipa tomámos posse, a dívida da câmara rondava os 7,5 milhões de euros e, atualmente, está a rondar os 5,2/5,3 milhões de euros. Nós conseguimos reduzir a dívida, sem paralisar a atividade da câmara e sem comprometer o investimento que achávamos que era importante para o concelho. Neste momento, estamos a realizar vários projetos, tais como: requalificação do bairro João de Deus, plano de requalificação do mercado municipal e do antigo edifício do posto da GNR para a adaptação ao Arruda Bar. Temos plena consciência de que não vamos ter possibilidades de realizar todas essas obras ao mesmo tempo, mas também não é problemático, uma vez que estamos a trabalhar nos projetos e em candidaturas a fundos comunitários para os podermos financiar.
Já estávamos à espera que o orçamento para este ano fosse baixar, uma vez que não iríamos ter tanta força de obra como tivemos no ano anterior, mas, em todo o caso, temos duas grandes obras em curso no município, e para um município da nossa dimensão já tem impacto orçamental. Estamos a falar do parque urbano das rotas que está praticamente a chegar à sua conclusão e que será pago este ano e também a requalificação da escola de Arruda, com um custo de sensivelmente 650.000€. Quanto aos ciclos orçamentais, é normal eles oscilarem de ano para ano, e este ano é um ano de ajustamento, mas não compromete de todo o investimento, porque estamos com duas grandes obras em curso. Relativamente ao próximo ano, acredito que o orçamento venha novamente para a casa do 13 milhões de euros. Encaro estes ciclos com normalidade na gestão orçamental e o nosso objetivo é deixar um saldo equilibrado para as gerações futuras e não comprometer o executivo que vier a seguir.
“O manifesto eleitoral é um projeto e uma previsão e, como tudo na vida, há situações que podem levar a que as prioridades se alterem”
O que podemos esperar para este segundo mandato? A concretização do que foi prometido em campanha?
Costumo dizer que se não conseguirmos 100%, vamos tentar os 99%, se não conseguirmos os 99%, vamos tentar os 98%. Em todas as reuniões que tenho com os chefes e com os vereadores, levo o manifesto autárquico comigo e as prioridades são definidas em função daquilo que dissemos às pessoas que iríamos fazer. O manifesto eleitoral é um projeto e uma previsão e, como tudo na vida, há situações que podem levar a que as prioridades se alterem. Só para termos uma ideia desta realidade, ainda na última reunião da Associação Nacional de Municípios, em Coimbra, estive a falar com o meu colega presidente de Câmara de Oliveira do Hospital, que foi fustigada pelos incêndios do passado dia 15 de Outubro.
Ele dizia que estava a entrar para o seu terceiro e último mandato e que tinha vários sonhos e objetivos ainda por concretizar, mas que, naquele momento, o seu único sonho era que todas as pessoas que perderam as suas casas devido aos incêndios tivessem casa até ele terminar o mandato. Isto para termos a ideia de que certas circunstâncias podem, de facto, alterar um manifesto autárquico. Mas, se tudo correr dentro do previsto, naturalmente que o meu compromisso com as pessoas é cumprir aquilo que disse que ia fazer. De qualquer forma, nunca podemos prometer isso porque em determinado momento, podem surgir certas circunstâncias que nos ultrapassem e determinem que as opções políticas e prioridades possam ser alteradas. Sem dúvida que queremos cumprir aquilo que dissemos que íamos fazer, e estamos firmemente empenhados. Eu próprio serei intransigente no que toca ao manifesto autárquico.
Um dos principais motivos de sucesso do 1º mandato foi o cumprimento de 85% do manifesto autárquico. Crê ser possível atingir novamente este patamar durante o seu segundo mandato?
Eu creio que sim. Penso que os 85% são exequíveis, honestamente acredito. Quando chegarmos a meio do mandado, daqui a um ano e alguns meses, terei uma melhor perceção se é possível ou não, mas a experiência do anterior mandato diz-me que os 85% começam-se a construir no dia seguinte às eleições. Começámos a trabalhar no dia seguinte às eleições, portanto, estou convicto de que vamos conseguir chegar novamente aos 85% ou mais.