Com uma carreira que começou na equipa técnica da futebol feminino do Sporting Clube de Portugal e no relvado do Estoril Praia, Mariana Vaz Pinto é, atualmente, a única mulher numa equipa técnica de futebol masculino, desempenhando as funções de Team Manager do Belenenses SAD. Em entrevista ao UALMedia, relata a experiência nesta equipa da Primeira Liga de Futebol, a transição de jogadora para membro de equipa técnica, as resistências que sentiu ao longo da carreira e o papel da mulher nesta área desportiva.
Foi a primeira mulher inscrita como delegada num jogo da Primeira Liga de Futebol e, recentemente, deu início ao percurso no Belenenses SAD. Quais as funções que atualmente desempenha no clube?
Sou Team Manager da Belenenses SAD e ser Team Manager passa por fazer a ligação entre todos os departamentos que existem no futebol. Desde falar com o diretor de futebol, falar com a administração, ter muito contacto com os jogadores e ajudá-los em tudo o que eles precisarem. No fundo, é fazer todo o trabalho logístico e administrativo.
Visto que é a única figura feminina numa equipa técnica de futebol, foi fácil impor-se neste meio ou sentiu resistências?
Não, foi muito fácil. Não é mais difícil por me olharem de lado, mas sim por ser estranho, visto que não é muito comum [uma mulher nestas funções]. Receberam-me muito bem e tem sido fácil a adaptação a este meio chamado “só de homens”.
Começou a carreira na equipa técnica do Sporting feminino. Também foi jogadora pelo Estoril-Praia. Como é que surgiu o interesse pelo futebol?
Na minha vida, o futebol começou quando era muito nova, tinha seis anos. A minha mãe pôs o meu irmão a jogar, mas ele não gostou. Pedi para experimentar e, a partir daí, fiquei eu no futebol e o meu irmão saiu.
E como foi a transição de jogadora para a equipa técnica?
Foi difícil porque gosto muito de jogar futebol. Ainda hoje, continuo a jogar com as minhas amigas, mas também já me lesionei duas vezes no joelho e, por isso, achei que na altura a opção mais sensata seria continuar no futebol feminino ou no futebol, mas fora de campo.
Nos últimos anos, Portugal tem apostado cada vez mais no futebol feminino. Sei que uma das razões para ter abandonado a carreira no futebol foi também a falta de condições que existiam nesse período para o futebol feminino, correto?
Sim, na altura em que jogava, aos seis anos, era com rapazes. Mas, aos 12, tive que deixar e, quando voltei, aos 16 anos, foi para uma equipa feminina que tinha jogadoras com 30, 25, 26 anos. Era uma grande discrepância. Hoje, uma miúda que tem 10 anos já pode jogar com as miúdas que têm 10 anos. Uma miúda que tem 15 já pode jogar com as que têm 15, e isso é muito bom para elas. Para nós, que somos mais velhas e tivemos que passar por isso, às vezes era complicado para nos afirmarmos e nos adaptarmos. Felizmente, hoje o futebol feminino já está muito mais evoluído e cada jogadora pode jogar no seu escalão.
Portanto, sente que se iniciasse hoje a carreira de jogadora o seu percurso teria sido completamente diferente?
Acho que sim. As jogadoras hoje começam pequeninas e vão crescendo ao longo do tempo, com equipas e jogadoras da idade delas. Eu tive que crescer muito mais rápido, porque tinha que acompanhar jogadoras que podiam ter 30 anos.
Ao longo do seu percurso no futebol, teve e tem referências a nível nacional. Quem é que era e é alvo da sua admiração?
Gosto muito da Mariana Cabral, a treinadora da equipa A do Sporting feminino. Esteve comigo durante cinco anos na formação do Sporting. Foi muito importante para mim e para o meu crescimento. É um exemplo que sigo e é muito graças a ela que sou o que sou hoje.
Iniciou recentemente um novo caminho com o Belenenses SAD. Quais são os objetivos e ambições nestas funções e para o futuro profissional?
Neste momento, quero aprender. Quero perceber melhor o que é este futebol dito “de homens”, porque estou aqui há pouco tempo, só tenho 26 anos, e por isso sei que tenho muito para crescer e aprender. Acho que devo viver um dia de cada vez porque, por exemplo, no início da época nunca imaginei que poderia estar aqui. Portanto, não vale a pena fazer planos. É viver um dia de cada vez e aprender, que é o mais importante.
A presença da Mariana numa equipa de futebol masculino foi uma marca bastante importante para o futebol assim como para o sexo feminino. Ainda é um desafio para as mulheres imporem-se neste meio?
Acho que sim. Infelizmente, ainda somos muito poucas, mas espero que cada vez haja mais e que cada vez haja mais coragem para apostarem numa mulher se ela for competente e acharem que ela consegue desempenhar um cargo da mesma forma do que um homem, e não escolherem um homem só porque é um homem.
Que mensagem gostaria de passar às jovens que querem seguir profissionalmente a área desportiva?
Não desistirem. Continuar a trabalhar, a estudar, saber mais, pois o saber não ocupa lugar. Devemos estar sempre atentas e, um dia, há de acontecer como aconteceu comigo: ter uma oportunidade e aproveitá-la.