Com a premissa de contar a história do Grande Terramoto de Lisboa, o Quake, museu localizado em Belém, dá aos visitantes a possibilidade de viajar no tempo. Uma experiência imersiva que deixa toda a gente a tremer.
O sino toca. As portas da igreja abrem-se. Os fiéis sentam-se para assistir à missa do Dia de Todos os Santos. Acompanhado de dois jovens acólitos, o padre inicia a cerimónia. Subitamente, o chão estremece. Os candeeiros caem, os bancos movem-se sozinhos e veem-se chamas. A igreja está a desmoronar-se.
Os instantes de aflição vivenciados pelos lisboetas na manhã do dia 1 de novembro de 1755, são um dos mais importantes momentos reproduzidos no Quake, museu localizado junto à Avenida da Índia — também apelidado de Centro do Terramoto de Lisboa.
As boas-vindas nesta experiência imersiva são dadas pelo Professor Luís (personagem ficcional), que faz o papel de cicerone. Apaixonado por História e Ciências, o investigador recebe os “passageiros” na sua sala de investigação. Devido à perda de memória, atribui uma missão a todos os presentes: a de voltar ao passado para encontrar os documentos que permitiram a reconstrução de Lisboa, após o desastre natural que vitimou dezenas de milhares de pessoas e mudou por completo a face da cidade.
Os visitantes são depois encaminhados para a “máquina” que permite viajar até ao Dia de Todos os Santos, do ano 1755. É aí que voltámos atrás no tempo. O sino toca. As portas da igreja abrem-se. A terra treme. E a experiência imersiva materializa-se.
A curiosidade de tremer como no passado
Tendo em conta as consequências trágicas do terramoto, o que leva pessoas a terem curiosidade de reviver aqueles instantes? Maria João Marques, co-fundadora do Quake, revela que a sociedade e a tecnologia evoluíram e mudaram também as expectativas das pessoas perante a ida a um museu. Não basta ver. “Há quem queira contemplar um quadro e quem deseje entrar dentro dele”, declara.
Filipa Ferreira, uma das visitantes — também ela ligada à área da cultura, enquanto mediadora cultural — admite ter-se deslocado ao museu não só devido à curiosidade inerente a um acontecimento histórico, mas também para “perceber de que modo transmitiam a informação”. Laís Lachowski, de 11 anos, revela ter sido ele quem pediu à mãe (Fátima Fonseca) que fizessem a visita, após ter visto “um vídeo incrível” no Tiktok. A prova de que este tipo de abordagem suscita o interesse de diferentes faixas etárias. Mas será que está ao alcance de todos?
Apesar de ser evidente o entusiasmo da maioria dos visitantes, há um entrave para algumas famílias: o preço. “É complicado para uma família vir cá, com os preços habituais”, confessa Célia Valério, que se deslocou desde Samora Correia, a mais de 40 quilómetros de distância. Um dos segredos é estar atento às promoções, como foi o seu caso. Para celebrar o Dia Internacional dos Museus (18 de maio), o Quake decidiu realizar uma promoção especial: a oferta de bilhetes aos 100 primeiros visitantes, tal como o desconto de 50 por cento no decorrer de todo o dia. Célia aproveitou o facto de ser feriado em Samora (Dia da Espiga) e dirigiu-se a Belém com a família.
Entreter sem fantasiar
Foi a vontade de fazer “algo pelo turismo e pela nossa História”, que impulsionou o casal Ricardo Clemente e Maria João Marques a criar o Quake. Um projeto inaugurado no dia 20 de abril de 2022, depois de sete longos anos de trabalho de uma “equipa multidisciplinar”, destaca a fundadora. Investigadores como o Professor Luís Matias e a Professora Susana Custódio constituíram, juntamente com o historiador André Canhoto e a coordenadora de conteúdos Marta Pisco, o “elenco” responsável pelo desenvolvimento desta “viagem” imersiva. A empresa holandesa Jora Vision, tornou-se também um elemento essencial neste processo, tendo sido responsável pela compilação de todos os conteúdos. No fundo, “transformou tudo isso, na experiência que conhecemos hoje”, relata Maria João.
Os dados científicos aliados à informação histórica, fornecem as bases necessárias para a credibilidade desta experiência cultural. A força maior deste museu ocorre, contudo, através do entretenimento. “A exposição seduziu-me pelo seu caráter interativo”, refere o turista britânico, Robert Shepherd. Mas será possível entreter, sem fantasiar?
Nas palavras da sua cofundadora, a missão do Quake é bastante clara: “A passagem de conhecimento, de uma forma descontraída e divertida, mas com muita seriedade.” A informação é transmitida de um modo “leve e emocionante”, sem nunca seguir um rumo de fantasia: “Isto não é uma Disney do terramoto!”, garante Maria. Pretende-se que as pessoas, não só “fiquem a pensar”, como “possam implementar medidas de preparação e prevenção sísmica nas suas famílias”, conclui. O entretenimento, História e informação de mãos dadas com um só propósito: o de consciencializar.