Histórias com H é uma rubrica onde relatamos as mais belas histórias do desporto mundial. O episódio desta semana fala sobre Betty Robinson, a atleta mais nova a ter ganho os 100 metros, na história das Olimpíadas, e uma das primeiras figuras desportivas a lutar pela igualdade dos géneros.
A vida de Betty Robinson é um caso de estudo. Durante a sua vida abriu caminhos para que outras mulheres pudessem, tal como ela, lutar contra a opressão e vencer. E é uma vida de luta. A medalhista de ouro junta no seu cocktail da vida, todos os ingredientes para que se tornasse imortal. O seu nome perdura e marca uma época em que a luta das mulheres pela igualdade começava a ganhar os seus contornos – o tiro de começo foi dado por ela também.
Elizabeth Robinson nasceu em 1911, nos Estados Unidos. Com apenas 16 anos (!) bateu o recorde mundial de 12.2 segundos e ganhou os 100 metros das Olimpíadas de Amsterdão, em 1928. Estas Olimpíadas foram as primeiras que as mulheres foram autorizadas a correr em pista e em campo. Para adicionar ao incrível que são estes feitos, basta dizer que era apenas a quarta prova organizada em que participava. Ainda hoje, Betty é a atleta mais nova a ter ganho uma medalha nos 100 metros, na história das Olimpíadas. Era inevitável que a carreira da jovem atleta se desenrolasse da melhor forma. Não havia outro destino marcado para Betty…
Tudo podia ter-se desenrolado dessa mesma maneira. Betty tinha conquistado uma medalha de ouro e era uma máquina cada vez mais focada em continuar a singrar. Mas, e como muitas vezes a vida mete um “stop” nas aspirações que se desenham mesmo à nossa frente, Betty sofre um terrível acidente. No verão de 1931, Betty decidiu quebrar a rotina de treinos e preparações para as provas, de uma maneira… diferente. Entrou num avião para experienciar alguma adrenalina e divertimento, mas tudo acaba mal. O avião caiu sobre os céus de Chicago. Betty é encontrada viva, mas com inúmeros e feios ferimentos na zona craniana, nas pernas que estavam fraturadas; o seu estado era crítico. Por isso mesmo, o homem que a encontrou, levou-a, não ao hospital, mas sim a um agente funerário, isto porque pensava que a jovem estava morta. Felizmente, o agente funerário era mais observador do que o homem que a encontrou, desfalecida no chão. A partir desse acontecimento bizarro, a atleta conheceu o seu maior pico de fama até então. A sua história era agora denominada de “A mulher que voltou dos mortos.”. Ou seja, era agora conhecida por ter sobrevivido a um desastre, mas não pelas medalhas e o seu pioneirismo na luta pela igualdade das mulheres. Betty, antes uma atleta saudável e com um talento enorme, lutava agora por voltar a usar as suas pernas.
Enquanto Elizabeth lutava pelo ganho das suas aptidões e capacidades totais, outras mulheres seguiram o seu exemplo nos jogos de Los Angeles. Novas estrelas femininas apareciam. Era o caso de Babe Didrikson ou Stella Walsh. O caminho estava traçado. Betty tinha vencido outro capítulo da sua vida, e tinha aberto portas que antes pareciam, apenas, muralhas de um castelo intransponível. Incrivelmente, a luta continuou para Betty. Tinha conseguido recuperar, quase totalmente, das suas maleitas. Após um duro caminho até à qualificação para Berlim, onde a jovem teve de vender inúmeros bens pessoais (itens que ganhou nos jogos de ’28 por exemplo), só para juntar dinheiro para pagar os seus custos (o governo dos Estados Unidos e o comité olímpico não atribuíram nem se preocuparam em ajudar a equipa feminina a pagar os custos de viagem e manutenção para os jogos em Berlim), o lugar estava marcado. Após meses e meses de recuperação e treino duro, depois de meses de tragédia, desilusão e sacrifício, Robinson voltava à carga. Mas a sua presença não se ficou por isso mesmo. Betty bateu os alemães para ganhar, novamente (!), a medalha de ouro olímpica! Tinha, realmente, voltado dos mortos, e estava muito, muito viva!
Betty voltou para uns Estados Unidos gratos pelo que a jovem tinha alcançado. Era uma das primeiras mulheres a receber tal notoriedade e respeito. Não foi, felizmente, a última. Depois de Robinson se ter retirado das competições, ocupou o cargo de juíza em eventos de corrida em campo e pista. Viajou durante os seus anos posteriores em nome de organizações femininas de atletas. Nos seus últimos anos, batalhou contra o cancro e o Alzheimer. Robinson, apesar de tudo, nunca teve a fama e a justiça que merecia em solo americano e mundial. Mas, ainda assim, inspirou milhares e milhares de jovens atletas a lutar pelos seus sonhos, sempre acreditando que era possível, mesmo contra todas as adversidades que encontram no seu dia a dia. E, por isso, pela sua capacidade de luta, pela sua capacidade de acreditar, mesmo quando tudo aprecia estar entregue ao destino, Betty merece ser lembrada como uma das atletas mais importantes da história do desporto mundial. Foi por isso, que merece um espaço ao lado dos melhores dos melhores, aqui, nas “histórias com H”. É a minha homenagem a uma atleta e mulher brilhante.