Fábio Jorge, mais conhecido por Krayze, substituiu o caminho que o levava para engenharia informática pelo caminho da dança. Bailarino, coreógrafo e professor de dança na ‘Jazzy Dance Studios‘ e na escola de dança que dirige, a ‘KrayzeSchool‘, tem ainda uma marca própria, a Krayze e, recentemente, conta com sete músicas lançadas.
À conversa com um dos bailarinos mais reconhecidos a nível nacional, num ambiente calmo, Fábio Jorge mostra-se uma pessoa sempre acessível, descontraída e interessada, partilha o percurso da dança e a visão que tem desta arte. É notória e contagiante a sua energia. Não é por acaso que a sua alcunha seja Krayze. A juntar ao seu currículo e vida ocupada, dá também workshops fora de Portugal.
Nasceu em Luanda, Angola, e aos 13 anos veio para Portugal. Quando e como surgiu a paixão pela dança?
Já gostava e dançava em Angola, na rua com os meus irmãos, amigos e família, mas foi sempre porque gostava. Era apenas uma ocupação. Quando cheguei a Portugal, o objetivo era estudar e tirar o curso de engenharia informática, mas pelo caminho continuei sempre a dançar e a estar, de certa forma, ligado à dança.
Certos artistas iniciam-se nas suas áreas como um hobbie. Assim que começou a dançar, percebeu desde logo que era o que realmente pretendia fazer a nível profissional ou, simplesmente, achava que a dança seria um passatempo?
Sempre vi a dança como um hobbie, não pensava que poderia ser algo mais. Só no ensino secundário, quando tinha de decidir o que fazer, é que realmente vi que a dança era a minha paixão. Então, decidi que queria fazer vida através da dança, queria que passasse a ser um objetivo profissionalmente.
É difícil ser reconhecido como bailarino profissional?
Depende em que área da dança estamos inseridos. Por exemplo, um bailarino de uma companhia de bailado é visto como profissional, mas nas danças urbanas e outros estilos temos sempre que nos esforçar para sermos vistos como bailarinos profissionais. No entanto, dentro da comunidade sabemos que somos reconhecidos.
Em 2015, participou no “Achas Que Sabes Dançar” e chegou até às galas ao vivo. A sua audição teve imenso sucesso. De onde vem toda essa energia, garra e boa disposição que o caracteriza?
Muito sinceramente nem eu sei, já me fizeram esta pergunta várias vezes e ainda não descobri de onde vem tudo isso. Mas tenho algumas teorias, claro. Por exemplo, o facto de ter algum medo, ou seja, nervosismo e ansiedade talvez provoquem essa energia.
Em relação ao “Achas Que Sabes Dançar”, foi sem dúvida uma oportunidade para dar a conhecer o Fábio Krayze, que gosta de dançar e adora aprender. Tive muita sorte e também trabalhei imenso todos os dias para me manter nas galas. Adorei participar no programa.
Ao longo do programa, saiu da sua zona de conforto e mostrou a sua versatilidade. Como se sentiu?
Não me senti nada confortável, mas ia sempre com aquela vontade de aprender e tentar ao máximo fazer o melhor. Tive dificuldades, pois eram experiências que nunca tinha vivido ou fiz uma vez pelo menos, mas a viagem era tão boa que não me importava com as dificuldades e estava ali a 100%.
É bom na dança termos conhecimento dos diferentes estilos?
É ótimo termos esse conhecimento, até porque faz com que o nosso próprio estilo mude e até para melhor. Também para outros trabalhos é importante. Se tivermos esse conhecimento, é fácil estarmos lá e integrarmo-nos.
Dançar cá e lá fora
Quais as suas inspirações, nacional e internacionalmente, a nível profissional?
Já tive muitas inspirações, mas agora tenho pessoas que me são mais próximas. A nível nacional, tenho a minha melhor amiga, trabalhamos juntos há mais de dez anos. Tenho o Tarik Chand, uma pessoa incrível. Depois, tenho inspirações de Rita Spider, de Vasco Alves e de Diana Matos. Em relação ao nível internacional, inspiro-me sempre no geral ou naquilo que considero útil para mim.
Em conjunto com o seu grupo, ‘FunkyMonkeyZ‘, participou também no “Got Talent Portugal”, em 2016. Conseguiram o botão dourado e chegaram até às galas ao vivo. Programas como este dão visibilidade aos artistas durante os seus percursos. E após? Essa visibilidade é esquecida ou representa, sobretudo, uma oportunidade de carreira?
Sim, representa acima de tudo uma boa oportunidade para podermos fazer mais e traçarmos a nossa carreia. A visibilidade é esquecida se não alimentarmos de forma correta essa oportunidade. Sinto imenso orgulho nos FunkyMonkeyZ, pois acima de tudo somos uma família e até hoje apoiamo-nos muito e ainda recebemos convites para atuações. Só assim vemos o que realmente passamos às pessoas que é a essência da dança, a alegria e a cumplicidade.
Qual a sensação de estar em palco e ser o “centro das atenções”?
É um pouco indescritível, pois, às vezes, não sabemos como estar perante o público, como reagir, daí o nervosismo. Mas gosto. É desafiante e sinto que devo dar tudo, uma vez que as pessoas querem ver sempre o melhor.
Para além de Portugal, dá workshops em diversos países. Quais?
Já passei pela Suíça, Bélgica, Hungria e Finlândia. Espero ainda viajar muito mais, pois adoro ensinar e, claro, viajar também.
A nível de dedicação, exigência e ensino, estes países, incluindo Portugal, estão ao mesmo nível?
Não acho que estejam ao mesmo nível. A nível de exigência, os outros países são mais exigentes e mais disciplinados. Portugal nem tanto, mas tem muito mais talento e boa matéria-prima.
Outros tempos, nova geração
Como avalia o ensino da dança em Portugal? Há algo a mudar?
Na minha opinião, podia ser melhor, mas já está muito bom e a qualidade melhorou imenso. Não vejo assim, que tem de mudar obrigatoriamente. Penso que o ensino da dança tem que continuar a evoluir, a ter boas formações e pessoal empenhado.
Dá aulas e workshops em vários locais e tem uma escola, a KrzeSchool. Como carateriza a nova geração da dança?
A nova geração tem muito mais acesso a informação, portanto, penso que devem ser e alguns são “máquinas”. Também temos pessoas com informações que não são as mais certas, pois com a internet o mundo da dança mudou muito. Ainda assim, penso que há talento e com a informação que a nova geração tem hoje em dia, facilita muito mais.
Para alguém que tem anos de experiência, trabalho árduo, conquistas, paixão, sangue e suor, como é saber que existem aqueles que dançam apenas porque “está na moda”?
É difícil e chato ter um aluno novo, tentar passar algo com conteúdo ou primeiro as bases e essa mesma pessoa diz que não precisa das bases, apenas quer melhorar o passo que considera o “passo do momento”. Temos que saber lidar com isso e tentar ao máximo passar a mensagem de que a dança é muito mais do que moda e, claro, passos que estão na moda.
O que será preciso para que a arte da dança seja mais valorizada em Portugal?
É preciso simplesmente mudar a maneira como olhamos para a dança em Portugal, é necessário mudar mentalidades. Cabe a nós, bailarinos, mostrarmos que a dança é vida, é trabalho. Talvez um dia até poder ser encarada como o público português vive, por exemplo, o futebol. Infelizmente, a nossa cultura ainda não está tão virada para as artes no geral, incluindo a dança. Temos que continuar a fazer o nosso melhor e mostrar sempre que a dança é muito mais do que aquilo que as pessoas pensam.
Vontade de ir mais além
O que é necessário a um bailarino para seguir o seu sonho e ter sucesso nesta área? Conhecer os coreógrafos certos, os críticos certos, os professores certos…
O sucesso depende sempre do que esse bailarino quer para um futuro próximo. Mas sim, conhecer os professores certos e frequentar muitas formações para ter o máximo de informação possível e colocar em prática o que aprendeu. O bailarino não deve esquecer o objetivo e finalidade que pretende.
Não só é um profissional de dança, como também um artista no mundo da música. Recentemente, com sete músicas lançadas do álbum “2018 or Nothing”. Como foi a aventura de entrar neste universo musical?
Por incrível que pareça, já queria cantar há muito tempo, mesmo antes da dança. Entretanto, só este ano foi possível entrar no mundo da música. Foi sempre um sonho e um objetivo ainda em construção, mas que sempre quis fazer. Não foi fácil, tive imensas dificuldades, mas foram essas mesmas dificuldades que me fizeram ainda querer mais e ter esse “2018 or Nothing”. Pensei que, este ano, mesmo que a música não resultasse, dedicaria-me inteiramente à dança e esqueceria a música. Fico muito contente e agradecido por ter algumas pessoas que me apoiaram e que apoiam o meu projeto musical. Melhor ainda é ter pessoas que gostam das minhas músicas, isso sim é o mais gratificante.
Como multifacetado e versátil que é, quais os planos para o futuro?
Não me considero dessa maneira. Ainda assim, quero cimentar ainda mais a marca ‘Krayze’ em termos da minha escola, da minha marca de roupa e, claro, da minha carreira musical. O objetivo é manter tudo isso a bom porto.