É um conhecido humorista, animador de rádio e apresentador de programas de entretenimento. Desafiado, Fernando Alvim transpôs os seus programas de rádio para o universo da televisão. A falta de tempo, a inovação áudio e as novas tendências dos media são alguns dos temas presentes nesta conversa.
Um pouco antes da gravação de mais um top semanal da Antena 3, desta vez filmado no Museu da Marioneta, Fernando Alvim chega apressado e bem-disposto na sua mota. Já maquilhado e com o horário preenchido, o entrevistado tira parte do seu tempo para falar um pouco sobre a vida e os projetos. Descontraído, dinâmico e sempre atento ao smartphone, Alvim responde a questões da atualidade sobre os media e desvenda um pouco mais acerca das iniciativas em que está envolvido.
O podcast “Com o Humor Não Se Brinca” está de férias?
Na verdade, acabou. Achámos que já tínhamos cumprido com a missão que nos estava destinada, que era entrevistar a maior parte dos humoristas que existem em Portugal.
Com o avolumar de trabalho que tanto eu como o Nélson tínhamos, no meu caso com mais dois programas de televisão, no caso dele com um livro que está agora a ser editado e em simultâneo com a sua promoção no emprego, decidimos que era melhor acabar com o podcast e foi o que fizemos. O que não quer dizer que não possamos reactivar mais à frente, mas neste momento achamos que não, não faz sentido.
Foto: Gonçalo Castanheiro
Estudaste dois anos Gestão Internacional e Exportação antes de mudares para Engenharia Publicitária, apesar de não teres concluído nenhum dos cursos. Nunca pensaste em voltar à universidade e fazer uma formação relacionada com Comunicação?
Com Comunicação não, mas já pensei em regressar à faculdade e fazer, por exemplo, Psicologia. Era uma coisa que me interessava. Turismo também gostava muito… sou uma pessoa muito sedenta de conhecimento e estou sempre a tentar aprender, portanto, acho que qualquer tipo de curso que fizesse ia sempre ser uma coisa boa. O problema é que, neste momento, não tenho mesmo tempo!
Em toda uma vida ligada à rádio e à televisão, certamente tens aquele convidado que sempre sonhaste entrevistar. Qual foi o convidado a que nunca conseguiste chegar?
Eh pá… acho que todos os convidados que queria, de facto, entrevistar, já entrevistei. Faltam-me alguns, mas não existe aquele convidado mesmo especial. Por vezes, há um convidado que pensas que vai ser incrível e, depois, não é… e o contrário também é verdade. Às vezes, não tens expectativa nenhuma em relação a determinada entrevista ou determinada pessoa e és surpreendido, e aquilo fica um programa incrível.
Acho que essa é uma das características da comunicação: tens de dar o teu melhor sempre, mas o resultado final nem sempre é aquele que ambicionas. É como um jogo de futebol, não é? Acho que a maioria das equipas ou todas as equipas entram em campo para ganhar o jogo, só que, por vezes, o jogo é adverso e podemos empatar ou perder. Na comunicação ou num programa, isso também se pode verificar.
Durante a tua carreira, envolveste-te em vários projectos, alguns um pouco desconhecidos do público em geral. Na saudosa Rádio Energia, ouvi dizer que começaste como repórter de exterior. Como foi essa experiência?
Bom, na verdade, foi até um bocadinho traumatizante. Eu era repórter da Rádio Energia e, basicamente, andava a gravar sons na rua para depois um jornalista fazer as peças. E o que acontecia é que as peças depois iam para o ar e o meu nome nunca era dito. Trabalhava imenso para conseguir o melhor das entrevistas, mas depois de a peça ir para o ar só diziam o nome do jornalista.
Estava no Porto na altura e pensava que os responsáveis de Lisboa estavam deslumbrados com o trabalho que tinha feito. Na verdade, não estavam, porque nem sequer sabiam o que é que tinha feito. Portanto, acabei por não ficar lá. Terminei o estágio, é certo, mas saí sobretudo porque não perceberam que eu estava por trás de muitos dos sons incríveis que nos últimos meses tinham invadido a rádio. Isso foi uma coisa que me ficou entalada para sempre. Conclusão, quando cheguei ao final do estágio dos três meses, decidi sair.
Sentes, então, uma falta de reconhecimento por parte de algumas pessoas?
Não, não sinto! Neste caso, muito em particular, talvez tenha sido o único caso na minha vida em que fiquei com pena, desconfiança sobre aquilo que poderia ter sido o meu percurso naquela estação se soubessem o que é que andava a fazer. Ah! (risos) e fiquei a odiar o jornalista que nunca dizia o meu nome.
Programas antigos, novos desafios
A “Prova Oral” é, neste momento, um dos programas mais antigos a ser transmitido na rádio nacional e desde Fevereiro passou também a formato televisivo, tal como o conhecido top da Antena 3, o “A3.30”. Como é que está a correr o desafio de passar a “Prova Oral” originalmente de rádio para este novo formato televisivo?
Está a correr muito bem. Há pessoas que dizem: “Ah, mas não é a mesma coisa.” Pois é exatamente isso que queria ouvir, porque o formato da “Prova Oral” na rádio é imbatível, é absolutamente imbatível. Na verdade, o que queríamos fazer quando saltámos para a televisão era inspirarmo-nos no nosso programa de rádio, mas não fazermos a mesma coisa.
Qual era o interesse de agora irmos para a televisão fazer exactamente o mesmo que as pessoas ouvem na rádio? Não estou a ver qual é a inovação. Há que ter imagem? Temos de fazer uma coisa diferente e é isso que estamos a fazer, é isso que estamos a conseguir e é isso que já sinto por parte das pessoas que gostam do programa.
Reparei que uma das principais formas de participação dos ouvintes na “Prova Oral” é através do WhatsApp. Recorres também a muitos diretos no Facebook. É importante para ti estar presente nas redes sociais?
As redes sociais são absolutamente indispensáveis nos tempos atuais e ignorá-las seria uma fatalidade e revelaria ingenuidade da nossa parte. O que fazemos é dar-lhes o espaço que merecem durante o programa.
Aliás, de há dois anos a esta parte, a “Prova Oral” é transmitida em direto para o Facebook, Instagram, YouTube. E porquê? Para captarmos público que, de outro modo, nunca nos ligaria. Acho que há hábitos diferentes de gerações diferentes e as gerações atuais já não ouvem rádio como a minha geração ou a dos meus pais, que ouviam rádio mesmo no rádio. Hoje em dia, os miúdos ouvem rádio através da internet. Basicamente, é isso.
Consideras a “Prova Oral” um bom exemplo de serviço público e radiodifusão?
Seria muito pretensioso da minha parte dizer que sim, não é? Claro que vou dizer que sim! Acho que fazemos! Muitas vezes, as pessoas têm a ideia de que o serviço público tem de ser uma coisa muito direitinha e com “caspa”, mas eu não. Serviço público pode ser irreverente, pode arriscar, ser rebelde e é isso que queremos fazer. A nossa forma de pensar e de agir, sermos rebeldes e não sermos direitinhos, não alinhados. E acho que o podemos ser, podemos ser tudo isso e estarmos a fazer serviço público.
Quase em simultâneo, passaste também o top da Antena 3, o “A3.30” também da rádio para a televisão. Como está a ser o feedback do público quanto ao novo formato deste programa?
Está a ser ótimo. Fomos basicamente promovidos, num curto espaço de dois meses, ou seja, começámos a um domingo à tarde e já estamos num sábado à noite. Para quem faz televisão é sempre muito honroso ocupar um período tão nobre da televisão quanto este.
Para além disso, todas as pessoas que veem o top gostam. Temos tido um óptimo feedback, acho que era uma coisa que faltava ao meio musical nacional, um programa que divulgasse o que de melhor se faz na música portuguesa, sobretudo numa fase em que me parece ser a mais prolífera dos últimos anos. Esta é possivelmente a melhor fase de sempre da música portuguesa. Nunca como agora tivemos tantas bandas, tanta qualidade e tantas propostas como temos atualmente.
Barquinhos e termómetro
Desde 2012 que organizas uma Regata de Barquinhos a Remos. Como é que surgiu a ideia de criar esta regata em pleno lago do Campo Grande?
Surgiu por uma brincadeira, porque havia a Volvo Ocean Race e ainda há. Achei que eles deviam ter concorrência, que estavam demasiado isolados e então, por ironia, criei a Regata de Barquinhos a Remos e rapidamente executei.
Em que é que consiste a regata?
Basicamente é como se fosse a corrida mais louca do Mundo, em que as pessoas vão em família ou com amigos para se divertirem. Há barquinhos no lago do Campo Grande e o vencedor ganha uma taça. É tão simples quanto isso, sendo que, há medida que os anos foram avançando, a popularidade da regata aumentou e o grau de exigência também. No ano passado, tivemos lá os Capitão Fausto, que foi o nosso maior investimento até hoje, mas também foi o dia em que mais pessoas ali estiveram, cerca de 3000 pessoas.
Como é sabido, organizas também o Festival Termómetro e este ano vai decorrer a 26ª edição. Qual é o objectivo deste projeto?
Não é a 26ª, é a 25ª. O objectivo deste festival é divulgar e descobrir as novas bandas emergentes. Não temos qualquer outro fim que não esse. Não divulgamos aquilo que as pessoas já conhecem, mas sim aquilo que nunca ouviram. Isso para mim é muito desafiador.
Que nomes destacarias de anteriores vencedores?
A Capicua, o Dj Ride, a Ana Bacalhau, os Silence 4, os Ornatos Violeta, o Noiserv, os You Can’t Win Charlie Brown, os Salto, o Richie Campbell, seguramente também o Mazgani, o B Fachada… Bem, foram muitos os nomes que participaram, que se destacaram ao longo destes 25 anos e, independentemente de terem ganho ou não, o simples facto de saber que estavam ali a iniciar a sua carreira é bastante honroso.
Num mundo onde as revistas em papel tendem a cair em desuso, tu próprio te envolveste nesta área com dois projectos: a “Revista Zero” e a “Revista 365”. Para quando uma revista 100% digital?
Bem, é uma ideia que às vezes tenho. Muitas vezes penso nisso, mas, para já, estou a fazer uma pausa. Também não posso fazer tudo ao mesmo tempo: se queres fazer tudo, acabas por não fazer nada direito. Estive muitos anos com a “Revista 365”, muitos anos mesmo, quase 20 e achei que dei o meu contributo à nova literatura (risos).
Qual o tipo de programa de rádio ou televisão no qual nunca te envolverias?
É muito difícil responder a essa pergunta, mas tendencialmente não me envolveria em nenhum reality show. Não é uma coisa com a qual me identifique e com a qual perca o meu tempo. As pessoas às vezes dizem: “Ah, não gosto.” Mas a verdade é que acabam por ver esses programas e consomem-nos. Não só não gosto desses programas, como não perco um minuto da minha vida a vê-los. Acho que não vou aprender nada com aquilo e, se não vou aprender nada, para que é que estou a ver? Então, não vou dar um minuto sequer para aquilo.
O futuro do áudio
Apresentação video Infinite Dial 2019
SlideShare Infinite Dial 2019
Segundo vários especialistas, nunca se consumiu tanto áudio como hoje. As plataformas de distribuição de música e conteúdos áudio, como o Spotify ou o Pandora, são o futuro do consumo áudio?
Sim. Cada vez mais, a palavra “rádio” poderá começar a não fazer sentido, para dar origem a uma outra palavra que é “áudio”. O que é que tu fazes? Faço áudio. Agora ainda soa de forma estranha, mas é isso que fazemos. Os nossos conteúdos são áudio, é isso que procuramos e, portanto, outras plataformas como o Spotify, onde a “Prova Oral” está, como o YouTube ou como o iTunes são absolutamente essenciais para divulgares o teu produto.
Foi também demonstrado nos estudos que o áudio não é tão viral nas redes sociais como o vídeo, o que leva a que não abranja um número tão elevado de pessoas. A que achas que se deve isto?
Havia uma canção nos anos 80 que dizia “Video Killed The Radio Star”. Na altura, dava a ideia de que a rádio ia desaparecer. A rádio não desapareceu, mas há um domínio absoluto da imagem e a imagem, enquanto mensagem, poderá na grande maioria das vezes ter um impacto superior ao áudio.
Se nos lembrarmos, por exemplo, do massacre do cemitério de Santa Cruz, que despoletou toda uma onda de solidariedade e revolta por parte das pessoas e uma acção política para que se interviesse em Timor-Leste, na altura dominado pela Indonésia. Se fosse o som não sei se aquilo teria acontecido. As imagens, os vídeos, as pessoas viram aquilo e resolveram agir.
Vídeo “The Buggles – Video Killed The Radio Star”
És muitas vezes convidado como Dj para eventos. A música da Pantera Cor-de-Rosa ainda faz parte da tua playlist?
Já não! Mas no início fazia e passava sempre essa música. Porque é que já não faz tanto? O meu público anda ali entre os 18 e os 25 anos e se, na minha geração, quando tinha essa idade, passava a música e era muito conhecida, agora para os miúdos de 18 ou 20 anos a Pantera Cor-de-Rosa não fez parte do mundo deles e, portanto, poderá ser uma música que já não resulta.
Video The Pink Panther Theme Song