Licenciado em Ciências da Comunicação, jornalista no Porto Canal e A Bola TV, Francisco Coelho Rodrigues é, atualmente, uma das caras da Sport TV. Apesar de realizado, deixa um alerta quanto à exigência da profissão e aconselha os mais novos a terem especial atenção com o estágio.
Começou por estudar Ciências da Comunicação, na Universidade da Maia. Como surgiu o interesse pela comunicação, em específico pelo jornalismo?
Quando fui para o 10º ano, pensei ir para Direito, pois o meu irmão mais velho estava nesse curso e eu queria seguir os seus passos. Mas, no 11º ano, a minha professora de Português, a professora Zaida Braga, chamou-me à parte, depois de corrigir um teste e disse-me: “Francisco, tu gostas de ler? Gostas de escrever?” E eu disse: “Não professora, não tenho o hábito de escrever e não leio muito, sou sincero. Mas porque está a perguntar?” E ela disse-me: “Tu tens jeito para escrever, os teus textos parecem ser de uma pessoa que escreve.” Foi a primeira vez que pensei: se calhar, consigo potenciar isto. Comecei a ver opções que poderia explorar com a minha escrita e pensei em tirar publicidade ou jornalismo. Estava tudo ali direcionado para as Ciências da Comunicação.
Quando terminou o curso, começou a trabalhar no Porto Canal, depois passou para A Bola TV e agora encontra-se na Sport TV. Quais foram os maiores obstáculos que enfrentou no início da carreira?
Comecei no Porto Canal, fiz lá o meu estágio curricular, passei para estágio profissional e depois para contrato. Tenho a sorte de não ter tido a principal dificuldade que acho que as pessoas têm no meio, que é a porta de entrada. As minhas dificuldades foram mais no trabalho, do que em procurar trabalho. Lembro-me que a grande dificuldade que tive, como comecei logo na vertente da televisão, foi a questão da estética do trabalho. O que eu entendo por estética do trabalho? Neste caso, é a sonorização. No início, tinha muitas dificuldades em ler uma peça e foi algo que tive de batalhar e trabalhar imenso, porque nunca fui uma pessoa introvertida, mas também não era a pessoa mais extrovertida do mundo. Isso causou-me algumas dificuldades no capítulo da sonorização.
Como é a sua rotina nos estúdios da Sport TV?
Neste momento, estou quase sempre a trabalhar das 15:00h até às 24:00h ou das 16:00h até à 1:00h. Diria que a minha rotina começa antes de chegar ao trabalho, pois hoje em dia não podemos desligar nunca devido às redes sociais. A primeira coisa que faço quando acordo é ver as capas dos três diários desportivos, para ver o que se passa. Entretanto, estou a almoçar e estou no Twitter ou no site d’ A Bola, a ver os destaques. De seguida, começo a preparar os programas, a ver os temas que estão em destaque no dia, tiro o máximo de informação possível, porque grande parte do nosso tempo em antena é com comentadores, logo temos de estar a par dos temas. Depois, temos sempre outras coisas para fazer, como peças e resumos de futebol, mas isso depende de dia para dia. Diria que a principal rotina que tenho é mesmo manter-me informado, debater com os comentadores os temas que vamos discutir em estúdio previamente e depois é estar no ar, onde tudo pode acontecer.
“Muita atenção ao estágio que escolherem”
A cobertura ao vivo de eventos desportivos envolve desafios únicos. Como se prepara, lida com imprevistos e mantém um equilíbrio entre a espontaneidade e a precisão ao cobrir eventos desportivos em tempo real?
Lembro-me de fazer o projeto na faculdade, em que o meu professor e coordenador do curso na altura, o Luís Humberto Marques, que foi um grande jornalista, disse-me que temos de prever quase a 100% tudo o que pode acontecer e, depois, saber lidar com os imprevistos. No meu trabalho como pivô, num noticiário está tudo previsto, ou seja, nós temos um guião com os pivôs escritos para lançar as peças e aí é mais fácil. Depois, temos outro tipo de programas, como o Central +, um dos programas em que temos comentadores, temos o alinhamento na mesma, mas temos sempre que reagir ao que o comentador está a dizer, havendo aí alguma espontaneidade e imprevisto. Temos outro programa, que é o nosso programa mais visto, o Grande Jornada, que fazemos ao fim de semana, em que estamos a reagir a tudo o que está a acontecer, nomeadamente, dezenas de jogos, conferências de imprensa, diretos e reportagens e, aí sim, posso dizer que às vezes estamos três horas e meia no ar, e eu se calhar li três pivôs, tudo o resto teve que ser de improviso e é um desafio. É muito exigente, mas é muito giro de se fazer.
Ao longo da sua carreira, certamente houve momentos inesquecíveis na cobertura de eventos desportivos. Tem alguma experiência marcante que possa partilhar?
Em 2018, fui com o Porto, acompanhá-los na Liga dos Campeões a Moscovo. Para além do que estava agendado, as conferências de imprensa e os treinos, quisemos fazer uma reportagem, como se costuma fazer à margem. Íamos contar a história do Lokomotiv de Moscovo, que era um clube que estava na alta roda do futebol há pouco tempo e não era muito conhecido ainda. Fomos à Praça Vermelha e enquanto o Rodrigo, que era o câmara que estava comigo, montou o tripé, tirou a câmara, estou em frente à câmara com o microfone e do nada aparecem quatro soldados armados à nossa volta, a falar em russo, porque na Rússia ninguém fala inglês. E nós a explicar: “Champions League, Champions League” e eles não perceberam, começaram a ficar chateados e a falar mais alto, com armas na mão. O Rodrigo chateadíssimo, com razão, começou a discutir com eles a dizer: “Nós somos da imprensa, temos todo o direito de estar aqui” e eu disse: “Rodrigo, isto vai acabar mal.” Peguei nele, na câmara e no tripé e pusemo-nos a andar dali para fora, porque podíamos ser detidos, nunca se sabe. Tivemos que ir para o lado de lá das baias, conseguimos apanhar a Catedral de São Basílio na mesma e fizemos o trabalho. Foi o meu primeiro trabalho no estrangeiro e acho que, a nível de histórias, há de ser a melhor até ao fim da minha carreira, fiquei logo vacinado.
Que conselhos daria aos jovens que pretendem trabalhar na área do jornalismo de desporto?
Primeiro, nunca desistam, pois acho que quem quer mesmo consegue. Acho que há muita gente, principalmente na área da televisão que vem um bocado pela exposição, mas penso que depois há uma triagem natural, porque o jornalismo é um trabalho muito exigente e, se for esse o propósito de lá estar, essa pessoa não vai aguentar, porque é um estilo de vida diferente. Diria para ter muita atenção ao estágio que escolherem. Posso dizer pela minha experiência que, pelo trabalho que fiz no estágio curricular, senti que no meu curso a tal estética do trabalho que comecei por falar no início não foi bem explorada. Já fui convidado para voltar à Universidade da Maia, na qualidade de ex-aluno que está agora a exercer a profissão e fiz questão de o dizer. Acho que, na altura, o coordenador do curso não gostou muito. Mas essa parte da estética e, no meu caso, a dificuldade foi na sonorização, que é importantíssima. Até podes estar a dizer uma barbaridade, mas se a disseres com confiança as pessoas vão atrás. No estágio é mostrar disponibilidade. O meu estágio foi de três meses e, durante três meses, a minha vida foi inteiramente dedicada àquilo.