Por ano, são depositadas nos mares e oceanos 13 milhões de toneladas de plástico. Este material indispensável para a sociedade está no centro de muitas atenções e terá tara recuperável. A intenção é reverter a sua má utilização e proteger o ambiente. Os responsáveis políticos e apoiantes explicam a importância da medida.
O excesso de resíduos plásticos que se tem acumulado nos mares e oceanos, as alterações climáticas e os objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 levaram à necessidade de introduzir medidas mais cautelosas na circulação e utilização do plástico, com o objetivo urgente de reduzir o seu impacto no ambiente. A iniciativa partiu do Parlamento Europeu (PA) que, no dia 24 de outubro de 2018, aprovou uma proposta para impedir a venda de artigos de plástico de utilização única, como pratos, talheres, cotonetes, palhinhas, agitadores para bebidas e varas para balões, dentro do espaço da União Europeia, a partir de 2021.
Em Portugal, a Assembleia da República aprovou três dias depois, a 27 de dezembro de 2018, um projeto lei do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) que visa implementar um sistema de incentivo e depósito de embalagens de bebidas de plástico, vidro e alumínio, introduzindo às embalagens, tara recuperável. A 18 de outubro de 2018, o Conselho de Ministros português aprovou a resolução que proíbe o uso de garrafas, sacos e louça de plástico na Administração Pública direta e indireta do Estado.
A preocupação ambiental está nas agendas dos diversos governos mundiais que, em parceria com a ONU (Organização das Nações Unidas), definiram os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, no ano de 2015, de 25 a 27 de setembro, em Nova Iorque (EUA). A agenda, que visa a erradicação da pobreza e o desenvolvimento económico, social e ambiental à escala global até 2030, ficou definida como Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Incentivar a reciclagem
O Estado português tem apresentado a conservação dos mares e oceanos como uma prioridade. Neste sentido, o sistema de incentivo e depósito de embalagens que o PAN pretende instituir com o projeto lei de 27 de dezembro de 2018, “consiste na atribuição de um prémio ao consumidor final, valor a regulamentar pelo governo”, explicam Ana Aresta e Pedro Neves, secretários de comunicação do partido.
Segundo Ana Aresta e Pedro Neves, o projeto está dividido em duas fases. A primeira será “implementada até ao dia 31 de dezembro 2019 sob a forma de Projeto Piloto para a devolução de garrafas de plástico, com vista a garantir o seu encaminhamento para reciclagem”. Os representantes do partido ecologista reforçam, ainda, que “para este efeito, serão disponibilizadas máquinas que permitam a devolução das garrafas a instalar em grandes superfícies comerciais e noutros pontos de retoma, que, voluntariamente, se articulem com o Governo. As superfícies comerciais que sejam integradas no projeto piloto ficam obrigadas a implementar, nas suas instalações, uma área devidamente assinalada e exclusivamente destinada ao comércio de bebidas em embalagens reutilizáveis ou 100% biodegradáveis”.
A partir de 1 de janeiro de 2022, período que inicia a segunda fase, de acordo com os secretários do partido, “será obrigatória a existência de sistema de depósito de embalagens de bebidas de plástico, vidro, metais ferrosos e alumínio (latas)”. O PAN confirma que haverá “uma transição do depósito apenas das garrafas de plástico para todas as embalagens (plástico, vidro, metais ferrosos e alumínio) e o valor do depósito (tara) será regulamentado por despacho do Governo”.
Também o Partido Ecologista “Os Verdes” sublinha que têm sido, desde sempre, uma voz ativa nesta questão, para a qual têm vindo a alertar a sociedade. “Seja por diversas ações de sensibilização como as campanhas de rua ou a nível do nosso Grupo Parlamentar, inúmeras têm sido as iniciativas legislativas que temos apresentado”, aponta.
Viver sem desperdício
As mudanças têm sido lentas, mas a sociedade portuguesa tem adotado, nos últimos anos, medidas mais sustentáveis. De norte a sul do país, amparadas no conceito de agricultura biológica ou a granel, nos últimos tempos, têm surgido mercearias à moda antiga. Voltadas para as questões ambientais, visam a promoção de uma alimentação sem pesticidas, menos desperdícios e menos plástico a circular.
Em 2015, abriu portas a Maria Granel, a loja que tem produtos biológicos. “Além dos produtos serem naturais, outro princípio que marca a diferença desta mercearia é o facto de ser a primeira a nível nacional onde o cliente tem a possibilidade de trazer os recipientes de casa para reabastecer”, considera a proprietária do projeto, Eunice Maia. Começou com cerca de 200 produtos e uma loja. Já tem disponíveis cerca de mil produtos biológicos ao peso, que estão disponíveis nas duas lojas, uma em Alvalade e a segunda, em Campo de Ourique, em Lisboa.
Tem variedades de acessórios 100% naturais, que substituem o plástico, como cotonetes e escovas de dentes de bambu, palhinhas de inox, pasta dentífrica, substituto da película aderente, entre outros. “Temos na loja quase tudo que possibilita viver uma vida sem plástico e desperdícios. Fomos os primeiros a dar liberdade ao cliente de levar apenas aquilo de que necessita, nem que seja uma única semente de noz-moscada”, enaltece a fundadora da Maria Granel.
A mudança requer tempo, coragem e determinação e, sobretudo, paciência. “Por ser a primeira loja do género, no início, não foi fácil encontrar fornecedores que nos fizessem chegar os produtos sem embalagens de plástico,” destaca Eunice Maia. A lojista acrescenta que, embora “todos os produtos que estão à venda na Maria Granel sejam livres do plástico para o cliente, há muitos que ainda chegam até à loja em embalagem deste material. A grande diferença é que estas embalagens são maiores”. Contudo, sublinha, “já conseguimos mudanças e muitos fornecedores já nos entregam em embalagens sustentáveis”.
Com os mesmos conceitos, abriu, em dezembro de 2017, a Granel Mercearia Biológica, na Estrada de Benfica, em Lisboa. Cátia Carvalho, responsável pelo projeto, considera que “os clientes são pessoas conscientes dos seus hábitos de consumo e do impacto ambiental que a falta de consciência ambiental provoca. São pais preocupados em deixar um planeta habitável aos filhos”.
Catherine Francisco é membro do grupo do “Facebook Lixo Zero” e criadora do site “www.agranel.pt”. Ana Milhazes Martins, embaixadora do movimento Lixo Zero Portugal, criou o blogue “Ana, Go Slowly”. Ambas as iniciativas permitem manter-se a par das lojas biológicas e à medida que existem em Portugal.
Empenhadas na luta contra a poluição estão, também, as grandes cadeias de super e hipermercados do país. Segundo notícias da agência Lusa, a Sonae, os grupos Jerónimo Martins, Auchan Retail Portugal, Lidl Portugal e Grupo DIA assumiram estar empenhados nesta luta. Todos os grupos assumem o compromisso de substituir sacos de plástico por outros materiais reutilizáveis e de apostar nas vendas ao peso, adotada pela maior parte dos hipermercados e que tem vindo a ser desenvolvida de modo a abranger mais produtos.
Despertar consciências
Os conceitos granel, biológico e zero de plástico têm evoluído em Portugal e na Europa porque “a sociedade, em geral, está mais alerta, principalmente, no que diz respeito às alterações climáticas”, explicam os representantes de Os Verdes. Eunice Maia acredita que “a maioria da população tem noção de que a poluição ambiental é algo negativo. Mas tem dúvida se essa conscientização está enraizada o suficiente para os fazer mudar os comportamentos e práticas diárias”.
Cátia Carvalho lamenta que “a grande maioria das pessoas não tenha consciência da sua pegada ambiental. Continuamos a achar que o lixo que produzimos não é problema nosso e que o planeta tem recursos ilimitados”. Há muitas alternativas que possibilita uma pegada ecológica mais amiga do ambiente. No entanto, os Verdes defendem que “ainda há um longo caminho a percorrer no que à redução dos resíduos de embalagens diz respeito, e no fundo à redução dos plásticos”.
A fundadora da Maria Granel sublinha alguns itens que ainda não é possível comercializar no granel, como é o caso do tofu, iogurtes vegans e o arroz. “É preciso cumprir a legislação e a comercialização do arroz é proibida sem ser pré-embalada.” O que para Eunice Maia “é um grande contrassenso de um Governo que está alinhado com a Europa para reduzir os descartáveis e que emite tal legislação que incentiva o consumo do plástico”.
Como elenca Eunice Maia, já “há diversos utensílios compostáveis que possibilitam a substituição deste material”. Por sua vez, as legislações que limitam a circulação e utilização do plástico estão cada vez mais presentes nas iniciativas governamentais. Para a ONU, o plástico é considerado o maior desafio ambiental do século XXI. Contudo, “o problema não é o plástico, mas sim como o usamos,” conclui Fernanda Dalto, gerente de Campanhas da ONU Meio Ambiente.
Substituto de matérias-primas naturais
Segundo a história do plástico, publicada na página “Museu Expandido (ME)”, entre 1837 a 1920, nos Estados Unidos, organizavam-se concursos para desenvolver um material que substituísse o marfim usado no fabrico das bolas de bilhar que entrara em escassez. A indústria do plástico começou a germinar, substituindo muitas matérias-primas como vidro, madeira, algodão, celulose e metais.
A partir 1945, tornou-se indispensável nas tarefas do Homem. Surgiram os descartáveis e os eletrodomésticos. Em consequência, este material acabou por se acumular em excesso, nos mares e oceanos. No século XXI, segundo o mesmo artigo, o plástico “é remédio e adorno, estrutura e revestimento, brinquedo e ferramenta”. Olhando para a posição que a indústria deste material ocupa no mundo, certifica-se que não será fácil eliminar o plástico dos costumes e práticas da sociedade.