Se os meios de comunicação social são influenciados pelo poder governamental, será que também não serão ambos influenciados pela tecnologia ligada aos novos media? A imprensa há muito que anda a ser silenciada pelo forte poder divulgativo das redes sociais.
Vivemos num país em que quase 46 anos de democracia não significam necessariamente liberdade de autonomia jornalística. Que os media sejam denominados como o ‘Quarto Poder’ presente numa sociedade democrática já todos sabemos, mas, à luz da verdade, essa democracia aparenta esconder-se por detrás de uma “cortina de ferro”. São inúmeros os episódios que se podem contar (talvez não pelos dedos de uma mão) de situações em que a própria democracia tentou influenciar a Comunicação Social.
Quem sou eu para estar a falar dos antecedentes a abril de 1974, mas é um facto evidente até aos dias de hoje que pacificidade nunca existiu nas relações do poder político com o poder mediático, mesmo quando ambos estão intrinsecamente ligados. Existe uma influência mútua entre ambos, com maior incidência da política nos meios de comunicação, mas também não é de estranhar que esta situação não seja observada pelas massas em Portugal… E não é, até porque já antes da Revolução de 1974, e claro que este episódio é de melhor recordação aos contemporâneos dos anos 70, a censura já “domesticava” com as suas meticulosas mãos as tensões com os media. Mas é também numa fase posterior ao 25 de abril que ocorreu o chamado “Verão Quente” nas redações nacionais. Aconteceu porque os poderes político-militares foram porta de acesso à junção partidária dos principais jornais, e esse acontecimento propiciou a encruzilhada entre a política e os media.
Mesmo com Francisco da Costa Gomes a promulgar uma liberdade de imprensa expressa na Constituição de 1975, de uma imprensa que escorregou no “Verão Quente” pela liderança política, resultaram também os chamados “Casos”, entre eles o “Caso Rádio Renascença”, que havia sido controlada pela esquerda radical, assim como o “Caso Républica” que controlou o setor gráfico, ligado ao PCP, e apontava o dedo à administração e à redação: queriam transformar o jornal, com o então diretor socialista Raul Rêgo! O jornal acabou por encerrar, com a presença de intervenção do COPCON (Comando Operacional do Continente), do Conselho de Revolução e, como já não era de esperar, do próprio Governo. Toda esta situação se pode explicar por simples palavras: atentado à liberdade de imprensa.
O poder político não é o único a entregar-se à pressão e à fragilidade, causa da concentração dos media, afirma-se mesmo que a maior pressão dos jornalistas está relacionada com a autonomia e, nela, estão segregados os poderes político e económico. Nesta constante de intervenções aos Meios de Comunicação Social de um Portugal democrático pode-se reter a ideia de que: 1) a comunicação social alcançou visibilidade à ‘boleia’ dos acontecimentos mais mediáticos que ocorrem; 2) que há interesses dos poderes económico e político; 3) e uma suposição de ameaça à liberdade de imprensa em Portugal.
Mentira não seria se me dissessem que a imprensa está ligada a fontes oficiais, sendo mais fácil fazer-se jornalismo na área da política. Mas, a meu ver, há um motivo que potencializa mais esta polémica que parece não ter fim à vista. Ora, uma coisa é certa: sempre existiram e existirão pressões políticas e económicas sobre a vertente jornalística, essa pressão muitas das vezes não é “reconhecida” de forma direta, porque é feita de forma subtil, recorrente numa sociedade ocidental. O mesmo acontece nos Estados Unidos da América. A camada jornalística pretende lograr a independência ao Governo, mas o que acaba por dar “voz” a essas pressões é a visibilidade e, dessa forma, a influência que os média exercem sobre a opinião pública. A “estrutura de informação circular”, que os jornais usam ao se replicarem com as mesmas informações, também acaba por culminar nestas polémicas.
O jornalismo é prejudicado por um mercado mediático muito concentrado. Mas dá uma certa piada observar esta dicotomia. Se pensarmos bem, essa concentração vai contra o que diz a “Constituição da República Portuguesa”, uma vez que devia de ser encargo do Estado impedir a concentração. Mas é claro que, a um Governo que se finge de ceguinho, dando asas a interesses económicos de rentabilidade e lucro, faz com que desde os anos 90 esteja impregnada uma lógica económica dominante no setor dos media.
Em período eleitoral, é a propaganda e a presença dos media que nos lembram que há uma campanha a decorrer. O período de campanha é um momento forte para a democracia e, por isso, os atores políticos têm nos media o suporte para fazerem promoção da sua imagem e das suas propostas. Tentam ao máximo aproximar-se dos eleitores. É um curto espaço de tempo aquele em que os jornalistas colocam os políticos no centro da informação, mas é claro que ‘dentro’ dessa informação é natural que exista alguma omissão e seleção do que os media escolhem para afirmar a ajuda à “propaganda política”.
Sempre aprendi que o jornalismo influencia escolhas e essas escolhas, por sua vez, são também influenciáveis pela opinião pública, por mim, por si, por todos. Mas também é importante mencionar que a ética do jornalismo assenta no desequilíbrio de escolhas entre o jornalismo sem fins lucrativos e um jornalismo que não tenha influência de lógicas comercias. Se é que isso existe.
Mas se os Meios de Comunicação Social são influenciados pelo poder governamental, será que também ambos não serão influenciados pela tecnologia ligada aos novos media? Eu responderia que sim. A imprensa há muito que anda a ser silenciada pelo forte poder divulgativo destas redes. Qualquer um pode fazer notícias, assim como qualquer um tem ao seu alcance um dispositivo móvel para se conectar a uma rede social, seja o Twitter, Facebook, Youtube ou Google. A ânsia não está relacionada com a espera pela próxima edição de um jornal para saber notícias em primeira mão, mas com o envio/receção de um número incalculável e instantâneo de informação nova a qualquer segundo do dia.
É lógico que as redes sociais são a maior influência aos media da última década e arrastam consigo questões políticas. Em 2010, tínhamos aos nossos olhos uma manifestação convocada no Facebook, na Primavera Árabe. Este manifesto resultou na derrocada de Hosni Mubarah, Ben Ali e Muammar Al-Kadhafi. A situação económica e política no Brasil em 2013, tampouco deixou margens para dúvidas e se desse início a uma manifestação que seguiu o mesmo rumo da anterior, começando o descontentamento nas redes sociais, que resultou numa mini reforma política, assim como o impeachment de Dilma Rousseff.
Percebo que estes acontecimentos muito dificilmente teriam lugar nos Meios de Comunicação Social, e é esta a mudança que as redes sociais trazem consigo. Lançam as novidades e os meios fazem-se aproveitar dessas informações tecendo-as com o seu rigor jornalístico. Ao referir isto, não significa que ambas sejam independentes: a imprensa trabalha de forma integrada com as redes sociais, mantendo-se em contacto com o público.
Não é preciso aceder a uma base de dados para perceber que a imprensa perdeu leitores – pela pouca atualização noticiosa, assim como pelo preço e a falta de tempo que o leitor tem para dar às notícias. Passa-se a encontrar uma melhor opção nas redes socias, onde as pessoas se unem por causas. Mas se se perguntar à maioria dos cidadãos que utiliza redes sociais se a sua participação política aumentou com o uso destas… a maioria das respostas podem não ultrapassar um “talvez”.
Os ativistas fazem-se ouvir nestas plataformas, eu mesma me deparo com eles sempre que entro no Twitter. Estes seres opinativos geram o impacto social e político que um jornal nunca poderia proporcionar – a opinião pública é de maior dimensão, há troca acesa de palavras, há opinião, há maior força devido à multiplicação de informação. E é por isto que as redes sociais já são espaços que começam a ser levados em consideração nas pautas políticas.
No meio digital, os políticos falam não só com a imprensa, como também com a sociedade, com as pessoas. E isso podemos ver nas eleições, onde as campanhas e a “guerra” acontecem nas redes sociais. E já aconteceu. Veja-se o caso dos Estados Unidos, com o candidato republicano Donald Trump a vencer devido ao poder de propagação de informação, ligado à propaganda, com informação seja ela falsa ou verdadeira.
Mas podemos entrar mais em detalhe no caso Trump. A sua campanha eleitoral às presidenciais de 2016 foi impulsionada pela empresa britânica Cambridge Analytica que, com a sua estratégia de propaganda, ajudou Trump a vencer. Aqui, plataformas digitais como o Google, Youtube, Snapchat, Twitter e Facebook deram aso ao que viria a dar votos ao atual Presidente, com técnicas para direcionar mensagens que foram visualizadas milhares de vezes, de maneira a atingirem os eleitores certos e tendo em conta a sua informação geográfica.
A verdade é que são estratégias que ajudam tanto a nível mediático, como político e económico. Todas são influenciadas e influenciáveis. É claro que o que diferencia as relações entre os poderes económico e político e a Comunicação Social é a difícil perceção de perceber onde acaba a interferência política e começa a económica, mas a liberdade de expressão nunca é oprimida ou proibida, uma vez que toda a gente tem espaço para exprimir-se. O dever do jornalista é ser independente, resistir e denunciar as pressões.