Tem um olho treinado para blind spots e outro para números. Fábio Godinho é estratega na Universal McCann e sente um gosto especial em fazer de advogado do diabo no seu dia a dia. Acredita que no mundo dos media já não basta comprar impressões. Este é o momento de as criar.
O modo de construir e pensar campanhas de marketing alterou-se nos últimos meses. Antevês que seja uma mudança que veio para ficar?
Parte da comunicação das marcas deixou de fazer sentido e a maioria dos profissionais está a fazer alterações a curto prazo. As mudanças drásticas ocorreram nos hábitos de consumo de media. A televisão vive um momento alto (chegou a ter 8:00 horas de consumo diário). O que veio para ficar são ferramentas martech (novas tecnologias aliadas ao marketing digital), os serviços de entregas (que ganharam ainda mais protagonismo), assim como a “vida na nuvem” e as aplicações de teletrabalho. Mas cuidado sempre com quem afirma prever o futuro!
Uma das marcas que trabalhas é a Iberdrola. Qual deve ser, na tua opinião, a sua postura neste momento?
Há uma verdade imutável em tempos adversos, comprovada por crises anteriores: as marcas que sobrevivem são as que conseguem manter o seu potencial de comunicação para aumentar a notoriedade. O setor da energia é um bem essencial, sendo esta uma grande oportunidade para apelar à confiança, à sustentabilidade e à relação qualidade/preço. A marca tem de agir.
“Acredito que se há altura para pensar em todos os P’s do marketing, é esta!”
Um dos últimos desafios que tiveste foi desenvolver um Media Playbook para a Glovo. Se a oportunidade tivesse surgido apenas neste momento, o conceito teria de ser pensado de uma outra perspetiva?
Qualquer análise que fizesse tinha de ter AC e DC: antes e depois da Covid. Teria de abordar o impacto das tendências que vieram para ficar. Quem é que queria saber de lives no Instagram até agora? Terá havido melhor mês para testar a Netflix? Se antes eu já adorava real-time marketing (uma marca reagir em função do que se passa), nesta altura então faz todo o sentido.
Com o surgimento da Covid-19, assistimos a muitas marcas que se reinventaram e reposicionaram. Acreditas que, do ponto de vista da responsabilidade social, esta é uma oportunidade para as marcas?
Acredito que se há altura para pensar em todos os P’s do marketing, é esta! A responsabilidade social já devia fazer parte antes e não gostaria de descobrir que uma marca apenas tentou apanhar boleia. As boas ações serão acarinhadas e mesmo comunicar algo pequeno será melhor do que apenas desaparecer do radar.
É o momento de ser pró-ativo? Enquanto estratega, de que forma pensas ser possível inovar e marcar a diferença?
Já tentava ser pró-ativo antes, agora é sem dúvida importante. Isso e saber mais do que o próximo! A diferenciação de uma agência de meios tem de estar no valor acrescentado que traz à equação. Pessoalmente, gosto de trazer o que o cliente realmente quer, mas recheado de extras surpreendentes!
De todas as marcas que já trabalhaste, houve alguma com a qual te tenhas identificado mais?
Tive o espírito ideal de Fanta, dado o meu mindset teen cheio de ideias low cost e onde “com pouco, faço a festa”! Axe também foi um desafio enorme quando a marca aspirou a um target mais maduro que prefere abdicar de todas (as miúdas) para ficar com a “the one”, algo com que me identifiquei.
“Profissionalmente, o português sempre arranjou forma de se adaptar. Os media são das áreas mais ágeis com provas dadas e que se sabe reinventar”
Em 2018, tiveste a oportunidade, através do grupo IPG do qual faz parte a Universal McCann, de durante três meses trabalhares numa das suas filiais em Budapeste. Sentes que essa experiência te mudou, de alguma forma?
Comprovei que sou capaz de me desenrascar sozinho – se não contarmos com o Google! A vida era mais calma, não havia aquela azáfama diária – eles esperam tranquilamente pelo verde para atravessar. Foi uma oportunidade única na vida de absorver uma cultura totalmente diferente. Já para não falar nas skills culinárias desenvolvidas a fazer caldo verde para 50 colegas ou nas técnicas de apresentação obtidas após fazer Stand-Up Comedy em bares lotados.
Como foi regressar a Portugal? Sentes que trouxeste contigo novas ideias e processos de trabalho?
Quantos de nós nos questionamos se a forma como fazemos as coisas é a certa? Para mim, foi extremamente útil experienciar novas visões de negócio e aperfeiçoar técnicas de comunicação e relações interpessoais. Aprendi formas mais inteligentes de pensar e fazer as coisas, bem como partilhei o que de bom se faz por cá.
Qual é a maior lição, pessoal e profissional, a tirar deste momento que estamos a viver?
Profissionalmente, o português sempre arranjou forma de se adaptar. Os media são das áreas mais ágeis com provas dadas e que se sabe reinventar. Adoro sermos todos apenas uns quadrados nas reuniões e ninguém comentar que trago as mesmas calças há três semanas! Sabe bem ter horários flexíveis. A hora mais produtiva de cada um varia, mas há o risco de se tornar demasiado flexível e perturbar o relacionamento familiar. Espero é que, seja para ver amigos ou regressar ao escritório, voltemos mais elétricos que nunca!
Perfil do entrevistado
O estratega apaixonado por palcos
“Olá, ligou para o Fábio. Ele de momento, está a encontrar relações improváveis em tudo ou a resolver algum enigma, já que não lhes resiste! Tem um olho para encontrar padrões, especialmente em números, mas também tem outro olho, senão era zarolho. Adora fazer rir, especialmente com piadas secas.” É assim que Fábio Godinho se apresenta quando desafiado a fazê-lo da forma mais original possível.
Head of Strategy na Universal McCann, com apenas 34 anos vê nas suas funções a obrigação de descrever situações com precisão e sobretudo imaginação. Licenciado em Audiovisual e Multimédia na ESCS, encontrou nas cadeiras de Publicidade e Marketing um amor para a vida toda e daí saltou para o mundo do trabalho em agências de media. As boas relações com parceiros e clientes ajudaram-no a fazer ações fora da caixa tanto na Universal McCann como na Initiative, por onde também passou.
Recebeu de braços abertos a TAP e num verdadeiro “Com pouco, faço a festa” (slogan da marca Fanta) ajudou a caravana Fanta a acampar no Sudoeste sem ser patrocinador. Tentou pôr “mudasti” no dicionário e acabou a trabalhar a marca Lipton. Aproveitou os museus e as bolas de ouro do Melhor do Mundo para Linic fazer real-time marketing. Fez Chupa Chups entrar nos eSports e juntou a Bumba na Fofinha e o Por Falar Noutra Coisa a enumerar mitos da reciclagem para a Sociedade Ponto Verde. Foi planeador de meios até Portugal ser campeão do Euro, mergulhando de seguida na área de Estratégia Digital, que sempre preferiu.
Aventureiro e ambicioso, em 2012 conquistou o 3º lugar nos Young Lions em Cannes, trazendo para casa um belo bronze. Por outros palcos e em festivais nacionais já arrecadou, sempre em equipa, 11 Ouros, nove Pratas e dois Bronzes.
Em 2018, passou três meses nos escritórios Mediabrands em Budapeste, onde teve a possibilidade de alargar os seus horizontes profissionais e desafiar os seus limites pessoais. Partilhou novas formas de abordagem a estratégias, casos de sucesso e boas práticas na submissão de casos em festivais. Mais que isso, fez do Google o seu novo melhor amigo, ainda assim uma língua com 44 letras, incluindo 14 vogais, também não é fácil de decifrar…
Recentemente, desistiu de esperar que o metro chegasse a Loures e há três anos optou por ares mais puros e torneiras que ligam diretamente à fábrica da Sagres: Vialonga. Vive com a sua namorada Marta e juntos têm uma gata: a Jenny. Consideram-se uns verdadeiros sortudos por ela os deixar lá morar.