O mercado de serviços destinados a cães e gatos teve um aumento superior a 40% depois da pandemia, sendo cada vez mais as pessoas e empresas especializadas nesta atividade. Fomos tentar perceber quais as razões deste crescimento e o tipo de cuidados prestados.
São 15:10h, em Oeiras. O ladrar de um cão anuncia a chegada de Beatriz Mouro, pet sitter (cuidadora de animais) há cerca de oito anos. Traz consigo o Freddie e a Moa. Com apenas 29 anos, gere uma pequena empresa chamada Petting e exerce também funções no Centro de Instrução Canino de Benfica, local onde se formou para obter mais conhecimento.
Seguimos para o Jardim do Ultramar. Moa, de seis anos, cadela de pêlo castanho da raça staffordshire com mistura de leão da Rodésia, tem um olhar dócil e demonstra maturidade na sua caminhada. Anda solta em certos lugares, mas com a supervisão da sua pet sitter. Já Freddie, um yorkshire terrier de oito meses, carece de mais atenção. Com um olhar ansioso, como se estivesse perdido, pede para subir ao colo de Beatriz. “Ele não se deu bem numa creche canina. A dona procurou um acompanhamento mais personalizado”, afirma.
O pet sitting é, na maioria das vezes, requisitado pelos donos que procuram um maior bem-estar para o seu animal. Segundo revela a app de contratação de serviços Fixando, a procura por serviços para cães e gatos cresceu 41% em 2022. Os serviços de hotel para animais constituem a maioria dos pedidos (55%), seguidos do treino de cães (26%) e pet sitting/pet walking (12%).
O mercado tem tentado acompanhar esta oferta de serviços personalizados, procurados sobretudo “pelas famílias mais novas”, revela Beatriz, para quem esta consciencialização sobre o animal é positiva, ajudando a prevenir o abandono e outras negligências. “Os donos passam a ter mais conhecimento acerca dos cuidados necessários, a alimentação específica, os compromissos veterinários e ainda questões de socialização com outros animais.”
É o caso de Cátia Francisco, dona de Moa, que se junta ao passeio e à conversa. Recorreu pela primeira vez aos serviços de pet sitting em 2021. “Estávamos fora. Quando voltámos para Portugal, arranjámos trabalho e achámos que oito horas era demasiado tempo para ela ficar sozinha. Foi aí que conhecemos a Beatriz”, conta. Por norma, requer estes serviços durante a semana, de segunda a sexta. O valor não é fixo, mas é habitual gastar cerca de 100 euros por mês. “Depende muito da nossa disponibilidade”, conclui.
Um extra ou um trabalho a tempo inteiro?
O relógio marca agora 17:27h. Beatriz dirige-se para mais um passeio. É a vez de dois sorridentes Weimaraners cinzentos, a mãe Prata, de 12 anos, e o seu filho Zinco, com oito. O entusiasmo é bem visível assim que veem Beatriz. São cães “reativos”, o que significa que a atenção durante o passeio é “redobrada”, alerta.
Beatriz assegura que trabalha 24 sobre 24 horas. “Às vezes a nossa vida fica muito comprometida.” Viu esta ocupação passar de um hobbie para um trabalho a tempo inteiro por “necessidade e gosto”. Trabalhava numa empresa durante a pandemia, mas quando se instalou o vírus, diz que o seu contrato não foi renovado e aproveitou o crescimento do mercado de cuidados animais. Decidiu arriscar.
Ainda segundo a Fixando, cerca de 45% dos portugueses que têm esta atividade como extra chegam a lucrar cerca 360 euros mensais. Já quem o utiliza como trabalho a tempo inteiro, como no caso de Beatriz, poderá obter um lucro de 2.000 euros por mês.
Estamos neste momento no banco de trás do carro de Beatriz, em direção ao Restelo. A noite já se instalou. No caminho para Lisboa, a pet sitter aponta algumas particularidades da sua ligação com os animais, comparando-a com a relação de professor-aluno. Admite que existem alunos mais fáceis e outros menos acessíveis e alerta ainda para a proximidade em excesso. “Estabelece-se um vínculo forte, mas não convém ser demasiado profundo, porque eventualmente eles acabam por ir embora, para as suas casas.”
Chegámos à casa da Caju, uma labradora com cor de chocolate e uma personalidade extrovertida. Recebe-nos com o entusiasmo de quem se encontra com uma cara conhecida na rua. A caminho de um parque canino, abana a cauda de um lado para o outro. Está feliz por passear com quem cuida dela. Sabe que está em boas mãos.
E os gatos, também precisam de pet sitting?
Os gatos domésticos, ao contrário dos cães, sempre foram vistos como animais de rua, mais selvagens e independentes. Será que essa descrição ainda corresponde com a realidade atual?
Juliana Pinho é cuidadora de gatos ou uma das responsáveis pelo negócio Cat Sister. Luso-brasileira, vive com a sua colega de trabalho em Lisboa. Percebendo que o mercado do pet sitting estava a aumentar, Juliana aproveitou o seu amor pelos felinos e, juntamente com a sua colega Daniella, decidiram dedicar-se aos gatos a tempo inteiro. “A nossa vida é só gatos, desde a hora de acordar até à hora de dormir”, afirma.
Os gatos domésticos têm na casa o seu habitat natural. Há quem os passeie, porém, são casos insólitos. Juliana considera que, nos últimos anos, houve uma clara humanização destes animais. “Passaram a ocupar um lugar importante dentro de casa, do seio familiar, que antes podia ser preenchido por um humano, um bebé, ou até mesmo um companheiro.” Avança ainda que, até há bem pouco tempo, os donos de gatos iam viajar e “entendiam que se colocassem algum tipo de nutrição e hidratação em casa, os felinos iriam ficar satisfeitos”. O seu bem-estar depende também do estímulo e contacto com os humanos.
Em contrapartida, Juliana admite que esta humanização pode trazer consequências negativas. “A atribuição de sentimentos aos animais gera uma criação elevada de expectativas para que eles retribuam esses sentimentos.” Os gatos estão a deixar de ser gatos. “O comportamento de caça, de escalar mobílias, o tipo de alimentação, que é específica para o gato, obriga-o a adaptar-se a um ambiente ao qual não é 100% feliz por não estar a agir conforme a sua natureza”, confessa.