É com conta, peso e medida que as lojas de venda de produtos a granel têm conquistado cada vez mais espaço em vários países europeus, incluindo Portugal. Sem embalagens descartáveis e sem plástico, mas com mais variedade, personalização e consciência ambiental, esta prática de combate ao desperdício é hoje a solução para muitos consumidores que procuram formas de vida mais amigas do ambiente.
Numa reinvenção e retoma do tradicional, impulsionadas pelos hábitos de desperdício a que se assiste diariamente em todo o Mundo, os termos a granel ou avulso fazem, agora, parte do dicionário dos consumidores que começam a trocar o grande comércio convencional por pequenas lojas de bairro, renovando a ideia do grão a grão, à vontade do freguês.
Com uns gramas de modernidade e uns quilos de nostalgia, as novas lojas a granel, que têm cativado jovens e graúdos, oferecem uma viagem no tempo, combinando a recordação do passado com o pensamento focado no futuro a nível ambiental, social e económico.
Balanças, dispensadores, frascos de vidro e sacos de pano são os ingredientes principais destas lojas que têm como propósito final aliar a sustentabilidade a uma vida mais saudável, sem químicos, sem desperdício e com mais consciência e responsabilidade.
De facto, de acordo com um estudo intitulado Projeto de Estudo e Reflexão sobre o Desperdício Alimentar (PERDA), de 2012, realizado pela Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Nova de Lisboa, produz-se em Portugal um milhão de toneladas de desperdício alimentar por ano, sendo que 31,4% acontece ao nível do consumidor, com uma grande parte dos produtos a serem desperdiçados mesmo ainda antes de serem desembalados. É no sentido de transformar esta tendência que é motivada, sobretudo, pela falta de flexibilidade que os grandes retalhos disponibilizam na compra dos bens alimentares (e não só), que as lojas a granel, como a Maria Granel, têm sido exemplo de espaços que muitos consumidores começam a frequentar para realizar as suas compras.
Eunice Maia, fundadora da loja Maria Granel, a primeira zero waste store (designação comum para “loja de desperdício zero”) e mercearia biológica a granel em Portugal, tem já dois espaços físicos localizados em dois bairros tradicionais: em Alvalade, onde surgiu a primeira loja, em 2015, e em Campo de Ourique, com a segunda loja aberta desde 2018.
Aqui, a qualidade e o respeito pelos produtos são essenciais, tendo sempre presente o cumprimento do triângulo de impacto “ambiental, social e económico”, como refere Eunice, que assume como lema “consumo responsável, consumo sustentável: diminuição do desperdício”.
O mesmo reconhece Joana Botelho Gomes, de 31 anos, que começou a comprar a granel pouco depois de voltar de Londres. “Conheci a Maria Granel quando ainda havia apenas a loja de Alvalade e, desde aí, tem sido toda uma jornada de redução de desperdício”, afirma.
A sua fidelidade à loja é a mesma de outros tantos, que veem neste tipo de comércio uma mão cheia de oportunidades de escolha e, acima de tudo, numerosas vantagens.
Onde o antigo volta a ser moda
Nas pequenas mercearias de bairro onde se vendiam os grãos de café, a farinha, o feijão, a manteiga e o açúcar para satisfazer os inúmeros “fregueses” que por lá passavam na procura pela melhor qualidade, o papel e o pano eram os materiais que compunham os sacos ou as cestas para o transporte dos produtos.
O bacalhau vestia-se de papel de jornal e os azeites e vinhos em garrafas de vidro que eram levadas pelo cliente para a loja, para que a normalidade que era o granel permitisse a cada um escolher a quantidade que pretendia. Cada produto era pesado nas grandes balanças que ilustravam a casa e os sacos de serapilheira enchiam-se, pouco a pouco, com os papéis que embrulhavam o sal ou o pano que levava o pão, para depois serem calculados a papel e a caneta, na busca do preço final. Nestas lojas tradicionais, a tradição era também o “livro dos fiados”, que servia para apontar as dívidas de quem não pagava na hora os grãos que daquelas portas nos bairros espalhados por cidades e vilas saíam.
De facto, antes da “era do plástico” que transformou toda a indústria do comércio e mudou, negativamente, o panorama ambiental global, a grande maioria dos produtos, incluindo até os de higiene pessoal, eram vendidos grão a grão, grama a grama ou à unidade nestas pequenas lojas que viram a sua memória diluída com o tempo e com o crescimento dos grandes retalhos.
Relacionado com este tipo de transformação comercial, o plástico, que começou a ganhar cada vez mais presença em Portugal a partir dos anos 70 e 80, foi também motor para que o consumo avulso fosse diminuindo, arriscando mesmo a sua extinção na totalidade. Hoje, esta imagem está inscrita na produção de mais de 400 milhões de toneladas de plástico por ano, dos quais cerca de 40% são utilizadas em embalagens e sacos, usados uma única vez e depois descartados, segundo dados do National Geographic de 2018.
Contudo, com o tema da sustentabilidade e da preocupação com o desperdício a ganhar a visibilidade necessária recuperou-se o imaginário deste tipo de comércio a granel, pondo nas bocas e nas vidas de tantos a recordação dos tempos antigos que voltam, hoje, a ser moda. E desse público adepto do granel, o grupo é bastante diversificado. “Nós temos uma afluência transgeracional, maioritariamente constituído por mulheres. Estamos a falar de uma percentagem elevadíssima, na ordem dos 80% e uma faixa etária que é sobretudo dos 25 a 45 anos. Mas é mesmo muito transgeracional”, refere Eunice Maia. E acrescenta: “os mais velhos vêm por uma questão de nostalgia da sua infância e das mercearias antigas de bairro a granel. Os mais jovens, que envolvem o resto da família, vêm à loja, por exemplo, porque fazem uma mudança de alimentação, passando a uma alimentação à base vegetal”.
O grão a grão de boca em boca
Se as lojas antigas a granel tinham como característica principal o atendimento personalizado e a proximidade entre cliente e comerciante, hoje, esta regra não é exceção. Como revela Joana Botelho Gomes, “em lojas como a Maria Granel, o atendimento é sempre mais informal e próximo do que em qualquer grande superfície. Como os espaços também são mais pequenos, os funcionários conseguem conhecer melhor os produtos, as origens dos mesmos e até dar dicas, oferecer workshops ou aulas”.
Escrito a giz ou a caneta está o nome e o preço de cada produto nos dispensadores de acrílico, uma vez que nestas lojas não há rótulos. Assim, a confiança nos “sábios” que estão atrás do balcão torna-se em mais um dos valores chave deste comércio, que se destaca também pela diversidade de produtos. “Temos um portefólio que conta, neste momento, com 1800 produtos, dos quais cerca de 800 são parte alimentar. Portanto, seja nas especiarias, nos cereais, nas granolas, nos chocolates, ou nas bolachas, de facto, temos muita variedade”, explica Eunice Maia, da Maria Granel.
Através do self-service, agora controlado devido à pandemia da Covid-19, todos os clientes das lojas a granel são encorajados a introduzir nas suas compras o sistema BYOC – do inglês Bring Your Own Container (“traga o seu próprio recipiente”) – de modo a evitar, ainda assim, as embalagens de papel, por exemplo, que, apesar de não serem de plástico, geram igualmente desperdício, se não forem reutilizadas.
É o que explica Catarina Barreiros, de 28 anos, especialista na área da sustentabilidade. Com o blogue e loja online Do Zero, mostra como é “tentar viver uma vida sem lixo, sem desperdício, com a mínima pegada ecológica possível”. Refere que “o uso dos sacos de papel para a compra a granel em relação aos de plástico, segundo a literacia, tem mais desvantagens do que vantagens porque, para compensar a produção de um saco de papel em relação à do saco de plástico, o saco tem de ser usado mais de quatro vezes”.
Ao contrário do plástico que, apesar de poluidor quando é mal utilizado e descartado, é um material resistente, de longa duração, impermeável, maleável e leve, o papel é um material “muito mais quebradiço e estraga-se mais facilmente do que o plástico. Ou seja, se não usarmos o saco de papel para comprarmos as compras a granel pelo menos quatro vezes, então, o impacto em relação ao ciclo de vida do produto é superior, visto que foram deitadas abaixo árvores para fazer o papel e foi usada muita água para o seu tratamento”, acrescenta Catarina Barreiros.
Na loja Maria Granel, os sacos de pano ou os frascos de vidro são, por isso, os meios de transporte de eleição de produtos biológicos com certificação provenientes de fornecedores nacionais, mas também internacionais, caso haja essa necessidade. “Como se trata de produtos biológicos certificados, nós temos de facto uma percentagem mais reduzida de produtores nacionais. Seria bem mais fácil se comercializássemos produtos frescos. Aí, seria possível não só ser nacional, mas falar de produtos a um raio de 50 quilómetros e de produtores locais…” Contudo, as lojas a granel vendem, sobretudo, mercearia seca, que inclui os cereais, os chás, as especiarias, as leguminosas e os frutos secos e, “portanto, o nosso país não produz o suficiente para abastecer todo o mercado e toda a demanda da parte da mercearia seca a granel biológica”, completa Eunice Maia. No entanto, para ela, sempre que for inevitável uma importação, a preocupação passa não só por escolher “a qualidade e obviamente, produtos com certificado biológico, mas também certificação por entidades competentes, validadas e independentes do ponto de vista do comércio justo”.
Dispostos a praticar um consumo responsável, consciente e com liberdade, resultante da possibilidade de escolher o que se quiser e da quantidade que se necessitar, os clientes destas lojas vêm, sobretudo, depois do “boca em boca” de familiares ou amigos. E o conforto do espaço familiar, em comunidade e a confiança que oferecem não os fazem mudar de hábitos outra vez.
Poupar na carteira, ganhar na qualidade
Aliado à sustentabilidade, à proximidade ao comerciante, à qualidade dos produtos, à não utilização de aditivos ou químicos e à nostalgia do antigamente, comprar a granel consegue ser, também, mais económico.
Pela parte do consumidor, ao adquirir apenas as quantidades necessárias, sem o risco de desperdício porque há a sobra ou o estrago, no final, as compras tornam-se mais acessíveis e têm maior poupança, em comparação às lojas convencionais. Outro fator prende-se com o facto de ser tratar de mercearia seca e, portanto, os prazos de validade são mais alargados. Ao durarem mais tempo, como por exemplo os chás ou especiarias, menos é gasto nas compras, contrariamente ao que acontece com o consumo regular e quotidiano de produtos frescos, que implicam consumo de energia e de água.
Para o consumidor, a compra de produtos não alimentares a granel, são também uma mais valia económica. Detergentes, cosmética e produtos de limpeza, por exemplo, em formatos sólidos, para além de não serem envoltos em plástico, apresentam uma maior durabilidade e, portanto, torna-se para cada cliente, mais económico a longo prazo. Desconhecidos ainda da maioria do público, produtos como as nozes de saponária para a limpeza da roupa, manteiga de cacau para o creme corporal ou pastilhas dentífricas, são para outros, mais curiosos, produtos da rotina habitual. E todos são vendidos a granel.
Outro fator para que se torne mais barato a compra avulso, explica-se pela possibilidade de comprar pequenas quantidades de produtos desconhecidos, de forma a serem experimentados pela primeira vez, sem o risco de ser gasto dinheiro em algo que não se vai voltar a consumir. O mesmo afirma Eunice Maia, que na sua loja, “no caso dos superalimentos, como a matcha, a spirulina, o açaí ou a baunilha, há muita gente que quer experimentar, mas são produtos extremamente caros. Por isso, no caso do granel, oferecemos a possibilidade de experimentar e perceber se gosta ou não e, nesse caso, levar apenas uma pequena quantidade controlada que não se desperdiça”. E acrescenta que, “quando pensamos a longo prazo, mesmo que o produto tenha sido ligeiramente mais caro comprado a granel, a verdade é que, como foi uma quantidade pequena, transforma-se também numa poupança económica”.
E se, do lado do consumidor, comprar a granel pode ser mais barato, para os comerciantes, a fórmula para praticar preços mais acessíveis para o público é justificada pelas compras em grandes quantidades, “que chegam às lojas embalados em sacos muito grandes e geralmente transparentes, de monoproduto”, afirma Catarina Barreiros. Assim, ao acarretar uma poupança económica, acarreta, igualmente, uma poupança ambiental, visto que “os sacos do embalamento a granel são mais facilmente recicláveis, não só pela sua dimensão como também por serem mais simples, devido à transparência do plástico, que se recicla melhor que os outros”, completa a especialista.
A este argumento, junta-se a não utilização de embalagens para o transporte para casa dos clientes, mas também o uso de dispensadores para armazenamento, o que implica uma redução dos custos de logística do espaço.
Para a confirmação destas razões, que tornam o consumo a granel mais acessível da parte dos comerciantes para os clientes, a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (DECO) realizou um estudo em 2014, que comprovou que a venda a granel é mais barata do que produtos iguais, pré-embalados, em 65% dos casos. As maiores diferenças notam-se nas especiarias, nos frutos secos e desidratados, nas leguminosas e também nos aperitivos.
E se os prós para a compra a granel são variados, a equação completa-se com a ainda promoção de uma economia circular.
Contrariamente à economia atual, baseada num modelo linear que faz uso recorrente dos materiais naturais até serem descartados como resíduos, com grande impacto energético e consequentemente ambiental, ao comprar a granel propicia-se uma economia inspirada nos mecanismos do próprio ecossistema. A economia circular pressupõe o reaproveitamento, a reutilização, a reparação e a reciclagem dos produtos e embalagens já existentes, aumentado a sua longevidade nas mãos de quem compra e de quem vende. E, portanto, “as compras a granel podem permitir a reutilização dos frascos e sacos que nós temos em casa. Assim, a circularidade está na parte do embalamento”, como alude Catarina Barreiros.
Comprar avulso é, acima de tudo, comprar à medida. Dos gostos e do bolso de cada um.
Lado a lado com o ambiente
Se comprar a granel é o consumo da moda dos dias de hoje, muito se deve às mudanças de conhecimento sobre o impacto das alterações climáticas no ambiente que, a pouco e pouco, tem feito mudar de vida muitos consumidores.
Consciencializados e com certeza da sua compra, quem compra avulso reduz significativamente o consumo de plásticos, de embalagens descartáveis e, sobretudo, impede o desperdício alimentar. Números alarmantes da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), mostram que um terço de todos os alimentos que são produzidos para consumo humano de todo o mundo perdem-se ou são desperdiçados, desde os campos de cultivo aos pratos de cada um. Inegavelmente, para além do impacto social que se traduz pela desigualdade de, ao mesmo tempo que são desperdiçadas toneladas de alimentos, 820 milhões de pessoas passam fome, segundo a World Wide Fund for Nature (WWF) e do impacto económico, que revela perdas de bilhões de euros, (na União Europeia, o desperdício alimentar tem um custo de cerca de 143 biliões de euros), desperdiçar alimentos corresponde a grande impacto ambiental. E é nessa ideia que o granel voltou, e para ficar.
Como afirma Joana Botelho Gomes, consumidora entusiasta do granel, “está nas nossas mãos darmos o nosso melhor dentro das nossas possibilidades”, referindo-se à diminuição de ações que tenham impacto no ambiente. E se provem de os consumidores darem estes pequenos passos, o mesmo acontece às grandes indústrias, que começam também a alterar as suas práticas. “As maiores mudanças que tenho visto no comportamento de corporações e empresas de comércio têm, maioritariamente, surgido porque o mercado atual exigiu essas alterações”, aponta a jovem. Contudo, muito pode ser evitado, visto que as grandes superfícies ainda são responsáveis por uma grande parte do desperdício. “Noto que nos grandes espaços, há um desperdício absurdo de materiais. Sacos de plástico, embalagens de esferovite, etc. Muitos materiais que seriam totalmente desnecessários se, se calhar, fizéssemos um consumo mais nacional ou europeu e melhor pensado”, alude Joana.
Numa representação dos 3R’s – reduzir, reciclar, reutilizar -, as compras a granel são, então, uma das formas primordiais e atuais para a diminuição do impacto ambiental agravado pelo uso do plástico, mas esse objetivo só vai ser alcançado se lojas como a Maria Granel fizerem a sua parte, apesar da dificuldade. “É impossível não gerar desperdício, mesmo quando nos intitulamos de zero waste store. O zero é, de facto, uma utopia porque infelizmente, enquanto sociedade de consumo tudo está concebido de uma forma linear”, explica Eunice Maia. No entanto, o foco é sempre gerar o menos desperdício possível e mesmo que exista alguma situação inesperada, como uma praga em algum produto, o mesmo é doado para a alimentação dos animais. Os alimentos, quando não são vendidos na totalidade, são também doados a instituições como a Refood ou às paróquias do bairro. Todavia, o importante para Eunice é que, mesmo havendo perdas, tenta-se sempre “dar um destino que seja o mais ético e circular possível”.
De facto, estabelecido pelas Nações Unidas na Agenda 2030, dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, o ponto 12 refere a necessidade de “reduzir substancialmente a geração de resíduos por meio da prevenção, redução, reciclagem e reutilização”, que confirma que a mudança de hábitos de consumo é, neste momento, necessária e fundamental para a uma melhor imagem ambiental.
Futuro: a granel?
Com o crescimento exponencial do número de lojas a granel, a pergunta se o futuro passa por este tipo de comércio, impõe-se. Na verdade, em grandes superfícies como o Auchan, o granel não é novidade. Desde 2012, a cadeia oferece esta possibilidade aos clientes, através de produtos como frutos secos ou infusões. No entanto, os sacos de plástico ainda são as embalagens presentes no espaço para o transporte, o que condiciona uma das principais vantagens a granel: o impacto positivo no ambiente com a não utilização do plástico. Mas a justificação passa pela segurança alimentar, que influencia a qualidade dos produtos, caso haja contaminações por parte de outras embalagens.
É, igualmente, por essa razão que produtos como o arroz, o azeite, a cevada, o café, os óleos e algumas farinhas não podem ainda ser comercializadas sem ser através do seu embalamento prévio. De facto, por exemplo, em 2018, a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) instaurou 12 processos em vendas de alimentos a granel e apreendeu arroz por “falta de cumprimento dos requisitos sobre acondicionamento, denominação ou rotulagem e ainda das exigências gerais e específicas de higiene e inexistência de processos baseados nos princípios do HACCP (regras de segurança alimentar ou análise de perigos e pontos críticos de controlo)”, como refere o jornal Observador .
Porém, não é do agrado de alguns consumidores o facto destes produtos não poderem ainda ser comercializados através do sistema avulso, apesar da justificação passar pela imposição da segurança alimentar. Foi nesse sentido que foi criada uma petição pública para a permissão da venda de arroz a granel, uma vez que já são muitos os comerciantes e consumidores que garantem que estão todas as regras de higiene e segurança em cima da mesa e que a justificação passa sim, pela desatualização da legislação. É então que surge, para os que vendem e os que compram, a questão levantada pelo programa Biosfera, da RTP, sobre compras a granel: “Um país a duas vozes: por um lado, o Governo quer reduzir os resíduos plásticos e incrementar a reciclagem, por outro, cria leis que impedem a compra de bens alimentares essenciais a granel. O que justifica a incoerência?”. Muitos não sabem ainda a resposta.
Embora existam limitações que condicionam alguns consumidores, tendencialmente, o granel tem ganhado diariamente novos adeptos, com a mensagem da sustentabilidade sempre presente. Nas cidades, por exemplo, Catarina Barreiros, não crê que “exista mais procura do que oferta, ao contrário do que acontece nas zonas interiores onde a procura já começa a ser superior à oferta”. Contudo, a especialista em sustentabilidade explica que a razão passa pela densidade populacional dos locais, “que não compensa nem rentabiliza o negócio às marcas”.
É nesse sentido que se assume como importante a necessidade de grandes superfícies darem, cada vez mais, a liberdade e a flexibilidade aos consumidores que a compra avulso permite, focando-se não só em produtos como frutos secos, apesar de, forma gradual, esta já ser uma prática das superfícies, “com votos de que seja cada vez uma prática mais recorrente”, acrescenta Catarina.
Mais sustentável, mais económico, mais saudável, mais flexível, mais personalizado e com mais ligação (direta ou indiretamente) aos produtores e comerciantes, comprar a granel é, acima de tudo, uma nova forma de vida e de consumo. Para os céticos, a possível justificação passa pela “falta de praticidade, porque vemos as lojas online a vender cada vez mais. Acho que temos de arranjar uma alternativa para que as pessoas não tenham de perder tanto tempo na compra a granel convencional, tornando a compra mais fácil e acessível para todos”, refere Catarina Barreiros.
Agora, até o consumo a granel ser uma prática de regra e não de exceção, o importante, na utopia do desperdício zero em prol da sustentabilidade, que este comércio oferece, é que todas as tentativas de mudança valham a pena. Mesmo as mais demoradas.