André Horta, 26 anos, jogador do Sporting Clube de Braga. Um campeonato, três Taças de Portugal, uma Taça da Liga, uma Supertaça e uma Supporters`Shield. Um jogador que tem tido excelentes épocas não só no campeonato português mas também na Liga Europa.
Costumava jogar futebol em miúdo? Como é que o futebol apareceu na sua vida?
Claro que sim. O futebol apareceu naturalmente através do meu avô e do meu pai, porque sempre foram fanáticos pelo futebol. Quando o meu irmão começou a jogar no clube, lá perto de casa, no Ginásio Clube de Corroios, foi muito fácil acabar por entrar. Era muito chato para os meus pais estar sempre do lado de fora a dizer que também queria jogar, o que acabou por facilitar. Acabei por seguir as pisadas do meu irmão. Ele entrou para o clube com sete ou oito anos e eu ainda tinha apenas seis, ainda não podia jogar. Estava lá nas escolas de animação e acabei por ficar um ano. Depois, fomos os dois para o Benfica continuar a nossa formação. O futebol desde sempre foi desporto da família o que facilitou a introdução do desporto em mim e no meu irmão.
Falando da formação, começou a sua no Benfica e, mais tarde, acabou-a no Vitória Futebol Clube. Como foi a mudança de um clube para o outro?
Saí de um clube com todas as condições a nível de formação para um clube que, na altura, até passava alguns problemas financeiros. As condições da equipa profissional eram razoáveis, eram boas por assim dizer. Em contrapartida, as condições da formação não eram assim tão boas. Fui para lá no ano de júnior, anos importantes para a chegada ao patamar profissional. Nos treinos ainda tínhamos que dividir o campo ou treinar num campo de futebol sete quando jogamos futebol onze. São coisas assim um pouco estranhas para as pessoas hoje em dia, mas a verdade é que isso aconteceu. Felizmente, reagi bem à mudança. Quando me mudei tinha 15 anos, estava perto de fazer 16. Não era nenhuma criança, por isso sabia entender perfeitamente o que se estava a passar. Era tudo uma questão de mentalidade para chegar depois ao patamar que queria e não era essa mudança que ia alterar os meus objetivos.
“Essa mudança acabou por, como se costuma dizer, dar um passo atrás para dar dois à frente”
Acha que esta mudança lhe fez bem?
Sim, essa mudança acabou por, como se costuma dizer, dar um passo atrás para dar dois à frente. Estando no registo de um clube grande muito competitivo em que as oportunidades são mais escassas, porque é um clube que não tem tempo para formar. Não tem tanto tempo para formar porque é um clube que tem obrigatoriamente de ganhar ano após ano e, quando assim é, às vezes pode não dar tanta atenção aos jogadores mais jovens. O Vitória era um clube que tinha que olhar para dentro, para a sua formação, porque depois podia permitir alguns encaixes financeiros que eram precisos. Obviamente, os jogadores jovens nessa situação são muito mais apetecíveis se tiverem qualidade. A verdade é que acabou por correr muito bem. Foi numa idade decisiva para mim que aconteceu essa mudança. Acabou por ser um percurso natural, acabei por fazer duas boas épocas ainda como júnior na formação e, depois, acabei por ascender ao futebol profissional.
Já formado, aconteceu outra grande mudança que foi ir jogar para o Los Angeles FC durante uma época (2018/2019) e conquistou a Supporters` Shield. Foi um marco importante?
Sim, claro que sim. Foi uma mudança muito grande ir viver para outo país, para outra cidade, neste caso no Estado da Califórnia. São três vezes Portugal, são 36 milhões de habitantes. Foi uma mudança muito grande para um país diferente, uma cultura diferente, não só em termos daquilo que são as pessoas, mas uma cultura desportiva muito diferente. A verdade é que a equipa era realmente muito boa. Conseguimos conquistar esse troféu, mas não ganhámos a liga. Claro que foi um aspeto muito importante para mim, porque a verdade é que desde que fui para o Benfica em quase todas as épocas ganhei um troféu. Só na época passada e no ano do Vitória de Setúbal é que acabei por não ganhar nenhum. Claro que foi muito importante ver o meu nome associado também a essa conquista. Profissionalmente, essa mudança não estava a correr como queria e uma das razões de ter ido muito cedo para lá, com 21 anos, foi exatamente para perceber o que poderia acontecer. Tanto pode correr muito bem ou correr menos bem, mas a verdade é que pessoalmente foi uma experiência muito enriquecedora. Mas, caso não corresse tão bem, sabia que tinha a possibilidade de voltar para Portugal e poderia continuar a fazer o meu percurso em Portugal.
Considera que foi umas das épocas mais difíceis da sua carreira em termos de adaptações de clubes e de ligas?
Não achei que fosse difícil a adaptação. Sentia-me bem, mas não estava a ter os minutos que queria. A verdade é que não tendo esses minutos ou não tendo esse acumular de jogos, nem conseguia perceber se estava adaptado ou não. Penso que estava adaptado ao clube, aos meus colegas, à língua, mas a verdade é que não tive o acumular de jogos, jogos consecutivos, para as pessoas poderem perceber se estava adaptado ou não. Mas não guardo mágoa nenhuma. Acho que uma das qualidades que tenho é a grande capacidade de me adaptar a tudo e perceber o que corre bem e o que corre mal. Como já disse, correu menos bem, mas não faço grande drama das coisas. Acho que tudo o que acontece tem uma razão de ser e há uma explicação. Se não correu bem ali foi para voltar e correr bem aqui no Braga onde já ganhei títulos, estou a jogar com o meu irmão e isso, para mim, é o mais importante e ultrapassa tudo.
“Foi muito bom. Sinto que foi para isso que voltei. Para ser melhor jogador”
Entretanto, voltou para o Braga na época 2019/2020 e conquistou a Taça da Liga de Portugal nessa mesma época. Em 2021, conquista a Taça de Portugal. Como foi regressar a Portugal e conquistar estas duas taças importantes?
Foi muito bom. Sinto que foi para isso que voltei. Para ser melhor jogador, para continuar a minha evolução e, se possível, ganhar títulos. Um clube como o Braga é um clube que já consegue lutar por esses mesmos títulos. Poder ajudar no desenvolvimento e crescimento do clube, que cada dia e cada vez mais se aproxima aos ditos “grandes clubes”. Penso que, nas taças, temos toda a legitimidade, estamos nas decisões e isso é muito bom. No fim, pelo menos na minha maneira de ver, o que conta vão ser os troféus e é essa a história que quero guardar para contar aos meus filhos e aos meus netos.
Os troféus, estar nas finais e tentar lutar pela evolução do clube foi importante na renovação até 2027?
Sim, claro que sim. Se não me identificasse com o projeto também não o teria feito. Foi uma decisão muito fácil. O presidente falou comigo e, dois, três dias depois acertámos tudo para renovar. Temos essa facilidade de relação e ele sabe o quanto gosto do clube. Foi um clube que me acolheu quando ainda era muito jovem, fiz uma grande época aqui, depois voltei a sair para o estrangeiro e, quando quis voltar, foi o clube que me voltou a acolher. Neste momento, acho que já faço parte da família. A renovação foi uma prova do meu amor pelo clube e do meu compromisso com o clube.
O Sporting Clube de Braga é um clube presente na Liga Europa. Em que medida é que é importante para um jogador representar um clube português numa competição europeia?
É uma sensação muito boa. Conseguimos medir o nosso nível em relação aos outros campeonatos, às equipas que jogam noutras ligas e que representam também o seu país nas competições europeias. A Liga Europa é uma competição que tem equipas muito fortes. Nota-se cada vez mais dificuldades. Jogar na Liga Europa é muito gratificante. Poder jogar contra esses grandes clubes, contra grandes jogadores para a nossa evolução é muito melhor. É bom ver a maneira como as pessoas nos acarinham por conseguirmos esses feitos. A verdade é que, obviamente, a nossa missão e a nossa obrigação é estarmos bem no campeonato e elevar o clube dentro do País, mas fora parece que tem outra dimensão e sentimos o carinho quando conseguimos elevar o nome do País a um patamar bem alto.
Acha que o apoio dos adeptos do Braga e dos portugueses que apoiam o Braga em competições europeias vos ajuda no vosso percurso?
Sim, claro que sim. Lembro-me quando fomos ao Sheriff, uma viagem muito longa de quatro a cinco horas. Chegámos nesse dia e, no dia a seguir, estavam lá 100, 150 pessoas. Também jogos do campeonato, o Braga está quase num extremo do país e os adeptos têm que se deslocar aos jogos do sul ou do centro. Isso acaba por ser um fator extra de motivação para podermos fazer as coisas bem e para querermos ganhar.
“É uma sensação indescritível poder partilhar tudo com ele”
Sei que é uma pergunta que lhe fazem muito, mas não podia deixar de perguntar. Como é jogar com o seu irmão?
(Risos) Sim, é capaz de ser a pergunta que mais me fazem. Respondo sempre que não consigo bem explicar, não há assim nada que possa dizer. É uma sensação indescritível poder partilhar tudo com ele: a vida no balneário, os jogos, os treinos, partilhar sensações, o que sofre, as coisas que também o fazem mais feliz, poder estar perto dele e poder viver isso com ele. Acho que isso não tem preço e a verdade é que, quando entrámos para esta profissão, obviamente que não era certo que pudéssemos jogar juntos. Era um sonho dos dois… No início da carreira, ele estava em Espanha e eu estava em Lisboa. A verdade é que poder, nestes primeiros anos de carreira, desfrutar de cinco anos ao lado dele é gratificante, é uma sensação indescritível.
E como é que se descreve como jogador?
(Risos) Essa pergunta é complicada. A verdade é que não me fazem muitas vezes essa pergunta e também não gosto muito de a responder. Prefiro que sejam outras pessoas a descreverem-me. É sempre mais fácil quando são os outros a dizer. Sei quais são as minhas qualidades e os meus pontos menos bons. Mas posso dizer que sou um jogador com uma boa qualidade de passe, uma boa qualidade técnica. Tenho que melhorar muito em termos defensivos, em termos de recuperação de bolas, se calhar em termos físicos também, para aguentar uma maior intensidade os 90 minutos, mas acho que que sou um jogador com algumas qualidades. Em termos de personalidade, acho que sou um jogador leal, sou um jogador correto, evito ao máximo as confusões, valorizo muito o fair-play e acho que o futebol sem isso, sem o respeito, acaba por perder o valor.