Realizado por Derek Cianfrance, “Blue Valentine” é um drama romântico que retrata o realismo de uma relação, desde a paixão inicial até às dificuldades que surgem numa vida a dois. Com 9 prémios, segundo dados do Imdb, este filme independente é a segunda longa-metragem do realizador.
Cindy e Dean (Michelle Williams e Ryan Gosling) são um casal que após vários anos de casamento vê a sua relação conjugal chegar a um impasse. Determinados a salvar o seu casamento, decidem “tirar” uma noite e ir para um motel com o objetivo de tentarem reacender a chama que fez com que se apaixonassem. Durante estes dois complicados dias, e alternando entre o passado e o presente, assistimos ao contraste da relação que, à medida que passa, já nem a pequena filha consegue fazer segurar.
Derek Cianfrance consegue trazer para o ecrã o realismo que envolve uma relação e isto pode ser fruto do seu trabalho anterior como documentarista. Co-escrito por Cianfrance, Cami Delavigne e Joey Curtis, “Blue Valentine” é um filme bem conseguido neste retrato realista. A narrativa alterna entre o passado e o presente, é eficaz em demonstrar o contraste amoroso na perspetiva das duas personagens, em retratar duas diferentes fases através da cor – fundamental para perceber este processo -, a que se junta a banda sonora dos Grizzly Bear, um importante elemento na criação do sentimento melancólico. O filme vai a seu passo, sem pressas, muito calmamente, e a ideia que a narrativa tenta transmitir faz sentido.
As atuações também são boas: Ryan Gosling e Michelle Williams demonstram uma boa quimíca a contracenar e percebe-se a liberdade na realização dos papéis. A cena em que demonstram os talentos das suas personagens é o maior exemplo disso, o momento é genuíno e bonito de se ver. A pequena filha, Frankie (Faith Wladyka), também consegue parecer à vontade mesmo com a sua precoce idade.
Quanto mais o filme avança, mais percebemos o porquê da relação ter chegado a este ponto, os atores conseguem fazer-nos acreditar no rumo das suas personagens. Dean continua a pessoa que era no início da relação: talentoso, mas sem muitas ambições na vida, o que lhe importa é o amor da sua família. Cindy é totalmente o oposto, é mais séria, tem ambições e luta por concretizá-las, tem dúvidas e vê o amor de uma forma diferente da de Dean, talvez a partir da relação tóxica dos seus pais e das palavras da avó aquando da relação com o seu avô. A inesperada gravidez muda completamente o rumo do seu futuro. Ela, que tinha a ambição de ser médica, torna-se enfermeira, casa com Dean com o intuito de formar família. Se a gravidez é fruto da relação amorosa com Dean é uma dúvida, pois Cindy havia tido relações com o ex-namorado, Bobby (Mike Vogel), no mesmo período em que conhece Dean.
Talvez esta relação tenha sido mais uma paixão do que amor verdadeiro e o casamento um escape ao inesperado momento (complicado) que irá abalar aos dois. A complicação reflete-se com o passar dos anos, com a responsabilidade que os dois têm de ter. E é o que acontece no filme, com Cindy a querer mais responsabilidade e ambição em Dean, e Dean a não perceber a necessidade disso (os dois tem um diálogo em que isso é percetível). É a personalidade de duas pessoas que não se completam (se é que alguma vez se completaram totalmente): Cindy a não ver mais possibilidade na relação devido às atitudes de Dean; Dean a achar que apenas o amor é que interessa e o resto é superficial.
O encaixe da última cena é inteligente e muito eficaz naquilo que foi a ideia do filme, é linda e muito bem montada. É tocante e a sensação que fica no espectador transporta-o até ao final dos créditos.
“Blue Valentine” é um filme genuíno. É sobre a paixão que aproxima duas pessoas e os desafios de se viver uma vida a dois. O título por si é já um prenúncio daquilo que nos espera. É um retrato honesto, carregado de um realismo que falta na exploração deste género, pouco aconselhável para quem gosta (e espera) a típica história de amor de Hollywood. Em suma, é um grande filme e a prova de que com pouco se pode fazer muito, uma das coisas que o cinema independente consegue proporcionar-nos muito bem.
Veja o trailer do filme ‘Blue Valentine: Só Tu e Eu (2010)’