Boarding Gate é uma rubrica onde destacamos desportistas portugueses espalhados pelo mundo. A convidada desta semana é Tamila Holub, nadadora olímpica e atleta do Sporting Clube de Braga, que se encontra nos Estados Unidos da América.
Nascida na Ucrânia, em 1999, Tamila Holub desde cedo começou a sentir-se portuguesa, tendo chegado a Portugal com apenas 3 anos. Com algumas doenças respiratórias, entrou no Sporting Clube de Braga, aos 8 anos, clube que representa até hoje. Campeã Júnior da Europa e com presença nos Jogos Olímpicos do Brasil, a nadadora portuguesa recebeu várias bolsas de universidades norte-americanas. Atualmente encontra-se na Carolina do Norte, onde representa a NC State Swimming and Divind Team, enquanto estuda.
Porta de embarque
A nadadora portuguesa revela que decidiu embarcar nesta nova etapa da sua vida por duas razões. Em primeiro lugar, e por uma razão que se prende ao seu proclamado perfecionismo, pela vontade de ser melhor, argumentando que “o nível da natação em Portugal tem melhorado drasticamente nos últimos 5-6 anos, mas em certos aspetos ainda temos muita coisa para aprender”. De seguida, e não menos importante, a facilidade de poder conciliar a sua vida académica com o desporto profissional, algo que, segundo as suas palavras, é bastante complicado conseguir em Portugal. “É triste admitir, mas conheço demasiados atletas com imenso potencial que tiveram de escolher entre desporto e estudos… eu não queria ser a próxima”.
Cultura
Tendo nascido rodeada por diversas culturas e tendo começado a viajar com a seleção para outros países quando tinha apenas 13, Tamila afirma que não sentiu um impacto forte nesta mudança para os Estados Unidos. Apesar disso, confessa que se perturba com coisas tipicamente americanas, “a quantidade de gelo que eles colocam em todas as bebidas, o facto de o ar condicionado estar ligado 24 horas por dia… e a comida (nunca pensei que isto me fosse acontecer, mas sinto imensa falta de sopa)”.
No que respeita à sua adaptação ao estilo de vida americano, a atleta portuguesa diz, com naturalidade, que foibastante fácil, devendo-se, principalmente, à sua atitude positiva com que começou a treinar, a estudar e a integrar-se na equipa. “Eu vim com vontade de aprender com eles, tornando-me melhor, e penso que isso me ajudou imenso a não preocupar-me demasiado com os possíveis problemas”. Contudo, a sua adaptação desportiva foi algo diferente. Muito se deve à competitividade e importância da modalidade na América do Norte e “foi muito duro, pois a metodologia aqui é totalmente diferente e é complicado aprender algo novo quando pensas que já sabes tudo sobre a modalidade”, confidencia.
Momento mais marcante
Tamila, de forma algo inesperada e caricata, realça alguns momentos mais pessoais que a marcaram nestes primeiros tempos nos EUA. “Provavelmente quando eu e a minha colega de equipa (ela ia a conduzir) quase atropelámos uma rena. Eu sei que não é a coisa mais óbvia que vem a cabeça quando pensamos sobre América, mas aqui há um enorme número de animais selvagens! Durante a minha caminhada diária pelo campus universitário, vejo, em média, cinco esquilos. Se calhar esta caraterística aplica-se mais aos Estados que se localizam no Sul, mas foi inesperado ouvir das minhas amigas de Flórida sobre os aligators que atravessam estradas e vão apanhar sol nos jardins traseiros, ou dos colegas de Colorado que vêm alces diariamente. Não posso deixar de mencionar o momento em que descobri a existência do Krispy Kreme hamburger, que para mim foi uma novidade”.
Diferenças do desporto em Portugal
No que toca ao alto rendimento, a nadadora refere que a natação, nos EUA, está muito relacionada com ocollege, “ou seja, os atletas estão interessados em ter bons resultados pois isso proporciona bolsas e alguns privilégios”. Para além disso, e comparando os dois países, sente-se frustrada e, por vezes desiludida com a discrepância na cultura desportiva e no reconhecimento dos feitos desportivos alcançados. “Nos Estados Unidos, se disseres a alguém que és um nadador olímpico, as pessoas ficam boquiabertas, pois entendem os sacrifícios necessários para participar nesse evento. Raramente tive reações semelhantes em Portugal. Penso que as pessoas não entendem que chegamos a treinar 5 horas por dia e 6 vezes por semana…”.
Otimista por natureza, a competidora portuguesa admite que a natação nacional está num bom caminho e que os resultados dos últimos Europeus e Mundiais são o espelho disso mesmo. Porém, enuncia algumas medidas que podem e devem ser usadas para melhorar e aumentar o mediatismo da modalidade: “em primeiro lugar, não há qualquer publicidade e streaming para desportos que não sejam futebol. Eu sei que alguns dos leitores poderão discordar comigo, mas tenho quase a certeza que os mesmos só descobriram agora que Portugal participou nos Mundiais e Europeus de natação. Não posso deixar de mencionar o facto de Portugal ter sido escolhido pela Federação Internacional de Natação para realizar os Europeus de 2021… e que acabou de recusar por “orçamento elevado”. Já se estivéssemos a falar de futebol, a coisa seria diferente. A natação é a segunda modalidade com mais praticantes em Portugal e eu penso que podíamos melhorar imenso se incluíssemos este desporto no sistema educativo do nosso país. Pode parecer complicado, mas a costa portuguesa tem mais de 900km; mesmo se não for pela modalidade, é necessário pensar que as crianças têm de saber nadar, por vários motivos que vocês sabem quais são”, argumenta.
Apaixonada por Portugal, Tamila Holub confessa-se “uma mimada por ter crescido no nosso país”. Apesar de realçar que que os Estados Unidos apresentam mais opções de emprego, a mesma prometeu que, ao fim dos quatro anos de college, volta para Portugal para se dedicar a 100% ao desporto.