Entra todos os dias às 9:00h da manhã e vai ao jardim ver se as obras que mandou fazer estão a andar como pediu. O novo presidente de São João da Madeira é Jorge Sequeira: persistente, metódico, tem uma visão simples para a cidade, longe dos objetivos “faraónicos”.
Quando Pedro Nuno Santos lhe ligou, Jorge Sequeira estava longe de imaginar que o amigo lhe ia lançar um desafio tão grande. Andava embrenhado na escolha de candidatos autárquicos pelo PS para as eleições locais no distrito de Aveiro e sabia que faltava fechar o nome que tentaria a vitória para os socialistas em São João da Madeira. “Estás maluco?! Não posso deixar, nesta altura, a minha vida profissional para me dedicar a uma autarquia”, começou por dizer àquele que é hoje Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, mas “um dos amigos mais próximos, quer no plano pessoal, quer político”. Apesar da reticência inicial, aos 44 anos, este advogado que nasceu no Alentejo mas vive desde os 11 anos em São João da Madeira, percebeu que era sua obrigação ir à luta. Afinal, o PSD/CDS já liderava os destinos da cidade há 38 anos e Jorge Sequeira, que enquanto estudante bateu à porta do PS local para pedir que fosse refundado ali um núcleo da Juventude Socialista, sabia que tinha chegado a sua hora de contribuir localmente para que a visão dos socialistas marcasse os destinos de São João da Madeira.
É isso que tenta fazer desde que, a 1 de outubro de 2017, ganhou para o PS a presidência da câmara. Um resultado histórico na cidade, que trouxe para a rua naquela noite muitos socialistas em êxtase com a mudança que, meses antes, consideravam impossível.
O trabalho começa de manhã cedo
Disciplinado e metódico, chega ao edifício da câmara todos os dias às 9:00h da manhã. Foi logo assim no primeiro dia, o que lhe valeu alguns minutos de espera sem saber muito bem para onde se virar. “Cheguei à mesma hora que costumava ir para o meu antigo escritório e, como para mim eram uma novidade estas funções, tive que esperar até que chegasse algum funcionário da câmara para me dizer por onde tinha que começar”, lembra a rir.
É certo que a sua experiência na política não começou ali – foi chefe de gabinete do subsecretário de Estado da Administração Interna Fernando Rocha Andrade, de 2005 a 2007, mas pegar em dossiês que estavam nas mãos de outros partidos há décadas não se adivinhava uma tarefa fácil.
“Os primeiros seis meses de mandato foram muito importantes para conhecer os dossiês, o modo de funcionamento da câmara, os funcionários, os procedimentos, os parceiros e para criar as condições para desenvolver as nossas políticas no futuro”, conta em jeito de balanço Jorge Sequeira.
E exatamente às 9:00h em ponto, a hora combinada, está à porta do edifício da câmara, no centro de São da Madeira. São ainda poucos os funcionários e Jorge Sequeira sobe dali diretamente para o seu gabinete, no 7º andar, com uma vista panorâmica para a cidade. “Aqui, consigo estar sempre atento a tudo o que se passa na cidade”, brinca. “Tenho a melhor vista de São João da Madeira, privilégio de presidente de câmara”.
A manhã é preenchida por trabalho de secretária: assina despachos para dar ordens de pagamentos, inteira-se do andamento do dossiê das obras da Escola Serafim Leite e aproveita para fazer um balanço da aventura que tem sido ser presidente de câmara e quais as suas metas. Está orgulhoso da mudança que as suas políticas já começam a operar na cidade e destaca os objetivos já alcançados na Educação: “Prometemos criar em São João da Madeira uma Assembleia Municipal Jovem, que foi eleita nas escolas num processo inovador, participado e democrático e já reuniu pela primeira vez na sala de sessões da Assembleia Municipal. Aprovámos o programa Erasmus Municipal, que irá favorecer experiências no estrangeiro para jovens estudantes sanjoanenses. Adquirimos uma viatura híbrida para reforçar o programa Escola Segura.”
Uma carteira para o senhor presidente
Mas ser presidente de câmara também o obriga a ter um jogo de cintura para lidar com situações caricatas que, às vezes, o desarmam. O autarca é sempre alguém que os cidadãos veem como mais próximo do que os políticos da Administração Central e, por vezes, os pedidos são surpreendentes. Foi o caso do senhor que quis aproveitar o dia que está definido para atendimento ao munícipe para fazer negócios. “Habitualmente, a agenda para este dia está sempre muito preenchida. Vários cidadãos usam essa hora para os mais variados pedidos. E quando o senhor se sentou à minha frente, depois de ter esperado várias semanas pela audiência, perguntei-lhe: então qual é o seu problema, em que é que o posso ajudar?” Mas afinal o senhor não tinha qualquer problema. Do saco que trazia consigo começa a retirar várias carteiras e a dispô-las na mesa do presidente. “Estou aqui é para lhe vender uma carteira.” Surpreendido e a rir, Jorge Sequeira lá tirou dez euros do bolso e comprou uma carteira. “A ousadia também tem de ser premiada”, conta enquanto mostra a carteira castanha, de cabedal, que o acompanha desde então.
Perto do meio-dia, sai para almoçar. “Vou sempre a um restaurante diferente, porque gosto de ajudar todos.” Neste dia, a escolha recai n’O Bacano e percebe-se que Sequeira é cliente habitual. O dono cumprimenta o “senhor presidente” e os empregados estão sempre atentos aos seus pedidos. Mesmo que alguns deles, no final, não pareçam muito coerentes! Afinal, o “peixe grelhado, sem batatas e só com legumes” tem um propósito definido: ser menos calórico. Mas para “compensar” pede dois rissóis de entrada e na hora da verdade, ou seja, na hora de prescindir da sobremesa… “é melhor trazer um gelado, porque os rissóis não compensaram tudo”. Comer descansado também pode ser uma tarefa complicada para um presidente de câmara. O fato nunca é despido e, por isso, quando um munícipe se aproxima da mesa e lhe pergunta se vai existir alguma coisa na Praça Luís Ribeiro, a principal da cidade, para assistir ao Mundial de Futebol que se aproxima, Sequeira tem a resposta na ponta da língua: “Claro que sim! Vamos ter um ecrã gigante para que não nos falhe nenhum golo do Ronaldo.”
Acompanhar de perto a cidade
Depois do café, é hora de voltar à câmara. Mas pelo caminho, Jorge Sequeira quer aproveitar para se inteirar pessoalmente de alguns assuntos. O filho do senhor Fernando da Conservatória, que chegou do Alentejo ainda miúdo, sente a cidade no coração. Conhece cada metro de São João da Madeira e nas ruas nunca deixa ninguém sem um “olá”. A proximidade a cada um e a cada tema são a sua grande mais-valia, e aquela que gosta de preservar. Insiste numa paragem na casa do Dr. Pereira da Costa, um ilustre nome da cultura da cidade e da região, “com um relevante percurso literário sob o pseudónimo de Manuel Córrego”, conta pelo caminho. É ele que vai ser o comissário das comemorações do 34.º aniversário da elevação de São João da Madeira a cidade e Jorge Vultos Sequeira apenas queria saber se “o Dr. Pereira da Costa precisava de alguém que o viesse buscar no dia da celebração”.
Cumprido o objetivo, ainda há tempo para uma passagem pelos jardins do “Parrinho”, onde o presidente quer ver se os jardineiros que tinha destacado para lá no dia anterior já estavam a cumprir as ordens dadas. “Tudo certo”, conclui. Controlar ao milímetro aquilo que se vai fazendo na cidade é algo que não dispensa, mas que também o obriga a algum trabalho extra.
Chegado à câmara é hora de fazer aquilo que de manhã é mais difícil: cumprimentar toda a gente. Agora entramos pela porta principal e no elevador a paragem é no 6º andar, para aquilo a que chama a “ronda aos vereadores”. A primeira “vítima” é a vereadora da Educação, a quem pergunta sobre uma visita de alunos à Assembleia da República. Segue-se a vereadora da Acção Social, para saber se já está identificado e resolvido o problema de um sem-abrigo que apareceu, recentemente, perto do tribunal. “Não acho admissível que tenhamos sanjoanenses a dormir na rua e trabalhamos para que isso não aconteça e consigamos resolver os problemas destas pessoas.” O mote do seu mandato é exatamente o de que o exercício da atividade política não deve ser guiado por uma “visão faraónica” ou pela busca de ficar na história “por um projeto gigantesco, impactante, que seja uma demonstração de força, de poder ou de ostentação”. O seu objetivo é outro: “fazer coisas que melhorem a qualidade de vida dos sanjoanenses”. E dá-nos um exemplo: o Plano de Vacinação Municipal, através do qual a câmara vai oferecer a todas as crianças que nasçam ali a vacina contra a rotavírus. “Uma medida que não é traduzida numa obra física que todos possam ver, mas é uma medida muito importante para a saúde dos nossos cidadãos e que fomenta também de algum modo a natalidade.” Outros exemplos são a linha de apoio a medicamentos, para pessoas com incapacidade permanente e idade inferior a 65 anos, ou o aumento dos apoios anuais a pessoas carenciadas. “Portanto, mais do que realizar uma obra pomposa entendemos o nosso dever e a nossa missão como a construção de um tecido social mais equilibrado com medidas de ação social que façam de São João da Madeira uma cidade humanista e solidária.”
Dados os exemplos, a agenda impõe-se novamente e está na hora de receber o bispo auxiliar do Porto numa visita pastoral. Será preciso falar, mas ainda não teve tempo de escrever o discurso. Dois papéis na mão e uma caneta, e resolve rapidamente o assunto. É hora de ir esperar o bispo. Desce para o Salão Nobre da câmara, onde vai decorrer a cerimónia. Percebe-se que fala sem olhar para o papel: “Não sei para que estive a escrever. Esqueci-me do discurso no gabinete. Tive que improvisar.”