Conceição Monteiro desempenhou um papel estruturante para a implementação da social-democracia em Portugal. Conviveu de perto com inúmeras personalidades que marcaram o seu tempo e esteve presente em momentos determinantes da contemporaneidade portuguesa. Com a humildade e a riqueza humana que todos lhe reconhecem, conquistou o respeito e a admiração de diferentes gerações, muito para além do mundo da política. Aos 84 anos, a mulher que acompanhou a construção do Portugal moderno recorda a vida e obra do icónico político português Francisco Sá Carneiro e leva-nos a uma viagem no tempo, à descoberta de uma jornada de 40 anos de serviço ao país.
No mês em que se assinala os 38 anos da morte de Sá Carneiro, a 4 de dezembro, a confidente do antigo primeiro-ministro revela as memórias de um tempo e de uma política que já não existem. Em entrevista, Conceição Monteiro desvenda o homem que está por de trás do líder de uma forma tão intimista e sentida que nos transporta para os conturbados anos 1970 em Portugal.
Quais as razões que a levaram a integrar a fundação do PPD?
Alguns anos antes do 25 de Abril, houve um grupo de jovens deputados que se candidatou à Assembleia Nacional de então, com a ideia de alterar o interior do regime. Esse grupo ficou conhecido como a “ala liberal”. Foram muito contestados e tiveram uma guerra terrível com os situacionistas da altura. Entre os membros do grupo, estava Francisco Sá Carneiro. Eu já seguia a carreira deles, de José Pedro Pinto de Leite, Magalhães Mota, Francisco Balsemão, Mota Amaral, entre outros, e já me interessava pela sua atuação na Assembleia Nacional.
Aconteceu o 25 de Abril e, no dia 27, Francisco Sá Carneiro deu uma entrevista à RTP, onde visou o que queria para o país. E eu, já com 40 anos, ao ouvi-lo pensei: “O que este homem quer para o país é exatamente o que eu quero para o meu país.” Como sou prima direita de Francisco Balsemão, escrevi-lhe uma carta a dizer-lhe que, se Francisco Sá Carneiro fundasse um partido, gostaria imenso de trabalhar como voluntária, para os ajudar no que precisassem. Dias mais tarde, foi-me entregue o recado para estar por volta das quatro horas da tarde, nas instalações do partido, no Rato, em Lisboa, num ginásio da antiga Legião Portuguesa. Como aquilo era da legião, os nossos “bravos revolucionários vermelhos” tinham vandalizado as instalações por completo, ficou tudo destruído. Foi então que fui a casa buscar baldes, esfregonas, panos e a minha primeira atividade foi fazer uma grande limpeza às instalações do Rato.
Não tinha quaisquer habilitações académicas, além do chamado “Curso Geral dos Liceus”, mas falava muito bem francês e inglês. Nessa altura (depois da revolução), Lisboa encheu-se de correspondentes estrangeiros, que nunca cá tinham vindo; não falavam português e alguns deles nem sabiam que Portugal existia, para fazer a cobertura dos acontecimentos. E a minha função no partido foi, essencialmente, receber os correspondentes estrangeiros. Comecei a ir para o Rato todos os dias de manhã e ficava lá à tarde e à noite – não havia horários e fazíamos muitas diretas. E assim comecei. Só conheci o Dr. Francisco Sá Carneiro mais tarde, pois era membro do governo do Palma Carlos e não tinha disponibilidade para ir ao partido.
Em julho, dá-se a queda do governo de Palma Carlos e é quando Francisco Sá Carneiro decide dedicar-se a 100% ao PPD. Um dia, estava a tratar das inscrições de militantes do partido e fui convidada por ele para ser sua secretária. Apesar das dificuldades, correu tudo bem e, ao fim de três meses, o partido estava implantado em todo o Portugal, incluindo Açores, Madeira e no seio dos emigrantes. Já tínhamos um apoio fantástico. Em outubro, organizámos o primeiro congresso e, em novembro, já o programa estava impresso. Foi uma implantação rapidíssima e, nas eleições de abril de 1975, com menos de um ano de existência, tivemos 20 e tal por cento, uma votação muito boa.
Durante o período que sucedeu à formação do partido, quais as principais necessidades do país?
Eram totais. Na educação, a quantidade de analfabetismo era absolutamente doente e também ao nível das liberdades individuais, que sempre foram uma grande luta do Francisco Sá Carneiro. As liberdades individuais, civis, sociais e a necessidade de cada pessoa, individualmente, ser o centro de todo trabalho e empenho. Era isto que eu adorava nele.
O país era extraordinariamente pobre. Havia uma pobreza encapotada, mas muito grande. A educação era também um enorme problema. O Dr. Sá Carneiro tinha a ideia de que a educação era indispensável para a formação de cada pessoa, para ser verdadeiramente livre.
Lembro-me quando fomos a Mirandela e contactámos com aldeias e populações de uma pobreza indiscritível. No caminho de regresso, vínhamos a discutir o que cada um faria para melhorar as condições de vida daquela população. Cada um expôs a sua ideia e quando a Snu perguntou ao Francisco o que faria se pudesse fazer alguma coisa pela população local, ele respondeu: “Punha esta gente toda a ler e a escrever, porque se soubessem ler e escrever sabiam muito bem tratar das próprias vidas.” Ele achava a educação fundamental. Uma pessoa não é completa se não puder fazer as suas escolhas com conhecimento. Era esta sua maneira de pensar que me fascinava e que contribuía para que eu estivesse disponível 24 horas por dia para pôr este projeto em marcha. Era um sonho. Todas as semanas pensávamos em como contribuir para a melhoria do nosso país. Tínhamos um orgulho e um amor pelo país, mas, sobretudo, por cada um de nós, isso era indispensável.
O partido soube atenuar as necessidades do País?
Sim, embora só tenhamos chegado ao governo em 1980, o que foi uma pena. Considero que o maior erro do general Eanes foi, no estado em que o país estava, ter dado posse ao governo minoritário do Dr. Mário Soares. Foi um erro terrível, pois precisava da força toda na assembleia para implementar certas medidas que só passariam se tivesse um governo de coligação. Nessa altura, o PCP era fortíssimo, tomou câmaras e câmaras e tentava sempre destabilizar. O governo caiu. Era impossível aguentar-se com a fúria que se instalara nas ruas. Ainda bem que, na altura, ainda tinha pernas para correr, para fugir dos “comunas” que queriam dar cabo de nós. Muita pancada apanharam os nossos militantes, muitos carros destruídos, tanta coisa que se passou. Mas apesar de tudo, o Francisco nunca foi contra uma coisa só porque vinha da oposição. Ele dizia: “Se for para bem de Portugal e dos portugueses, com certeza que votamos a favor.” Relativamente ao setor público e privado, mesmo a Reforma Agrária, que não era o que se desejava, mas que se conseguiu no tempo do Dr. António Barreto, nós viabilizávamos. Quando era bom ou não era muito mau, votávamos a favor, se não, abstínhamo-nos. Como tínhamos um grande grupo parlamentar, a nossa abstenção já dava para o partido socialista passar as leis.
Julgo que foi uma contribuição muito válida. Uma forma de fazer oposição muito boa, que hoje não existe. Lembro-me das intervenções do Francisco na assembleia, onde até a oposição se distraía e “faziam que sim com a cabeça”. Tinham uma admiração por ele.
Tivemos um papel muito importante até que chegámos ao poder em janeiro de 1980. Foi muito pouco tempo. Tínhamos tantos projetos. Tão bons. E a aliança democrática aumentou a popularidade em relação a 1979, o que revela que as pessoas estavam a gostar do governo.
Quais os valores que sustentam a formação do partido?
Era um partido verdadeiramente interessado no bem-estar de cada português. E esse bem-estar, dado o estado em que o país se encontrava na altura, passava obrigatoriamente pelas liberdades individuais, sem dúvida nenhuma. O Francisco sempre se opôs frontalmente aos comunistas, não por não gostar deles, mas porque achava que eles não davam liberdade. Nós até dizíamos: “Com os comunistas, o voto é já com o papelinho dobrado.”
O personalismo era muito, muito vincado e esse bem-estar era a conjugação do físico com as liberdades intelectuais. Era tão importante ser livre para escolher a sua profissão, viver onde lhe apetecer ou viajar para o estrangeiro, como era importante a pessoa poder viver livremente e ter uma vida normal, sem medo de espiões, polícias secretas…Para nós, as liberdades eram fundamentais.
Em 1980, não foi possível fazer um décimo do que pretendíamos. Se tivéssemos tido uma legislatura de quatro anos, com tempo e uma maioria, de certeza que Portugal teria dado um salto espetacular naqueles quatro anos, mais infelizmente “cortaram-nos a cabeça”, uns meses depois. Educação e liberdade em todos os sentidos. Eram estas as principais batalhas do Francisco.
Como vê o atual desinteresse de uma grande parte da população portuguesa, sobretudo, os jovens, pela política e pelas questões políticas?
Com muita, muita tristeza. Porque infelizmente, de há uns anos para cá, os políticos não têm estado a altura das necessidades dos portugueses. Não têm dado as respostas corretas nem têm o comportamento correto para que os portugueses os admirem. Era um orgulho tão grande ser político ou deputado e hoje é quase uma vergonha. Houve tantos, tantos casos, onde realmente quem foi ministro foi para se servir a si próprio, quando ministro significa servidor. Ministrar é trabalhar em prol de alguém. E isto foi invertido nos últimos anos. Não há este amor que as pessoas tinham à política para servir. Muita gente ambiciona ser deputado e ser do governo para se servir. E a juventude não gosta deste tipo de exemplos e despreza.
Na minha geração, toda a gente participava em comícios, conferências ou debates. Toda a gente era ativa na política. E todos nós somos atores políticos, porque o nosso voto é que elege os políticos. Temos que estar esclarecidos para escolhermos as pessoas que gostaríamos que governassem. Hoje em dia, não conhecem os deputados, não sabem quem são nem o que fazem. Houve também alguns jovens que se serviram da política para subir. Não está certo. A noção de serviço está muito afastada da política de hoje em dia.
Legado político
Ficou conhecida por ser a “confidente de Sá Carneiro”. Como recorda o fundador do PPD?
Era um homem muito íntegro. Preocupava-se muito com os outros. Tinha sólidas raízes cristãs, o que, no meu ponto de vista, o ajudaram muito a lidar com a pessoa humana. Como política, quando exerci os meus cargos, nunca fui capaz de “arrumar” o meu cristianismo numa gaveta, pois é parte integrante de mim. Era um homem para quem a verdade estava acima de tudo. Nada de desvios nem caminhos menos bonitos. Trabalhar com ele era um prazer. Era um homem diferente. As pessoas gostavam muito dele.
Acompanhei-o por todo o país e, mesmo lá fora, em Inglaterra, os emigrantes deliravam, gostavam imenso dele. Quando foi primeiro-ministro, disse uma frase que nunca irei esquecer: “Não quero, nem admito, que alguém nos venha bater à porta e não seja atendido. Arranjem uma escala entre os assessores – na altura eramos 12 e hoje são mais de 60 – e sempre que alguém vier, mandem subir.” Recebemos toda a gente, todo o tipo de pessoas que vinham ao nosso encontro.
Que papel poderia desempenhar Francisco Sá Carneiro no Portugal de hoje?
Se Francisco Sá Carneiro fosse vivo teria hoje 84 anos. Não quer dizer que uma pessoa não possa ser muito útil. Estou convencida que ele, passado um tempo de primeiro-ministro, teria sido candidato à Presidência da República. Era uma coisa que ele gostaria, embora dissesse, nas nossas conversas particulares, que gostava de ser embaixador de Portugal no Japão. Ele teria tido sempre participação na política, era um “bichinho dentro dele”, tanto assim que, quando em janeiro de 1978 saiu do partido, no dia 1 de julho já estava de volta.
O país soube interiorizar o legado de Francisco Sá Carneiro?
Acho que o país soube interiorizar melhor do que o próprio partido. A verdade é que ainda hoje as pessoas me perguntam: “A senhora não era a secretária do Dr. Sá Carneiro? Que saudades que eu tenho!”. Se são mais novos dizem-me: “A minha mãe tem uma fotografia dele na sala. Os meus pais choraram muito naquela noite.” As pessoas interiorizaram.
No partido, falar de Sá Carneiro é muito popular e fica bonito, mas fazer o que ele fazia, já não são capazes. Claro que mesmo no partido há gente para quem o Francisco ainda é aquela “luz ao fundo do túnel”, ainda se guiam pelo que ele dizia, mas sinto que o país interiorizou mais o sonho dele para Portugal do que o meu partido. E é com muita mágoa que digo isto. Foram anos maravilhosos, de grande sofrimento. Passámos muito para chegar onde chegámos e estão a desperdiçar os trunfos maravilhosos que o partido tinha.
Foram anos de experiências e partilhas. Que memória guarda com maior emoção?
Costumo dizer que no dia 4 de dezembro, o país perdeu o primeiro-ministro e eu perdi o primeiro-ministro, o meu líder e, acima de tudo, perdi o meu maior amigo. Pode parecer estranho, porque conheci-o aos 40 anos, mas foi tão fácil ser grande amiga dele. Tínhamos tanta coisa em comum, tantos sonhos em comum. Aquilo que eu desejava para a minha vida, para a minha família, para o futuro do meu país era tão igual àquilo que ele também queria. Foi muito fácil o nosso entendimento.
Quando penso que o partido já tem 44 anos e que o Francisco só viveu seis desses anos… Dos primeiros seis anos, sou capaz de lhe dizer as datas todas, onde foram os conselhos nacionais… tudo. Tão marcante que foi a experiência. A partir daí, embora tenha sido secretária do Dr. Cavaco Silva durante oito anos, deputada durante oito anos, chefe de gabinete do grupo parlamentar por três anos, se me perguntar, não me lembro de data nenhuma, apesar de serem memórias mais recentes. Aqueles seis anos foram de uma partilha e de uma envolvência tão grande que era impossível não ficarem gravados na nossa memória. Cada reunião, cada congresso, cada conselho. Lembro-me quando chegámos ao nosso comício na Alameda D. Afonso Henriques, em 1980, vimos um mar de gente que se prolongava até às escadas do Instituto Superior Técnico. Aquele homem arrastava multidões, era uma loucura. O povo seguia-o muito.
Sempre viveu rodeada de grandes figuras da política. Hoje em dia, reconhece mérito em alguma personalidade ou personalidades da política portuguesa?
Não é fácil. A única pessoa na política portuguesa de hoje com que realmente me identifico é com Pedro Santana Lopes. Toda a gente sabe e não o escondo. É o meu filhote. Conheci-o com 19 anos e adorei trabalhar com ele. Há alguns políticos que admiro muito, até no nosso grupo parlamentar. Uma delas é Teresa Morais, que hoje em dia, por ter apoiado o Pedro nas “diretas” está completamente posta de parte e é uma pessoa muito válida. E como ela há outras. Admiro muito o Dr. Fernando Negrão que, apesar de não ser um político muito hábil, é um homem muitíssimo íntegro e de uma honestidade a toda a prova. E também há gente nova, Leitão Amaro, Miguel Morgado… são pessoas que admiro, mas nunca houve ninguém que se comparasse com o Francisco. Porque mesmo o Dr. Cavaco, que foi um excelente governante, tinha toda a parte operacional técnica, capacidade de trabalho, honestidade, vontade de “andar com o país para a frente”, mas não tinha a maneira de se dar com as pessoas como o Francisco, que era muito capaz e era também de uma amabilidade, de uma simpatia com as pessoas. Nunca queria segurança atrás. Gostava de confraternizar, era único. Uma pessoa excecional.
Participação das mulheres na política
Como recorda a participação ativa da mulher na política em Portugal? Era complicado ser uma mulher e ter um papel ativo na política?
Antes do 25 de Abril, era muito difícil. Havia muito poucas mulheres na política. Maria de Lurdes Pintassilgo era das poucas. Houve algumas do Partido Comunista, com a Alda Nogueira, na clandestinidade, que estiveram presas e foram ativistas, sem dúvida nenhuma. O Partido Socialista também tinha algumas mulheres, mas não era nada fácil. Depois do 25 de Abril, deu-se uma abertura total.
Sempre fui contra as cotas. Sou totalmente contra essa coisa de um terço ter de ser mulheres porque acho que se a pessoa quiser, chega lá. Sempre tive ótimas colegas deputadas, não era por cotas, mas sim porque mereciam.
A verdade é que a mulher portuguesa está a ter uma certa autonomia há muito poucos anos, porque até então era muito difícil pedir a uma mulher, com quatro ou cinco filhos, média normal na altura, que deixasse de terça a sexta os filhos entregues ao marido, que muitas vezes também tinham uma profissão absorvente, para se instalar em Lisboa cerca de cinco vezes por semana. Os meios de comunicação eram também muito reduzidos. Após o 25 de Abril, quem quis e quem se interessou foi capaz de ingressar na política, como Helena Roseta, Maria Barroso, Manuela Aguiar e tantas outras.
Quais as estratégias para lidar com as adversidades que advêm da desigualdade de género evidente na altura?
Normalmente, eram pessoas ou com uma preparação académica superior, que era raríssimo, ou com uma disponibilidade financeira que proporcionasse uma retaguarda familiar que permitia a dedicação à política. Os horários eram terríveis e isso privava muito as mulheres na política. Passávamos noites, até as 5 ou 6 da manhã, quando havia algum problema. Podia dar-me ao luxo, pois tinha todo o tempo disponível. Nessa altura, tínhamos dias em que chegava a casa às 7 da manhã, tomava um duche e voltava para o partido.
As condições de trabalho eram deploráveis. Tínhamos uma pequeníssima sala para um grupo parlamentar com mais de 90 deputados, onde passávamos horas e horas, noites inteiras de trabalho. Era por devoção. Até porque os primeiros deputados ganhavam muito mal. Vinham muitas vezes de longe e viviam em pensões, na zona da Duque de Loulé. Era um “corrupio” que não tem explicação.
O que gostaria hoje de dizer às mulheres portuguesas?
Vale a pena. Vale a pena apostar na política e fazer política com muita honestidade, verdade e lealdade. As mulheres têm capacidades que os homens não têm. Eles têm umas, nós temos outras e existe, em cada uma de nós, um sentido de maternidade que leva a que queiramos para o povo português aquilo que queremos para os nossos filhos. Há uma maneira de estar na política que julgo que é própria das mulheres. Podem ser grandes académicas, como não ter sequer a quarta classe, mas há um elo comum entre as mulheres, uma maneira de estar na vida que é diferente da dos homens. A capacidade de aceitação, a capacidade de sofrimento que as mulheres têm (e que lhes é reconhecida) é uma grande ajuda para querer fazer política. E é essa a mensagem que deixo: Não cruzem os braços. Não baixem os braços. Porque Portugal precisa da mulher na política para lhe imprimir um cunho diferente.
Uma vida a servir
Ao fim de quatro décadas de entrega e serviço, que diferenças são mais evidentes no nosso país?
Mudou tudo. Quando pensamos nas condições em que se vivia e se trabalhava, vemos que hoje, em 2018, é totalmente diferente, sobretudo, nestes últimos anos. Até há pouco tempo, as diferenças não eram muitas até que Portugal foi “rasgado” pelas autoestradas, os transportes ficaram completamente diferentes, vários locais do país ficaram com um acesso tão mais facilitado e depois a tecnologia. Era impensável um telemóvel com acesso à internet, comunicar com o mundo inteiro em tempo presente, sem horas de espera nem limitações de fuso-horários. E as circunstâncias dos portugueses melhoraram muito. Apesar de muita coisa estar mal e muito ainda faltar, se compararmos com o que era a técnica e os conhecimentos na medicina há 40 anos, não tem nada a ver com o que se faz agora. Mesmo ao nível do ensino, existe hoje uma maior facilidade. Não que as crianças de hoje em dia saibam mais do que nós, até sabem menos, mas têm outro interesse e outra capacidade.
O mundo mudou tanto nestes últimos anos. As dificuldades com que nos debatíamos em 1974 para organizar um comício ou uma caravana automóvel, para contactar um líder que estava no meio da Beira a visitar aldeias, onde não tínhamos forma de o contactar… tudo isso dificultava muito o nosso dia a dia.
Mas isso fazia de nós bastante criativos. Lembro-me que o meu “telemóvel” da altura eram os postos da GNR que existiam nas estradas principais, onde estava sempre a polícia de trânsito. Quando começavam as campanhas eleitorais, fazia uma listagem dos números de telefone dos postos da GNR, ligava para o posto por onde passava Francisco Sá Carneiro e pedia aos senhores guardas para lhe entregarem um recado.
Como olha hoje para a sua intervenção no PPD/PSD? Como caracteriza a sua jornada?
Costumo dizer que sou a mãe do PPD. Foi um parto muito difícil, demorado e muito doloroso. E que o meu filho continua, como qualquer outro filho para qualquer outra mãe, a dar-me muitas alegrias, mas muitos desgostos. Apresenta-me problemas, mas também resoluções que me satisfazem. Eu digo que o meu papel no PPD foi ser a mãe daquela gente toda. Muitos já são avós e ainda hoje são conhecidos como os meninos da Conceição Monteiro, entre esses meninos tenho gente muito famosa, o Sr. Presidente da República, o Dr. Durão Barroso, o Pedro Santana Lopes e muitos mais que ainda hoje são os meus meninos. Foram 40 anos inesquecíveis, sobretudo, os seis primeiros, que deram para preencher uma vida inteira.
O que espera das novas gerações?
Imenso. Neste momento tenho 25 sobrinhos, 56 sobrinhos-netos e quatro sobrinhos bisnetos. Espero imenso, porque esta malta toda tem muito para dar ao país, é preciso é que o país os saiba aproveitar. Revejo o resto da juventude nos meus sobrinhos e sobrinhas. Enchem-me de esperança para o futuro, pois uma juventude que tem tanto ao seu dispor, que a minha juventude não teve e tantos trunfos com que jogar tem que fazer alguma coisa de bom. Espero que esta geração tome as rédeas do país um dia e que faça de Portugal aquilo que Portugal pode ser.
Somos muito admirados lá fora e temos feitos extraordinários na nossa história. Como é que um país tão pequenino já dominou o mundo? Desde a Ásia até à América. Não damos o devido valor ao nosso país, tão pequenino e tão rico. Espero muitas coisas positivas das novas gerações.