Advogado, conselheiro de Estado e ex-presidente do PSD, Luís Marques Mendes lança um olhar preocupado sobre a falta de competência dos políticos. Aos 64 anos, é líder de audiências no comentário político: “saí da política, mas a política não saiu de mim”.
Enquanto comentador, olha de forma atenta e crítica para os assuntos que marcam a semana. Sente que os seus comentários influenciam a opinião do público?
Modestamente, admito que sim. Se influenciam mais ou menos, não sei! O meu objetivo é sobretudo informar, esclarecer, ajudar as pessoas a formarem a sua opinião. Espero que a influência que possa, eventualmente, ter seja positiva e construtiva.
Considera que os portugueses têm uma opinião pública informada?
Claro que têm. De modo geral, dão mais atenção às questões internas e menos às questões externas. Se forem temas menos apaixonantes, ainda que sejam importantes em termos internacionais, ficam um bocadinho pela rama. Mas há temas internacionais que suscitam um grande interesse, como é o caso da guerra [na Ucrânia].
“Exigência é uma palavra-chave”
Independentemente da natureza do meio de comunicação, a formação da opinião pública é um serviço público?
É uma matéria de inegável interesse público: informar as pessoas, esclarecê-las, contribuir para a formação de uma opinião que seja crítica e fundamentada. Exigência é uma palavra-chave. Para termos uma opinião pública exigente, as pessoas têm de estar bem informadas. E alguém tem de ajudar a cultivar este espírito de interesse público.
Optou por um estilo assertivo de comunicação para se aproximar dos portugueses?
Tenho um estilo de comentário relativamente assertivo, não para agradar ou para desagradar, mas porque uma pessoa deve ser igual a si própria. Atuo dessa maneira porque é a minha maneira de ser. Não se pode dizer que estou ali a fazer uma representação, não, eu sou assim. Quem me está a ouvir pode até ter uma posição oposta, mas quando o comentador tem uma opinião sobre o assunto, ajuda o espectador a pensar. Só não sei se isso gera mais ou menos empatia.
“Estou mais sujeito à fiscalização e ao escrutínio”
É possível separar o trabalho de fazedor de opinião da militância partidária que já praticou?
Claro que é! Pratiquei e pratico! Nunca escondo a verdade. Tento fazer comentários com o máximo possível de independência, pois independência total ninguém tem. Antes, as pessoas ficavam um pouco surpreendidas por várias críticas que fazia ao meu próprio partido. Fazia e faço. Mas ser comentador é isso mesmo. As pessoas que me estão a ver e ouvir sabem que sou do Partido Social Democrata e, à partida, já há “preconceito”. Estou mais sujeito à fiscalização e ao escrutínio.
No seu livro O Estado em que Estamos, publicado em 2011, refere que Portugal se encontrava num pântano político, social e financeiro. Essas crises são cíclicas?
Infelizmente são, à escala global. São é de uma natureza completamente diferente. 2011 foi um ano de tempestade perfeita. Aconteceu em Portugal uma crise financeira, económica, social e política. Só não tivemos uma pandemia. As crises não têm um timing predefinido. O mais preocupante é se, periodicamente, estivermos na iminência da bancarrota, pois isto significa que não nos sabemos governar! E Portugal já esteve três vezes na bancarrota pelo que, nesta matéria, somos uns levianos. Quem não aprende com o passado, não tem perdão possível. Há crises que podemos evitar e que devemos evitar? Com certeza.
“Há deputados na Assembleia da República, da direita à esquerda, que nunca lá deviam ter posto os pés”
Como olha para o Parlamento hoje?
Com dois sentimentos: saudade e preocupação. Saudade porque gostei de ser líder parlamentar e deputado. Gosto da parte do combate político, de debater ideias. Não é saudade de exercer. Preocupação porque, de eleição para eleição, baixa a qualidade [dos políticos], da direita à esquerda. Acontece em todos os partidos sem exceção. Isto é confrangedor e muito preocupante. Há deputados na Assembleia da República, da direita à esquerda, que nunca lá deviam ter posto os pés, não têm qualidade para isso. Não sendo pessoas de grande qualidade, não têm intervenções de qualidade e não ajudam a fazer leis com muita mestria. Isto é muito mau. Andamos em contraciclo. A sociedade está a melhorar, os políticos estão a piorar.
O desinteresse pela política é reflexo dessa falta de qualidade?
Também, mas não só. Há algum afastamento em relação à vida política por diferentes razões. Porque se considera que os políticos têm pouco mérito, pouca competência, pouca qualidade. Existe a sensação de que na política se promete uma coisa e se faz o seu contrário.
A ascensão de alguns partidos políticos surge do voto de protesto?
Sim. O que foi o voto no Chega nas eleições legislativas? As pessoas protestam por considerarem que algumas coisas não estão bem, que a corrupção tem aumentado, por exemplo. Há sempre votos e partidos de protesto. O importante é que o voto não seja apenas de protesto pelo protesto, mas a via para encontrar soluções para os problemas que justificam o protesto.
Desempenhou vários cargos políticos e foi presidente do PSD entre 2005 e 2007. Saiu da política sem a política ter saído de si?
Essa expressão é feliz [Risos]! Saí da vida política porque nunca mais tive cargos, nem está nos meus propósitos atuais ter. Mas a política, de facto, não saiu de mim, porque gosto da política. Gosto do comentário político, que faço de forma desinteressada. Tem toda a razão. Saí da política, mas a política não saiu de mim!