Há mais de 400 mil atletas federados em Portugal, mas nem metade são do sexo feminino. Apesar do desporto não ter género, continua a ser estranho que existam mulheres que gostem e ousem opinar sobre o tema.
Afinal, como é ser mulher e querer vingar num mundo de homens? A discriminação e a falta de apoio são alguns dos problemas identificados, no entanto, no último ano, foi notório o crescimento percentual de atletas femininas. Este ‘atrevimento’ é, atualmente, um dos focos da comunicação social desportiva, onde muitas jovens tentam entrar com o objetivo de falar sobre aquilo que gostam. Sem tabus.
Têm surgido movimentos inovadores com um único objetivo: elevar o desporto feminino. A plataforma WUP Sports é um exemplo disso. Todos os dias, luta pela promoção de várias atletas.
Quando elas querem jogar
Bárbara Coelho, de 18 anos, “quase 19!”, é o número 24 da equipa feminina do CF Os Belenenses, onde é titular indiscutível no seu lugar de defesa central. Feliz, afirma que aquilo que a faz praticar este desporto de homens é a paixão que sente pela modalidade.
“Se tivesse tido outro tipo de acompanhamento, talvez hoje estivesse num clube com maior visibilidade e fosse uma jogadora muito mais evoluída”, salienta Bárbara, depois de considerar que o apoio e as horas dispensadas aos homens são muito superiores àquelas a que ela está habituada e que, por ser mulher, saiu prejudicada no mundo do futebol.
Mas o futebol é só para homens? “Eles são, por norma, mais rápidos, têm mais técnica e também têm um maior incentivo. Mas existe muito talento e muita qualidade no futebol feminino”, esclarece a central, defendendo o seu género. A discrepância entre ajudas é o eixo da questão para as atletas que, em muitos casos, se sentem injustiçadas e não percebem porque não têm o destaque que merecem. “As atletas femininas pouco podem fazer, resta-lhes lutar e dignificar o desporto que praticam”, afirma de forma mais realista do que idealista.
Não apenas no futebol mas no desporto em geral, a atenção dada às atletas femininas é muito reduzida o que, por vezes, atrasa a evolução das próprias modalidades, algo que as atletas desejam ver revisto e contrabalançado com o deporto masculino.
As duas palavras fundamentais, ainda que seja imperativo que no futuro deixem de o ser, são preconceito e discriminação. “Existem sempre pessoas que discriminam e rejeitam aquilo não vai de acordo com os seus pensamentos”, recorda Bárbara, referindo-se ao preconceito a que é exposta enquanto jogadora de futebol.
No entanto, acredita que “atualmente já há um grande número de pessoas que apoiam e não fazem essa discriminação, o que está a ajudar no desenvolvimento da modalidade” que, convenhamos, é aquilo que o desporto ambiciona.
Quando elas querem opinar
Patrícia Martins, estudante de 21 anos, sonha um dia poder ser uma das vozes mais ouvidas do jornalismo desportivo e, em particular, no comentário, na opinião. No entanto, debate-se com o problema da discriminação que afirma ainda existir nos dias de hoje.
“Uma mulher que trabalhe no meio desportivo, ou que o queira, é, muitas vezes, olhada de lado”, assume, depois de já o ter sentido na própria pele. “Como muitas raparigas, já ouvi as célebres frases «nem sabes o que é um fora-de-jogo!» ou «volta para a cozinha»”, conta com algum pesar. O que para muitos homens não passa de uma picardia, para muitas mulheres é uma ofensa real que não passa apenas de mais uma manifestação de puro preconceito.
“Sou mulher e gosto de desporto. Não posso? Bem, acho que muitos querem que eu diga que não, mas não é isso que me faz deixar de ser apaixonada por algo que move todo o mundo”, afirma a jovem amante de desporto, contrariando a ideia de que tal se trata de um território de homens. Defende que “não existe género no desporto” e, como tal, “todos temos a liberdade de o amar, de o ver e de o comentar”.
“Vivemos num país livre onde temos direito às nossas escolhas e as mulheres têm o direito de gostar ou de praticar desporto”, sublinha Patrícia, com a total confiança de que um direito como este não deve, nem pode, condicionar as decisões de muitas mulheres quanto ao desporto, quer na altura de opinar, quer na altura de o praticar.
Foi o pai de Patrícia que fez com que se apaixonasse pelo desporto no geral e, consequentemente, pelo futebol em particular. “Desde pequena que o meu pai me incentivou a praticar desporto, mas prefiro falar a praticar. Não vejo mal nenhum nisso e ele também não”, conta. No seu caso, e em muitos outros, é o próprio pai quem leva a sua filha para este meio, mas será que conta com o que pode acontecer? Claro que não. Se soubesse que a sua filha seria exposta a tamanho preconceito, talvez tivesse feito diferente. Muito provavelmente, nem pensa nisso, por defender que a igualdade se estende também ao desporto. “Muitas vezes já é o meu pai que fica ofendido com coisas que me dizem, imaginem se fosse com ele!”, remata Patrícia, com um sorriso.
Quando elas querem partilhar
Andreia Ricardo, diretora e publisher na plataforma WUP Sports, apresenta um olhar visionário face à instauração do poder feminino no desporto. “Nós pensamos que o desporto feminino e a WUP Sports podem crescer juntos”, clarifica, de forma decidida.
“Queremos que as atletas tenham o destaque que merecem” e é isso que se pode encontrar no site que avança as notícias mais recentes das atletas femininas portuguesas. Para além disso, existe a necessidade “de dar voz às mulheres desportistas”, recorrendo a vídeos que realizam com atletas, onde estas ganham expressão e têm a possibilidade de mostrar um pouco de si próprias e do desporto que praticam.
“Há claramente um longo caminho a percorrer!”, esclarece Andreia quanto à questão da discriminação. O preconceito existe e não pode ser ignorado, uma vez que influencia bastante financeiramente. Os patrocinadores que podem participar na vida ativa do desporto feminino preferem, na maior parte das vezes, optar pelo desporto masculino, o que faz com que “a maioria das atletas sejam amadoras e não se consigam dedicar a 100% ao desporto”.
O tempo passa, mas a necessidade de se mostrar que nem todos os desportos são para mulheres permanece. “Começa logo na infância com a distinção de «brincadeiras de menina» e «brincadeiras de menino»”, esclarece a WUP, defendendo que este se trata de um ‘pecado’ que estereotipa o pensamento da sociedade. “Não existe nenhuma razão para a mulher não praticar o desporto que gosta, seja ele qual for”, afirma-se na plataforma, enquanto apresenta alguns exemplos de atletas portuguesas que, nos dias de hoje, vingam em desportos ditos “de homem”, como Telma Monteiro, no judo, e Elisabete Jacinto, no automobilismo.
“É importante realçar a força de vontade das mulheres. Para serem atletas, têm de ultrapassar várias e difíceis barreiras ao longo da sua carreira. No entanto, mostram uma garra inabalável e lutam pelo seu desporto, muitas vezes única e simplesmente por amor à camisola”, diz Andreia que, desta forma, nos remete ao essencial: por maiores que sejam os preconceitos e as dificuldades adjacentes, ser mulher é sinónimo de caráter lutador, sem tabus.