Joana Cruz é das vozes mais conhecidas da rádio portuguesa. Licenciou-se na Universidade Católica de Lisboa, em Comunicação Social. A rádio foi amor à primeira vista. Otimista, positiva e divertida são palavras que definem a radialista.
Quando tinha 12 anos, fez voluntariado num lar em Campo de Ourique e aí já evidenciava os seus dotes comunicativos. Tem memórias nostálgicas dessa época?
Tenho, porque eram tempos em que tínhamos férias para dar e vender. Nas férias, acabava por não ter contacto com os meus colegas. Não era como atualmente, em que há telemóveis e redes sociais. Por isso, brincava com a minha irmã mais velha e dividíamos o nosso tempo entre ir para a colónia de férias, estar de férias com a avó e depois, nesse ano, a experiência no lar de terceira idade. Era um tempo para a pessoa fazer muito pouco: brincar, praia, campo e sem contas para pagar [risos] e isso dá muita saudade.
Foi aí que percebeu que a comunicação era a sua zona de conforto?
Acho que acabou por ser. Não sei dizer o momento exato em que percebi que podia ser um caminho na minha vida, mas no seio familiar sempre fui a mais “palhacinha” e a mais bem-disposta.
“Poderia ter sido um caminho, mas como não era de coração não tinha de ser”
Na altura em que foi admitida na Universidade Católica de Lisboa, entrou também para o Conservatório, mas acabou por desistir dessa ideia e dedicou-se apenas à Comunicação Social. O teatro e a interpretação ainda fazem parte dos seus planos?
À partida, não. O Conservatório era uma terceira opção à universidade e seria sempre a última, porque é uma profissão para a qual se vai com muita paixão, mas a saber que pode ser complicada e instável. Não é uma “areia” que tenha ficado no meu currículo e que queira ir lá varrer. Poderia ter sido um caminho, mas como não era de coração não tinha de ser.
Dentro da sua escolha, a Comunicação Social, qual foi o foco principal?
Sempre soube que gostava muito de rádio e televisão. Imprensa escrita não era o meio que mais me puxava. Quando passo para o 3º ano da universidade, concorro a um anúncio de jornal que falava num casting para uma rádio e é aí que começo a trabalhar no meio, na Mega FM, em 1998, atualmente conhecida como Mega Hits. Desde cedo, defini um caminho.
Como é que se sentiu a entrar em estúdio pela primeira vez?
Não me lembro muito bem. Mas lembro-me obviamente do dia em que a Mega abriu, 7 de setembro de 1998. Estávamos todos juntos à meia-noite, no início da emissão, num grupo muito empenhado e focado naquilo que ia fazer.
“São formas de comunicar diferentes, mas gosto muito de experimentar as duas e de as conciliar porque, ao serem diferentes, são desafiantes”
A televisão foi outra das experiências que abraçou. O que muda radicalmente de um meio para o outro?
Temos a questão da imagem que, atualmente, a rádio absorveu com as redes sociais, mas esta acaba por ser um complemento ou um substituto da palavra. São formas de comunicar diferentes, mas gosto muito de experimentar as duas e de as conciliar, porque, ao serem diferentes, são desafiantes. Na rádio, temos de criar imagens que as pessoas não estão a ver, tocar em pontos da imaginação do ouvinte para ele se transportar para o cenário que estamos a criar. Na televisão, isso acaba por ser mais fácil.
Pensemos então nas mudanças e nas evoluções com a tecnologia, no que ao público, a formatos ou a modelos de negócio diz respeito. O digital trouxe uma mudança inevitável aos media?
Trouxe, com certeza que sim. Antigamente, a comunicação era muito mais lenta, mais longínqua das pessoas, e o digital acabou por aproximá-las. A rádio capitalizou com a questão da imagem, por exemplo. Não tens de estar a ouvir rádio para saberes que a RFM está a fazer um conteúdo, ou seja, estás no sofá a ver televisão, mas tens o telemóvel na mão, entras no Instagram e aparece um conteúdo da RFM, a rádio que não estás a ouvir, mas com a qual estás a contactar.
É mudar ou morrer?
É evoluir com o digital, acompanhar as trends, as tendências.
A era digital ofereceu-nos uma nova companhia: os podcasts. Como é que surgiu o ADN de Leão na sua vida?
Foi um convite do Sporting com a ideia de serem diferentes e inserirem uma mulher num mundo que, à partida, é de homens. Fiz um mês de trabalho com eles, gravávamos duas entrevistas por semana. Essa nossa ligação foi interrompida por algo menos bom, mas o projeto está muito bem entregue ao Geirinhas.
Qual foi o membro do Sporting que mais gostou de entrevistar?
O Coates… e o Travante Williams.
“Vou tentar que seja uma nuvem passageira para que os momentos com a doença sejam mais fáceis”
Durante o período mais difícil da sua vida, sente que a sua maneira de ser a ajudou?
Ajudou-me muito. O meu pensamento sempre foi “vamos fazer, se é para ser, é para ser” e isso acabou por fazer a diferença. Nestes casos, temos sempre dois caminhos: ou vamos para cima ou vamos para baixo. Pensei: “se isto já é um bocadinho para a nuvem escura, porque é que vou carregar isto com mais chuva e trovoada? Vou tentar que seja uma nuvem passageira para que os momentos com a doença sejam mais fáceis”.
Ver o copo meio cheio nestas situações é algo fundamental ou foi interpretada como uma positiva tóxica?
Fala-se hoje da positividade tóxica porque não temos de estar sempre bem. Existem momentos mais complicados e temos de os abraçar. Sou aquela pessoa que abraça um bocadinho e depois está bom, já brinquei e volto a arrumar. Fui partilhando sempre a minha situação e é inspirador perceber que posso estar a fazer a diferença na vida de alguém. Sinto que, nesta situação, o otimismo é a base. São 50% dos médicos e os outros 50% só dependem de nós.
Os papéis que escrevia para si mesma pela casa estão, de alguma forma, relacionados com o “bichinho da comunicação”?
Sim, comunicação de mim para mim. O tempo de doença acaba por ser muito solitário e foi uma forma que encontrei de comunicar comigo de uma forma menos introspetiva porque estava escrito, era físico.
Os colegas aqui da RFM, o Daniel e o Rodrigo, foram pessoas cruciais neste momento?
Sim e em vários aspetos. Estava descansada porque sabia que o programa que fazíamos, o Wi-Fi, estava bem entregue. Depois, falávamos todos os dias para saber do programa e eles para saberem como estava. O Daniel ainda fazia de pombo correio com as minhas encomendas. Foram e continuam a ser pessoas muito importantes, somos uma Santíssima Trindade.
“O objetivo é sempre transmitir todos os valores bons que existam no dicionário”
Quais considera serem os valores mais importantes nesta profissão?
Lá para fora são os valores de toda e da maior humanidade. Cá dentro são desafios constantes, porque existem problemas. Nem sempre estamos no mesmo patamar e não concordamos com tudo. O objetivo é sempre transmitir todos os valores bons que existam no dicionário.
É fácil gerir os comentários negativos?
Sim, nós temos duas soluções para os comentários mais negativos: ou explicamos à pessoa o que se passou ou mandamos-lhe um coração. Às vezes, só precisa de um coração e de um abraço [risos], no fundo só precisa de carinho.
Sente que as pessoas criticam o vosso trabalho só para vos deixar mal ou, na maioria dos casos, são críticas construtivas?
Habitualmente, são construtivas. Felizmente, recebemos mais amor do que hate.
Qual era o conselho que dava a um futuro profissional desta área?
Ler muito, viajar, estar com os amigos, conhecer a área onde potencialmente gostaria de trabalhar, estar sempre o mais atualizado possível e ir atrás daquilo que realmente quer. Às vezes, é estar no sítio certo à hora certa.
Para finalizar, como é que se autocaracteriza?
Absolutamente espetacular, muito otimista, a pessoa do copo meio cheio. Gosto de me divertir, de viajar, ser preguiçosa sempre que posso e numa cor sou um amarelo quentinho. Otimista é uma palavra que pode resumir muita coisa.