João Manzarra nasceu em Lisboa e é, para muitos, um dos maiores comunicadores da sua geração. Estreou-se na apresentação em 2007 e, com 35 anos, já conquistou um Globo de Ouro e um Prémio Revelação. Em entrevista, conta como foi a sua infância, como o pai o inspirou, fala sobre a carreira e a influência da fama na sua vida.
O João nasceu em 1985, em Lisboa, e gostava que me falasse um pouco da sua infância. Que memórias guarda e que influência tiveram na pessoa que é hoje?
Foi uma infância bastante urbana, em Lisboa. Sempre tive a vida de cidade, mas tinha alguns escapes ao fim de semana para o Meco. À minha volta, tinha os meus pais que sempre me deram terreno para crescer. Em todas a situações, tive o apoio dos meus pais, um amor incondicional. Sempre tive uma abertura grande para fazer aquilo que quisesse. Lembro-me de uma fase em que gostava de pequenos póneis e de umas bonecas pequeninas dentro de umas caixinhas, entre os 6 e os 8 anos. Calculo que, para alguns pais, fosse um motivo de preocupação ou algum problema, mas, no meu caso, nunca foi. Vendo agora à distância, era perfeitamente normal ter brinquedos que, na altura, eram considerados brinquedos de menina, mas nunca pensei nisso porque era com aquilo que gostava de brincar. Isto para realçar a abertura que os meus pais tinham na educação e em criar um terreno fértil para o meu crescimento. A pessoa que sou deve-se à forma como as pessoas que estão à minha volta me afetam e me vão afetando ao longo da vida. Os meus pais e o meu irmão foram essas pessoas.
Estudou Ciências da Comunicação, curso que não chegou a concluir. Foi sempre esta a primeira opção?
Não foi, de facto, a minha primeira opção, nem me lembro de ter um entusiasmo espetacular por aquilo que acabei a escolher. A minha escolha foi pelas ‘cadeiras’ que o curso tinha e por não gostar de muitas outras coisas. O estudo não era algo que me fosse muito apelativo, na altura em que tive de me decidir por um curso superior. Vi o curso como sendo um caminho que pudesse vir a tornar-se interessante e, depois, acabou por se revelar um curso em si realmente interessante. Acabei por não concluir e eu próprio não me dediquei como deveria.
Como tudo começou
Tinha 22 anos quando se estreou na televisão, no programa “Curto Circuito” na SIC Radical, em 2007. Como surgiu esta oportunidade?
Foi através de um casting. O programa lançou em abril de 2006 um casting, ao qual concorri, mas não me chegaram a chamar. No ano seguinte, um amigo convenceu-me a participar mais uma vez e chamaram-me. Fui, de facto, traçando o meu caminho em televisão e foi como tudo começou.
Considera que a sua idade e falta de experiência dificultaram, de alguma forma, o trabalho?
Não, a idade no programa em que estava… não! O facto de ter começado a fazer televisão tão cedo, possivelmente tirou-me algumas vivências que gostaria de ter tido, mas, ao mesmo tempo, também me trouxe outras absolutamente espetaculares. Quando digo vivências seria possivelmente um pouco mais de tempo para o estudo e também para viajar, mas isso acaba por ser um capricho de ‘primeiro mundo’ e não é uma queixa, ou seja, é só o facto de realmente sentir essa ausência.
Em algumas entrevistas, refere que o programa “Árvore dos Desejos”, um sucesso na época, foi até hoje o projeto que mais prazer lhe deu fazer. Como foi a experiência de lidar com crianças e fazer parte da felicidade que lhes proporcionou?
O programa é muito completo e acho que qualquer apresentador que o apresentasse teria de o incluir como sendo um momento especial na sua vida, porque, de facto, trabalha as ligações de uma forma muito íntima e profunda entre todas estas pessoas, crianças em particular. As crianças são como as pessoas mais crescidas, tanto podem ser boas como más pessoas. Via realmente todos como pessoas, tanto gostava de estar com os avós, os pais e as crianças, desde que houvesse realmente essa empatia. Então, obviamente que foi muito bom poder ser agente de alegria no meio dessas ligações todas e sempre me senti bastante bem e preparado para o fazer.
Reflexões de quarentena
No dia 11 de maio, esteve no “Programa da Cristina” e referiu que tinha interesse e gostava muito de voltar a estudar. Considera que este período de confinamento serviu para fazer uma introspeção?
Sim, pode estar relacionado com isso. Uma das coisas que fiz no confinamento, quando percebi que tínhamos que estar em casa, foi querer que esse tempo fosse útil e não abraçar esta coisa de fazer passar o tempo. Então, desse tempo útil, uma das coisas que fiz foi estudar, da Sociologia à Filosofia, quer através de vídeos no Youtube, quer através de livros que encomendei para fazer o meu próprio estudo. Como estava nesta fase eufórica, quis aproveitar para canalizar e prosseguir os meus estudos.
Referiu também nesse programa, e passo a citar, “Nós somos fruto dos encontros que temos uns com os outros e, se proporcionarmos bons encontros, a vida torna-se de facto melhor”. Quem considera ter marcado mais a sua vida e ter proporcionado esses bons momentos de que fala?
Foi o meu pai! O meu pai foi a pessoa que mais me inspirou na vida. O meu pai, que já faleceu, foi o maior agente de alegria que vi na vida e, por isso, foi uma grande influência, quer comigo, quer com as outras pessoas. Ele fazia com que os encontros fossem sempre muito gentis e com muita alegria.
Ainda relativamente ao tema confinamento, fez parte do elenco dos diretos do Bruno Nogueira no Instagram, que foram a companhia e entretenimento de muitos portugueses. Como surgiu a sua participação neste projeto?
O projeto não tem essa característica de preparação, ou seja, isto tudo começou com uma videochamada no Instagram que o Bruno faz ao Nuno Markl. Só mais tarde é que vi que o Bruno estava em direto e foi aí a primeira vez que me ligou para falarmos. Não houve bem essa estratégia ou preparação, começou com uma chamada… Depois, houve uma perceção de que realmente podia ter um efeito útil, quer na parte do acompanhamento emocional, quer na parte de combater algum ‘chico espertismo’ que pudesse haver nesta altura. Então, decidimos que a minha participação seria recorrente e diária.
No final do projeto, qual foi a reação ao ver tanta gente a apoiar-vos?
Quando o direto começou já foi muito excitante, porque já estávamos a receber as fotografias e as preparações que estavam a acontecer. Foi muito emocionante. Eu estava até um bocado assoberbado com as emoções, porque é difícil gerir o que estava ali a acontecer e o impacto que estávamos a ter na vida de tantas pessoas. Acho que nunca tinha visto um conteúdo que se aproximasse assim tanto da amizade entre quem assistia e quem executava. Acho que foi isso que fez com que realmente houvesse este carinho. No entanto, não é uma vitória em particular de ninguém, mas o abraço possível que demos uns aos outros, a quem assistia e a quem executava, sendo que quem executava também acabava por assistir e, por isso, estávamos todos muito próximos. Acho que foi essa proximidade que acabou por nos juntar e formar estas emoções todas.
Até hoje, qual foi o projeto que ainda não realizou e gostaria de concretizar no futuro? Algo que realmente o apaixone e que pudesse fazer parte da história da sua carreira?
Não consigo dizer um projeto em particular porque esse projeto não existe, mas posso dizer que já tive interesse – e nunca aconteceu – em ter um projeto ou um programa dentro da categoria de ‘programas de viagens’. Gosto muito de conteúdo no exterior, de fazer conteúdos de rua e gostava de me ver com algum exotismo à mistura, acho que seria interessante.
As consequências da fama
Que conselho daria a alguém que queira seguir uma carreira na área do entretenimento?
Quando alguém quer seguir uma carreira na área do entretenimento tem de perceber o que quer, o que o motiva e o que o estimula. O que é preciso, numa primeira fase, é a pessoa conhecer-se a ela própria e, a partir daquilo que a pessoa é, definir uma estratégia que pode ser ter alguma formação, ir conhecendo pessoas e estar atento às oportunidades que podem surgir. No meu caso, acabou por ser o casting, mas sei que, às vezes, há estágios e outras situações, porque toda a gente começa por algum lado. Sinto que o melhor conselho é esta estratégia pessoal e perceber as motivações e as capacidades, porque há muita gente a tentar com motivações erradas e com má estratégia. A parte da fama também faz com que seja um trabalho muito apelativo para alguns, mas, se queres que te diga, a fama é o pior do meu trabalho, porque cria uma pressão desnecessária na minha vida. Há uma espectativa de comportamento quando chego aos sítios e sou conhecido e, muitas vezes, até sou uma pessoa mais fechada, quase que me obrigo a ser introvertido, para que não haja uma expansão tão grande para o outro lado. Não estou a dizer isto como uma queixa, mas como um facto. Ao mesmo tempo, estimula-me muito chegar a muita gente e isso é também o motivo por, hoje, ter cuidado com o que comunico e a forma como o comunico, por sentir a responsabilidade das minhas palavras. Isso dá-me alguma pica, saber que posso ser um agente de mudança naquilo que me parece interessante. O que acaba por ser a minha visão condicionada àquilo que penso e acredito é algo que me entusiasma bastante.