É um nome bem conhecido da música em Portugal, em particular da geração mais jovem. Aos 12 anos começou a escrever, a compor e a gravar. Sempre se imaginou a fazer música, já que a família é uma das suas maiores inspirações. Depois do crescente sucesso nas plataformas online e do lançamento de três álbuns, está prevista para breve a estreia do próximo EP, “Silêncio Caviar”, que confessa ter sido o seu melhor trabalho até hoje.
Acabou de lançar o tema “Nevoeiro” que faz parte do seu próximo EP e é uma colaboração com Papillon que, por curiosidade, foi aluno da Universidade Autónoma de Lisboa. Como surgiu?
Já conheço o Papillon há uns bons tempos. Sou fã do trabalho dele e ainda não tinha surgido a oportunidade de gravar. Não é por sermos conhecidos ou amigos que temos logo de gravar juntos! Temos de encontrar um som que faça sentido. Se isso só aparecer um ano depois, aparece. Neste caso, foi isso que aconteceu.
Estava aqui [no estúdio], fiz uma música, um instrumental e um refrão. Quando olhei para aquilo, imaginei que iria ficar brutal, principalmente depois de ter ouvido o álbum dele. Ele concordou, veio ao estúdio, e foram dois dias, escreveu aquilo num dia e gravou no outro, foi muito rápido.
Então foi um processo muito espontâneo, certo?
Sim…
Ainda a propósito desse novo EP que irá sair em abril ou maio, porquê “Silêncio Caviar”?
É um EP que é para ouvir em silêncio, no sentido em que é uma cena mais introspetiva, em que me estou a abrir mais e a falar de cenas mais pessoais. É um EP que, independentemente do sítio, seja em casa ou no carro, é para parar e ouvir. Já fiz muita música para tocar na rua ou para ir sair e ouvir. No caso deste EP, eu gostava que quando as pessoas o ouvissem, parassem, fizessem silêncio, e se pusessem a ouvir com atenção.
Este foi sem dúvida o melhor trabalho que realizei até hoje. Sempre fiz muita música, mas desta vez preferi não fazer tanto em quantidade e fazer mais em qualidade, ou seja, preocupei-me muito com as letras, com o instrumental, com a gravação. Espero que seja um silêncio requintado.
O que distingue “Silêncio Caviar” do seu último álbum “No Fame”, lançado no ano passado? Há diferenças evidentes?
Todos os álbuns, corram melhor ou corram pior, são sempre um caminho para chegar aqui. Só cheguei às coisas e à sonoridade que estou a fazer agora porque antes fiz o “No Fame”, e antes do “No Fame” fiz o “Leva-me a Sério”.
O “No Fame” não deixa de ser uma ponte para as coisas que ando a fazer e teve o mesmo processo de trabalho que teve o “Leva-me a Sério”.
Durante um ano ou dois, fiz muita música, e quando chego à altura em que decido que é para lançar um álbum, dessas 30 ou 40 músicas, escolho 10 e lanço. Nunca tive esse conceito de uma música estar ligada a outra e sucessivamente. É como se fosse uma playlist daquilo que acho que foram as melhores músicas que fiz durante um ano, junto todas e ponho no disco.
Este EP é um trabalho que é mais redondo, pois a primeira música bate certo com a segunda e a segunda música bate certo com a terceira. Tem esse cuidado extra.
Então teve um processo criativo diferente?
Sim, sem dúvida.
O auge do sucesso
É inevitável falar um pouco da família, já que é filho de Paulo de Carvalho e Helena Isabel. Começou a sua carreira aos 12 anos a compor e a produzir a sua própria música e, posteriormente a escrever para outros como Mariza, Rita Guerra, a sua irmã e o seu pai. A família foi a sua principal fonte de inspiração?
Foi uma das fontes, sem dúvida. Nem consigo dizer que não porque não tenho outra experiência. Obviamente que comecei a ouvir muita música porque na minha casa ouvia-se tanto a que era feita por quem lá morava, como a que quem morava lá ouvia. Houve uma altura, com esses 12 ou 13 anos, em que comecei a querer fazer e descobrir a minha própria música, todos nós temos isso, que é, a uma certa idade nós ouvimos o que os nossos pais ou o que quem está à nossa volta nos mostra e, depois, começamos nós a querer escolher o que gostamos de ouvir. No meu caso, foi de ouvir e de fazer.
A família foi também uma grande influência a nível da minha maneira de estar na profissão. Noto grandes influências tanto da parte da minha mãe, como da parte do meu pai, o não haver vedetismos e o sermos todos iguais, no sentido em que o cantor não é mais do que o músico que acompanha a bateria ou a guitarra. Ganhei muito com essa maneira de estar.
Musicalmente falando, chegou uma altura, com 12 ou 13 anos, que peguei em tudo o que já tinha ouvido até essa idade e comecei a ganhar um gosto próprio. Tanto que, até ao dia de hoje, ainda musicalmente falando, não tenho nada a ver com o que o meu pai faz. Mas, sem dúvida, essa influência esteve sempre lá.
Alguma vez se imaginou a ser o músico que é hoje, com tanto sucesso?
Não, mas sempre me imaginei a fazer música, com mais ou menos sucesso. Nunca me via a fazer outra coisa.
Isso foi uma sorte que tive, e que há muita malta mais nova que não tem: é a sorte de muito cedo já se saber o que quer. Tenho amigos que nem com 16, nem com 20 estavam perto de saber o que queriam fazer. Portanto, nessa parte estava tranquilo.
Podia resultar, tanto como podia não resultar. Sempre disse que, mesmo se eu tivesse outra profissão qualquer, ia sair do trabalho, chegar a casa, abrir o computador e fazer música, nem que fosse só para eu curtir.
Relativamente ao sucesso, gosto de acreditar que tem a ver com trabalho. Sou uma pessoa muito metódica, calculo quase como uma distância os passos todos que vou dar e sempre fui um bocado assim. Gosto de acreditar que o possível sucesso possa ter a ver com isso.
Falando em sucesso, foi no auge em 2015, se não estou em erro, que as plataformas digitais começaram a assumir um papel mais importante, principalmente na divulgação artística. Considera as redes sociais um fator decisivo para a consolidação da sua carreira?
Sim, começaram a aparecer as redes sociais, o YouTube também. Na verdade, as minhas primeiras músicas que foram parar ao YouTube nem fui eu que as publiquei lá…
Foram os seus fãs…
Exatamente, mas na altura nem os considerava fãs. Antigamente, na escola, a malta passava músicas que a gente curtia em CD ou numa PEN. Quando os meus amigos passavam as músicas lá da Beyoncé ou de quem quer que fosse, no meio dessas vinte ou trinta músicas, estava lá uma ou duas minhas. Mais tarde ou mais cedo, quando apareceu o YouTube, essa PEN já tinha passado por pessoas que publicavam as músicas no YouTube.
Ao início ajudaram-me, mas nem foi propositado. Nem sabia bem que existiam as redes sociais, as músicas foram lá parar. Depois, naturalmente, comecei também a interessar-me. Não vou dizer que fui o primeiro, mas fui dos primeiros a atuar nas listas das escolas secundárias, com a “wella” por exemplo. Fiz muito disso, por isso gosto de acreditar, sem ter a presunção de dizer que fui o primeiro, mas, sim, fui dos primeiros a fazer essa cena que no dia de hoje é normal e que todos fazem quando estão a começar.
Para além da imagem
O Agir marca pelo seu visual diferente que lhe garante ser reconhecido facilmente em qualquer lugar. Enquanto autor, há uma mensagem central que pretende transmitir ao seu público. E enquanto homem?
Boa…nunca me pus a pensar nisso, mas se todos fossem um bocado como eu, provavelmente havia muita coisa que não andava para a frente, no sentido em que não sou uma pessoa de defender muito as bandeiras, sou excessivamente pragmático.
Nos dias de hoje existe mais gente que tem tatuagens do que gente que não tem, não é por aí. Mas eu tenho noção que quando comecei a fazer, se fosse andar de metro, ia ter alguém a olhar para mim. Nunca fui nada revoltado nesse aspeto, sempre me passou ao lado. No entanto, não é porque a mim me passa ao lado que não seja efetivamente um problema, e que não devam existir pessoas a falar disso e a tentar lutar contra isso.
Acho que quando gostamos de um artista, gostamos de saber também as coisas que ele defende. Mas, na minha opinião, o meu dever, ou seja, o que devo mostrar e garantir que é bem feito é música. Tudo o resto é um extra. Não acho que seja a obrigação de um artista defender seja o que for, e as pessoas saberem o que ele defende. Acho que nós, enquanto pessoas, é que devemos decidir fazê-lo ou não. Obviamente, se tivermos mais exposição mediática, devemos lutar pelas coisas em que acreditamos, mas não acho que um artista seja menos nobre se não o fizer. Não sou uma pessoa desligada a nível solidário, simplesmente acho que as pessoas devem ser observadoras e perceber através das letras. Um artista não tem obrigatoriamente de ser um exemplo. Tem de fazer boa música, tal como o arquiteto tem que fazer um bom prédio. Tudo o resto é um extra que, se vier, ainda melhor. Mas não faz de ti menos artista, se não quiseres dar a cara por uma data de coisas que se devem fazer na vida pessoal. Se calhar, faço cenas solidárias todos os dias ou trabalho com pessoas todos os dias, e sou discreto nesse sentido.
Então transmite esse exemplo através da música?
Sim. No entanto, não seria menos artista por fazer música de festa que transmita zero “coisas” sociais. Tem de haver de tudo…A verdade é que uma música que me ajude a não pensar rigorosamente em nada tem tanto valor como uma música que me ponha a pensar em coisas interessantes. O entretenimento e a arte têm esse poder muito bom, de escape, que muitas vezes não é valorizado pelas pessoas. Tenho músicas que quero que as pessoas percebam pela sua letra, mas também tenho outras que não quero que as pessoas pensem e apenas que se divirtam, e isso tem exatamente o mesmo valor.
Entrevista realizada em março de 2019.