Wandson Lisboa é um “follow” obrigatório no Instagram. O designer gráfico de 32 anos, há oito trocou as terras quentes do Nordeste brasileiro pelo Porto, onde diz sentir-se em casa.De passagem por Lisboa para participar na mais recente edição da Web Summit, Wandson não poderia regressar à Invicta sem uma conversa bem disposta sobre o seu processo criativo, onde também houve lugar para comentar a situação política que o Brasil atravessa e ainda, desvendar planos para o futuro.
Veio de São Luís do Maranhão para o Porto. Como foi o confronto com uma nova cultura e cidade?
Na verdade, o Porto foi uma grande surpresa. Terminei os estudos no Brasil e vim para Portugal por achar que seria uma boa escolha. Quando era criança, brincava muito com o facto de vir para Portugal porque o meu sobrenome é Lisboa, muitas pessoas não acreditam nisso. Os meus pais estavam sempre a dizer: “Você não quer nada na vida” e eu respondia: “Quero sim, quero tudo, ainda vou morar em Lisboa”. Não temos noção do poder das palavras. Foi um processo muito rápido, de repente, já cá estava a fazer o mestrado. O Porto foi uma escolha muito orgânica, um pouco pelo lado financeiro também. Entre a capital e a segunda maior cidade, o Porto tem as casas mais baratas. Porém, também está a ser afetado pelo turismo. Tenho saudades de passear pelo Porto tranquilo e, hoje em dia, é um pouco difícil. O drama turístico está a começar a chegar.
O que encontrou no Porto que o Maranhão não tem?
Por exemplo, metro. Demorava uma hora para chegar ao meu trabalho, na TV Globo, e eram 9 Km. Chegar aqui e ter metro, fiquei muito “wow!” porque nunca tinha andado antes. E uma praia. Em Matosinhos, a praia é muito fria e faz diferença.
Visto por alguém que vem de fora, qual a cidade com mais potencial para desenvolver o seu trabalho?
Lisboa, sem dúvida. Estou a falar do Porto, mas o dinheiro, a Internet estão aqui. É por esse motivo que ainda defendo um bocadinho o Porto. Sei que não tenho esse poder de persuasão, mas tento levar as pessoas para o Porto. Bato muito a tecla dos “finos” – expressão oriunda do norte do país para designar uma cerveja. A Internet ajuda muito a dissipar essa ideia. Adoro chegar a Lisboa e ter pessoas a dizer “paga finos”. Nos últimos seis meses, não tive trabalho fixo no Porto, os trabalhos estão todos aqui. Gosto desta brincadeira de andar a viajar de um lado para o outro. Sinto que tenho a minha cabeça no Porto e de que faço um bom trabalho em Lisboa. Gosto muito de estar em casa, mas é uma escolha que faço em andar de cá para lá. Sei que as melhores empresas, as oportunidades estão em Lisboa. No entanto, nunca trocaria o conforto do Porto.
Com a situação política que se está a viver no Brasil, o que sente que pode fazer a esta distância?
Não gosto muito de falar de política, mas estamos numa situação tão crítica que temos que dizer alguma coisa. Fico um pouco chateado com os brasileiros que saem do Brasil à procura de algo melhor, vêm morar num país socialista, de esquerda, democrático e aqui votam contra isso. Por um lado, não os defendo, mas percebo o desespero. Estamos numa situação de corrupção muito grande, num patamar de pobreza assustador e quando um tipo aparece como uma espécie de Messias que vai tirar toda a corrupção, as pessoas acreditam e amarram-se a isso. É um pouco o “efeito Trump” e as pessoas estão cansadas porque o caos as tornou assim. E muitas pessoas de direita “põem” as culpas nas de esquerda pela liberdade a que se dão. Na verdade, podia-se trabalhar com amor. Estava na ‘Web Summit’ a ouvir Marcelo Rebelo de Sousa a falar e via a cara das pessoas felizes. Claro que o Presidente não tem 100% de aprovação, agradar a toda a gente não é possível. Mas é uma pessoa “bemquista”, ele quer muito o bem, ouve as pessoas, tem muita popularidade. Mas também quando tem que ser duro e ríspido, é. É um ser humano muito inteligente e é isso que falta no Brasil. Tivemos um professor a concorrer com um ex-cabo da Polícia Militar, que é o Bolsonaro, e acho que falta mais amor por parte das pessoas, falta juntarem-se e fazer uma coisa melhor. É um bocado romântico da minha parte dizer isso, mas o Brasil precisava de uma mudança e não era essa. Talvez ajude as pessoas a acordarem e verem que estavam errados, ou não.
Ideias coloridas e uma infância feliz
Como funciona o seu processo criativo?
Neste momento, estou parado porque funciona mesmo assim. Hoje em dia, prefiro desenhar bem, usar muito bem as cores e executar bem. Demorava muito tempo a testar, tirava fotos, editava e depois não gostava. Agora, penso nas coisas, mas nunca uso a primeira ideia, porque essa é a que toda a gente pensa. Então pego nisso e “esmiúço” ao ponto de pensar o que é que as pessoas não fizeram com esta primeira ideia. Mas estou bastante saturado de fazer fotos – confesso – e o meu trabalho tem que ser bastante espontâneo. E o Instagram vive muito à base do feed, das 24 horas de um story… Não me considero um instagrammer, apenas o utilizo para potenciar o meu trabalho.
Se se encontrasse com o Wandson em criança, o que lhe diria?
Vais ser incrível, continua! Vais ser dono de ti mesmo, fazer o que quiseres, quando quiseres, como quiseres. Vais ser dono da tua imagem, brincar como queres, ter os amigos mais incríveis de sempre. E aproveita e compra uns casacos que vais morar em Portugal.
Wandson na rede
Como descreve a experiência de ser um influencer? Isto é, se se considera um…
Não me considero influencer, não estou a influenciar ninguém. Não seguro um produto na mão, não estou a ser blogger ou a receber roupa para tirar fotos. Não me encaixo nisso de ser influencer. Às vezes, sou até um pouco agressivo porque acho que é preguiça das pessoas classificarem as outras, então não quero ser isso. É bom quando uma pessoa tem sustentabilidade no trabalho, mas não tenho paciência para quem só segura produtos e viaja. Não é que sinta inveja. Agora acompanhar a vida de uma pessoa que não faz nada, não me insiro muito nisso. Sou mais de estar com os amigos, distribuir abraços e receber carinho.
Mas o Instagram é a sua principal montra de trabalho. O que o levou até esta rede social?
Quando cheguei a Portugal, estava à procura de uma app que metesse filtros nas minhas fotos. Fiz a minha conta no dia 6 de outubro de 2010, no mesmo dia que o Instagram foi criado. E nunca apaguei nenhuma foto, quem quiser pode lá ir ver. É só filtros e bonecos. E quando vi que as pessoas estavam a gostar, percebi que podia melhorar, os bonecos podiam ficar uma coisinha melhor. Há uma foto que adoro: peguei numa embalagem de gelado e num boneco da Lego e meti-o a surfar, como se estivesse na neve. Isto foi progredindo, começou como um passatempo. Hoje em dia, é tudo muito mais pensado. O Instagram nunca foi uma escolha de trabalho, mas agora é um portefólio que tenho.
Se não existissem redes sociais, como imagina que seria a sua vida?
Nunca pensei sobre isso, não faço ideia. Estamos tão conectados… Estamos num café e com muita gente ao nosso redor e estão todos ligados. Uma coisa que não gosto é estar com os meus amigos e estarem ao telemóvel. Sou o tipo mais chato. “Oh malta, por amor de Deus, desliguem isso e estejam comigo!” E sou eu que estou sempre no telemóvel que digo isso. Mas não faço mesmo ideia. Acho que seria muito doido.
O que o Futuro reserva
Disse que, no Brasil, trabalhou na TV Globo. Gostaria de voltar a trabalhar em televisão?
Talvez na parte da produção. Em Portugal, já tive experiências no ‘Canal Q’, mas ter ideias e dá-las para alguém que as consiga fazer é algo muito porreiro. Chamaram-me para fazer um casting e não fiquei no programa, mas só pelo facto de as pessoas se terem lembrado de mim, senti-me muito feliz.
O que lhe reserva o amanhã?
Tenho desenhos animados já em produção: “Paga Finos”. A história de um rapaz e do seu melhor amigo (que é um fino) e juntos vão viver altas aventuras.