Em Portugal, 45% das pessoas que não praticavam desporto antes da pandemia passaram a fazê-lo, sobretudo para combater problemas como a depressão e a ansiedade, muitas vezes geradas pelo isolamento social.
Segundo dados da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental (SPPSM), cerca de 23% da população portuguesa sofre de perturbações psiquiátricas, sendo a ansiedade a perturbação que apresenta a prevalência mais elevada (16,5%), seguida das perturbações do humor (7,9%). Atualmente, com a pandemia Covid-19, estes sintomas têm estado mais presentes entre os portugueses.
No final do mês de abril de 2020, um estudo realizado pela Mind – Instituto de Psicologia Clínica e Forense, divulgado pela Agência Lusa, revelou que 49,2% dos portugueses inquiridos classificam o impacto psicológico da pandemia como “moderado a severo”. Foram obtidas 10.529 respostas, através de um questionário online realizado pela instituição. Os participantes disseram ter sintomas de “moderados a graves” de ansiedade (16,9%), depressão (11,7%) e stress (5,6%).
Para Daniel de Oliveira, psicólogo na Clínica do Ser, no Rio de Janeiro, muitos fatores influenciam o aumento dessas emoções negativas no momento atual. A privação do direito de ir e vir, a tensão de estar sempre atento às medidas de segurança (como o uso de máscara e álcool gel) e até mesmo a necessidade de se sentir produtivo (sensação de mais tempo livre) afetam o lado psicológico de muitas pessoas. “Na nossa sociedade, o ser produtivo é encarado muitas vezes como ganhar dinheiro ou coisas relacionadas com isso, mas ler um bom livro, ver um filme ou aproveitar o tempo com a família também são atividades consideradas produtivas.” Desta forma, além das medidas tradicionais, como a busca de ajuda profissional, é necessário que sejam colocadas em prática alternativas para prevenção do agravamento de problemas relacionados com a saúde mental.
Neste sentido, a Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou algumas orientações relacionadas com a saúde mental em tempos de Covid-19. Além de recomendações a respeito do controle de exposição à informação, manutenção de rotinas diárias e uso adequado de redes sociais e videojogos, a prática do exercício físico diário é uma das recomendações da OMS a que muitas pessoas passaram a aderir durante o confinamento.
De acordo com um estudo realizado por cinco universidades para o Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), e divulgado pelo jornal Público, 45% das pessoas que não praticavam nenhum desporto antes da pandemia passaram a fazê-lo durante o isolamento. Além disso, registou-se um aumento de 43% no tempo gasto em atividades físicas de alta intensidade, por semana. O estudo também revela que 22% das pessoas que começaram a se exercitar durante a quarentena optam por seguir programas de exercícios através das redes sociais. Esses são dados bastante expressivos, se comparados com os divulgados pela Direção-Geral de Saúde (DGS), em 2017, que revelavam que 74% dos portugueses “raramente” ou “nunca” praticavam desporto ou qualquer outro exercício físico.
O empresário Rafael de Oliveira, dono de uma confeitaria em Almada, conta que na sua rotina, entre o trabalho e cuidar da sua filha, não encontrava tempo para o exercício físico, mas decidiu aproveitar o tempo livre que o confinamento acabou proporcionando para começar a seguir aulas via redes sociais. Paralelamente, sente que essa rotina o tem ajudado em outras áreas. “O exercício tem-me ajudado muito a preencher o tempo ocioso, ajuda-me a não pensar em tudo que estamos vivendo. Consigo planear melhor e ter mais disposição para ter foco no que devo realmente fazer.”
Na opinião de Elias Bueno, professor de Educação Física formado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) com trabalho em grande parte voltado para as aulas online, o aspeto físico e psicológico andam lado a lado. O exercício físico tem benefícios que vão além de, simplesmente, preencher o tempo livre. “A liberação de neurotransmissores, como serotonina, dopamina e endorfina, estimulados pela atividade física, é um fator importantíssimo num período de grande pressão como esse.” Em entrevista ao Jornal de Notícias, Marlene Silva, diretora do Programa Nacional para a Promoção da Atividade Física da DGS, explica que esta procura acrescida pelos exercícios online pode ter outra justificação. “A visão que temos é que a população está a usar isto como uma âncora de normalidade.”
Seja como passatempo, busca de maior bem-estar ou para manter algum resquício de contacto com a vida normal, a atividade física tem sido incorporada na vida de muitos portugueses nos últimos tempos. A sua prática é fundamental para a manutenção da saúde mental no momento atual e, ainda mais, para minimizar os efeitos colaterais causados pelo isolamento social, pós-Covid-19.