“Tu, com essa ideologia, estavas bem era na JSD” foram as palavras de uma militante da Juventude Comunista Portuguesa, colega de secundário de Ana Margarida Balseiro de Sousa Lopes quando a ouviu defender certas ideologias. Dito e feito. Com 28 anos, Margarida tornou-se a primeira mulher líder da Juventude Social Democrata (JSD). Agora, aos 33, e tendo como mote “a política não é profissão”, deixou de ser deputada do Partido Social Democrata (PSD) e, atualmente, partilha o seu tempo entre o doutoramento e a Comissão Política Nacional do PSD.
A partir de que momento da sua vida começou a ter interesse por política?
Desde cedo, tive noção do meu gosto por política, só não sabia onde me encaixar. Sabia que tinha de ter uma participação mais ativa, além de ler jornais e dar opinião. Em casa, discutíamos muito temas sociais, por o meu pai ser jornalista [Fernando Lopes] e a minha mãe educadora de infância. Contudo, foi no ensino secundário que o meu interesse por política se enfatizou. Quando, após uma troca de galhardetes, uma colega que militava na juventude comunista [Diana Gregório], se virou para mim e disse: “Tu com essa ideologia, estavas bem era na JSD.” Esta frase ficou-me na cabeça e, no regresso a casa, fiz questão de a partilhar com o meu pai, para obter esclarecimentos. Face ao que lhe pedira, aconselhou-me a pesquisar e a registar todas as dúvidas. E assim foi. Aprofundei a questão, pedi esclarecimentos e inscrevi-me na JSD.
Como é que devemos encarar a política?
Como uma vocação! Uma coisa que o meu pai constantemente dizia era: “Nunca te esqueças que a política não é profissão, portanto, para preservares a tua autonomia e liberdade, é bom que estudes e que tenhas a tua atividade profissional, independentemente da política.”
De acordo com site da JSD, foi na Associação de Estudantes da Escola Secundária da Marinha Grande que deu os primeiros passos no associativismo.
Sim, foi. Normalmente é nessas idades que a curiosidade pela política desperta e, consequentemente, surgem as primeiras dúvidas e questões. Portanto, as associações estudantis são uma porta para começarmos a ter uma intervenção cívica e um instrumento para pormos um bocadinho de nós ao serviço dos outros.
O que é ser deputado?
Uma grande responsabilidade, visto que é o exercício de representação dos outros. Enquanto um membro de um governo não é eleito, um deputado é! E tem um mandato de representação. Ao longo de um mandato, surgem muitas vezes situações de choque, entre aquelas que são as nossas convicções pessoais, as orientações do partido em que estamos inseridos e a opinião dos nossos eleitores. Foram algumas as circunstâncias em que estes parâmetros entraram em desacordo, mas a lei da eutanásia foi a mais evidente. Tanto o partido como a maioria das pessoas do círculo eleitoral que representava tendiam para um lado diferente daquele que defendia, e isto fez-me pensar: “Quem são e o que pensam as pessoas que eu represento?”
Quando ocorre um choque entre as nossas próprias convicções e as do partido que representamos, como aconteceu com a lei da eutanásia, como agir?
[Hesita] Não devo ignorar que mexe connosco quando alguém diz que não estás a desempenhar convenientemente as tuas funções. Porém, tinha aquela conceção, proveniente das minhas convicções pessoais sobre a vida humana, a autonomia, a liberdade e o papel da sociedade. Portanto, tomei a minha decisão com consciência e liberdade. As críticas que lhe sucederam, ao final do dia, não deixaram de impactar, mas voltaria a fazer tudo exatamente igual.
Foi deputada com apenas 26 anos. Ao longo do seu percurso na Assembleia da República, sentiu em algum momento que as pessoas descredibilizavam o seu trabalho ou as suas ideias por ser tão jovem?
Sim! Há sempre paternalismo, e o facto de ser jovem e mulher eram logo duas desvantagens. Lembro-me de, na minha primeira intervenção para a Comissão de Orçamento e Finanças, o ministro das Finanças se virar para mim com o comentário: “tão jovem e tão dramática”. Em virtude do tempo que despendi para preparar a intervenção, e reconhecendo que fui assertiva, não me restam dúvidas que, se fosse homem e tivesse mais 20 anos, aquele comentário não teria surgido. Além do mais, estavam contidos dois preconceitos. O primeiro, relativo aos jovens; o segundo, às mulheres. Como é obvio, esta crítica preconceituosa incomodou-me. Porém, na altura, pensei: “devo ter feito mesmo uma boa intervenção, se não, não teria havido a necessidade de desqualificar a mensagem, centrando o foco no mensageiro!”
De alguma forma, as críticas deram-lhe alento para continuar a querer ser mais e melhor?
Claro que sim! A pior coisa que me podem dizer é: “Tu não consegues fazer isto.” Se nos dedicarmos, conseguimos. Um exemplo de dedicação foi ter chegado a deputada pelo PSD, sendo oriunda da Marinha Grande, terra tendencionalmente de esquerda, que até à data nunca tinha tido nenhum deputado. Acredito mesmo que, se queremos ser cada vez mais e melhor, devemos ouvir as críticas e retirar o bom que elas têm.
Numa entrevista à Antena 3, afirmou que “os deputados têm um dia por semana, nomeadamente a segunda-feira, para reunir com escolas, associações, empresas, entre outras entidades”. Considera que um dia é suficiente?
Se for só esse dia, não é! Se fores um deputado na sua plenitude, nunca é só esse dia. Quando houve o tema das dificuldades do ensino artístico, o Orfeão de Leiria e a Academia de Alcobaça eram os principais afetados. Essa informação chegou num sábado ou num domingo. Isto para dizer que um deputado, quer queira quer não, está em constante contacto com as várias instituições, porque não tem um botão liga-desliga que o permita desconectar das coisas.
Nessa entrevista, referiu que “o PSD nasceu e cresceu a saber respeitar as pessoas das várias áreas e de vários contextos, como o partido da representatividade portuguesa”. Considera que o atual PSD, de Luís Montenegro, pode ser considerado como o partido da representatividade portuguesa?
Sou parcial nesta questão, como é evidente. Porém, o PSD e esta liderança não se preocupam apenas em defender o grupo X ou Y, porque, se o fizermos, a dada altura estamos a defender apenas determinados grupos. Neste renovado PSD, a filosofia é olhar para as pessoas, o país e a sociedade. Preocupamo-nos não com os interesses individuais, mas sim com os interesses coletivos.
À pergunta de Diana Duarte “Gostarias de voltar ao parlamento?”, respondeu que enquanto Rui Rio se encontrasse na presidência do PSD “não sei se fará sentido voltar ao parlamento”. Com Luís Montenegro à frente do partido, é capaz de voltar?
Entrei para o parlamento e disse que não ia fazer mais de dois mandatos. Um deputado deve ter atividade profissional além do exercício parlamentar. Atualmente, fez sentido regressar à atividade profissional, com a questão do doutoramento. Se isso significa que afaste por completo a possibilidade de voltar ao parlamento? É claro que não. Contudo, enquanto cidadãos, devemos estar tão livres para entrar como para sair. Ao longo de toda a minha vida, nunca meti na cabeça “quero ser deputada”. O facto de nunca o ter feito foi o que acabou por me ajudar a desprender do exercício político. Se fizermos o nosso trabalho em condições, as oportunidades acabarão por surgir. Nunca nos podemos esquecer que estar no exercício político é, acima de tudo, ter a sensibilidade de perceber o impacto que temos na vida das pessoas. Portanto, se não tivermos esta sensibilidade como alguns políticos em atividade parlamentar, não estamos lá a fazer nada!