Quase dei um salto na cadeira. Estava em casa, naquela actividade hoje imprescindível a quem passa boa parte do seu tempo no estudo crítico dos media – navegar por um conjunto de sites sempre em actualização, ao sabor dos links que os textos sucessivamente consultados nos sugerem.
Quase dei um salto na cadeira. Estava em casa, naquela actividade hoje imprescindível a quem passa boa parte do seu tempo no estudo crítico dos media – navegar por um conjunto de sites sempre em actualização, ao sabor dos links que os textos sucessivamente consultados nos sugerem.
Jill Abramson, antiga directora do New York Times, anunciava que ia lançar um novo projecto jornalístico na área do digital. Acompanha-a, Steven Brill (cuja investigação sobre o sistema nacional de saúde teve tamanho impacto nos EUA que preencheu um número especial da Time, em Fevereiro de 2013).
Eis o resumo da notícia, nos breves caracteres de um tuít:
Jill Abramson on her new digital venture w/ Steve Brill: one perfect big story a month, w/ advances averaging $100,000
Os leads das diferentes peças que consultei relevavam sempre, a par dos nomes dos autores da ideia, os mesmos dois dados noticiosos: a dimensão da peça, que preencherá a totalidade da revista online; e os 100 mil dólares que serão pagos à cabeça ao jornalista.
Mal obtive mais alguns elementos, em rápida consulta noutras fontes, enviei uma breve mensagem a alunos e colegas:
Ainda há ideias de ‘negócio’ no mundo do jornalismo em que as duas primeiras preocupações são a ”estória” e a autoria: http://www.capitalnewyork.com/…/steven-brill-jill-abramson-…
O meu júbilo era tanto maior quanto, semanas antes, assistira a uma provinciana exibição duma espécie de novo-riquismo digital que avassala tantos dos nossos gestores de new media.
Foi numa conferência da ERC sobre as novas fronteiras da Regulação na Era Digital. Embrulhado numa floresta de palavras e expressões em moda na nova economia digital (brands, trends, shifts, internet of things, big data, 3D printing, hardware), um dos intervenientes anunciou um admirável mundo novo que nos espera, num suceder de mais intermediação, mais personalização, mais engagement de audiências e… menos custos editoriais. Tudo imerso numa reformulação da cultura empresarial, transformada agora, de forma obsessiva, em “cultura de métricas”.
A sustentabilidade do projecto (que além dos 100 mil dólares, prevê pagamentos extra caso as subscrições aumentem) levantou muitas dúvidas. Percebi mais tarde que, apesar de disporem de capitais próprios que lhes permitem apontar o arranque para Abril próximo, Abramson e Brill procuram ainda investidores que lhe garantam sustentabilidade. Eu próprio, aliás, não tardei a alertar os destinatários da mensagem anterior para um balanço recente do chamado jornalismo longform em que a ideia se inscreve – http://www.cjr.org/behind_the_news/longform_overload.php
Estas cautelas perante os anunciados escolhos só reforçam em mim a admiração pela aposta dos dois eminentes jornalistas. Aposta na centralidade da mensagem e na qualidade e credibilidade que lhe confere quem a produz, como condições sine qua non para a reconquista da confiança dos cidadãos.
Adelino Gomes *
PS: Escrevo este texto nos 29 anos da UAL. Penso que, neste dia, os melhores “parabéns” que se podem dirigir à instituição, e em particular ao seu departamento de Ciências da Comunicação (onde regresso, 12 anos depois), são os de que, como da Boavista, de Santa Marta continuem a sair alunos-cidadãos cujo perfil técnico-profissional lhes permitam ocupar lugares de relevo na sociedade.
* Adelino Gomes é Doutor em Sociologia, Jornalista e Professor na Universidade Autónoma de Lisboa