Das casas em reconstrução à economia local, a recuperação dita o futuro nas zonas devastadas pelo incêndio de Pedrógão Grande. Apesar dos prejuízos materiais avultados, Figueiró dos Vinhos, um dos quatro concelhos mais afetados, começa a dar os primeiros sinais de resistência.
Até 17 de junho de 2017, quem procurava Figueiró dos Vinhos encontrava um concelho cheio de oportunidades turísticas. Da rede municipal de percursos pedestres ao vasto património cultural, arquitetónico e à história ímpar, esta zona interior do distrito de Leiria, banhada pelo rio Zêzere e rodeada de paisagens verdejantes, era uma das portas de entrada perfeitas para a região Centro de Portugal. Passados mais de seis meses, a sombra do incêndio que deflagrou no concelho de Pedrógão Grande, provocando 67 mortes e mais de 250 feridos, ainda está demasiado presente na memória de todos os que vivem com os montes manchados de negro e com a falta de rotinas que o fogo roubou.
O mesmo cenário desolador repete-se em tantos outros concelhos desta região do Pinhal Interior, como Castanheira de Pera, Sertã, Góis, Pampilhosa da Serra, Penela, Alvaiázere, Ansião, Oleiros, Mação e até parte de Proença-a-Nova ou Vila de Rei. Em Figueiró dos Vinhos, 66% do concelho foi arrasado pelas chamas, o que corresponde a mais de 10.000 hectares ardidos, uma área equivalente a 10 mil campos de futebol. O fogo provocou danos em 491 casas dos quatro concelhos afetados, 49 empresas foram atingidas pelas chamas e, como consequência de toda a catástrofe, 374 postos de trabalho podem agora estar em risco.
Luís Silveirinha, responsável pelo Gabinete de Apoio ao Investimento da Câmara Municipal de Figueiró dos Vinhos, deixa um balanço bastante negativo dos danos materiais neste concelho: “Foram afetadas 31 primeiras habitações, com diferentes graus de destruição, quer total, parcial ou com danos menores. Nas segundas habitações afetadas, o número é substancialmente maior: 107.” O técnico municipal realça, no entanto, a importância que as segundas habitações detêm no concelho e na maior parte do Interior do país. “São uma forma de manter a ligação a Figueiró dos Vinhos por parte de pessoas que foram residir para outras zonas do país e para o estrangeiro e que, assim, regularmente, nos visitam, mantendo ligações e contribuindo para a dinâmica da região”, justifica. Para além de habitações de primeiro e segundo grau, em Figueiró dos Vinhos também foram afetadas estradas, edificações, sinalizações rodoviárias, segurança rodoviária, abrigos de passageiros, equipamentos complementares, infraestruturas ligadas ao turismo, sistema de abastecimento de água, edificações, recursos hídricos, linhas de água, entre outros.
A economia do concelho está a ser fortemente prejudicada pela calamidade de junho, já que 20 empresas sofreram danos materiais diretos em instalações, equipamentos e matérias-primas. Do turismo, a exploração florestal e similares, aos transportes de mercadorias, agências funerárias, construção civil, comércio e serviços, poucos foram os setores da economia local que escaparam à inclemência das chamas. Luís Silveirinha refere ainda que “25 empresas sofreram danos indiretos por queda acentuada de reservas e, consequentemente, receitas, dado serem empresas do setor do turismo, na vertente de alojamento”. Com as instalações afetadas e a atividade suspensa, cerca de cem trabalhadores têm os empregos em risco. No caso das empresas de exploração florestal, aproximadamente 50 postos de trabalho podem estar em causa, face às previsíveis dificuldades que o setor poderá ter no curto ou médio prazo, no município de Figueiró dos Vinhos.
Processo de revitalização
Dos fogos que se iniciaram em Pedrógão Grande, foram registados, no total dos nove municípios, prejuízos no valor de 497 milhões de euros. Cada um destes nove concelhos afetados tem desenvolvido os seus próprios processos de estratégia de revitalização. Segundo Luís Silveirinha, as medidas tomadas pela Câmara de Figueiró “assentam na recuperação das infraestruturas, na captação de investimento privado que tem sido proposto por entidades e empresas num espírito altruísta, mas também naturalmente de desenvolvimento da sua atividade económica, que tem sido o potencial desta região em termos empresarias”. No âmbito da captação de investimento privado, acrescenta, “têm sido desenvolvidos esforços relevantes no sentido da concretização de projetos que estavam em fase de implementação e que, fruto de apoios diversos, têm agora condições ainda mais vantajosas para serem uma realidade”.
De acordo com o relatório do Governo, o investimento na recuperação das regiões afetadas virá dos fundos públicos previstos no Orçamento de Estado, nomeadamente o Fundo de Emergência Municipal e o Fundo Ambiental, o Fundo de Apoio à Revitalização das Áreas Afetadas Pelos Incêndios e virá, também, de fundos europeus, como o Portugal 2020, o Fundo de Solidariedade da União Europeia e o Banco de Investimento Europeu. Luís Silveirinha confirma que “os financiamentos obtidos através dos programas comunitários e nacionais CENTRO2020, Fundo de Emergência Municipal, PDR2020 e Fundo Ambiental irão ser aplicados na reposição de infraestruturas, estabilização de emergência e limpeza de linhas de Água”.
O ministro do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, anunciou, no Parlamento, que das 235 casas identificadas como primeira habitação destruídas nos incêndios de Pedrógão Grande, 76 já têm as obras concluídas, o que corresponde a 32% desse valor. O responsável pelo Gabinete de Apoio ao Investimento de Figueiró dos Vinhos assegura que “os trabalhos de recuperação de habitações no concelho já estão em execução, graças ao Fundo REVITA e outros mecanismos de apoio, como a Cáritas, a União das Misericórdias, a SIC Esperança, entre outras”.
O Conselho de Gestão do Fundo REVITA decidiu atribuir subsídios a 363 agricultores afetados pelos incêndios, com um valor total de 812 mil euros. Segunda esta entidade, “foram concedidos 812.712,30 euros para a recuperação da atividade dos produtores agrícolas e da agricultura de subsistência, cobrindo por esta via os agricultores que sofreram prejuízos superiores a 1.053 euros e inferiores a 5.000 euros”.
Em Figueiró dos Vinhos, os agricultores afetados pelos incêndios transmitiram palavras de transtorno, de comoção e desanimo, logo após os acontecimentos. Mas de momento, avança Luís Silveirinha, têm sido auxiliados “através dos mecanismos criados pela Portaria 50, em que os apoios às perdas agrícolas, como árvores, animais, equipamento agrícolas, barracões, etc., começaram já a ser liquidados a quem sofreu danos”. As palavras dos agricultores e dos empresários locais já são – acredita – “num espírito revelador da vontade de reconstrução e do renascimento, quer da sua própria atividade, quer da dinâmica do concelho, da vida das pessoas e da região”.
Onda de solidariedade
No município de Figueiró dos Vinhos, a assistência na área social e na satisfação de necessidades básicas continuam a ser prestadas através de apoio na distribuição de alimentos, roupas e outros bens, nomeadamente mobiliário, equipamentos, eletrodomésticos, etc., visando a satisfação de necessidades pelos serviços desta área.
No apoio psicossocial, Luís Silveirinha salienta “os meios disponibilizados por parte da Cruz Vermelha Portuguesa, que disponibilizou quatro psicólogos para desempenharem funções no território e prestarem serviços de acompanhamento ou encaminhamento para a área específica da Saúde Mental, no Centro de Saúde Figueiró dos Vinhos”. Apesar de todos estes apoios, Luís Silveirinha elogia “a inestimável onda de solidariedade por parte de pessoas e de empresas que com o seu apoio muito têm contribuído para estes processos, na oferta de produtos alimentares, roupas, equipamentos de uso doméstico, eletrodomésticos, mobiliário e outros”.
Os populares parecem estar mais alerta para o perigo que algumas ações negligentes podem representar, no sentido de evitar futuras catástrofes. Para além dos conselhos fundamentais que têm sido amplamente divulgados pelas entidades competentes, designadamente a ANPC (Autoridade Nacional de Proteção Civil), os Bombeiros Voluntários, a GNR, entre outros, Luís Silveirinha lembra que “é sempre bom reforçar a necessidade de respeitar regras de segurança e a legislação relativamente à realização de queimadas. É preciso ter os cuidados com a limpeza das zonas circundantes às habitações e, genericamente, a limpeza de terrenos florestais. Por outro lado, numa outra vertente é importante dar alertas atempados e ter alguma capacidade de vigilância e de reação perante situações suspeitas, avisando as autoridades”.